• Percival Puggina
  • 13/04/2021
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A PERGUNTA DE BENTO XVI, EM TEMPOS DE PANDEMIA: “ONDE ESTAVA DEUS NAQUELES DIAS?”

Percival Puggina

 

 

         A pergunta lançada como um grito por Bento XVI ao visitar o campo de extermínio de Auschwitz em 2006 ecoa 15 anos mais tarde diante dessa versão moderna da peste representada pela covid-19. Onde estava Deus quando permitiu o surgimento desse vírus que mata, enferma, esgota recursos materiais e financeiros, fecha igrejas, destrói empregos, joga bilhões de homens livres em prisão domiciliar? Lembro que a pergunta profundamente humana de Bento XVI foi estampada em todos os jornais e replicada em todos os idiomas. Causava certo desconforto, espécie de cheque mate teológico aplicado às pessoas de fé. Até, claro, pararmos para pensar.  

ento XVI é um ser humano sujeito às nossas mesmas angústias e inquietudes. Ele não fala com Deus todos os dias através do celular. Quem ainda não se interrogou sobre o silêncio de Deus? Quem, perante a dor, o sofrimento e a aflição, já não clamou pela interferência direta do Altíssimo?

         O paciente Jó, sofredor sempre fiel, nos fornece antigo exemplo bíblico desses brados da nossa débil natureza, que soam e ressoam através das gerações. A manifestação de Bento XVI, que ele mesmo chamou de grito da humanidade, foi humilde e reiterada expressão dessa mesma humanidade. Nem mesmo Jesus escapou a tão inevitável contingência: “Pai! Por que me abandonaste?”.

         É fácil imaginar, igualmente, a presença divina atuando nos incontáveis gestos de solidariedade que, por certo, ocorrem em situações assim. Ativo no coração dos que o amam, ali age o Deus de todas as vítimas, consolo dos que sofrem, esperança dos aflitos e destino final dos seus filhos. Age entre os que rezam pelo fim da pandemia e entre os cientistas que escrutinam o vírus. Age nas equipes de saúde, e quando os braços, ali, querem tombar de cansaço e desânimo. Age entre os que consolam quantos perderam entes queridos. Age entre os incontáveis atos de assistência às famílias de doentes e desempregados. Age no heroico empenho de tantos empreendedores para manter suas empresas e seus postos de trabalho.

 A nós, claro, pareceria mais proveitoso um Deus que atuasse como gerente supremo dos eventos humanos, intervindo para evitar quaisquer males, retificando a imprudência dos homens, proclamando verdades cotidianas em dizeres escritos com as nuvens do céu, fazendo o bem que não fazemos, a todos santificando por ação de seu querer e pela impossibilidade do erro e do pecado.

Nesse paraíso terrestre, nada seria como é e nós não seríamos como somos. Não haveria cruz, nem Cristo. Não haveria lágrimas, nem dor. Tampouco morte, ou vida. É o imenso respeito divino à nossa liberdade que configura a existência humana como tal e nos concede o direito de bradar aos céus. No entanto, tão rapidamente quanto Deus nos ouve, ouve-nos nosso próprio coração.

Aprendamos com as lições da história, da ciência, da razão, do amor e da prudência. Aprendamos com o que acontece quando o materialismo, o relativismo e os totalitarismos, frios como aço, investem na concretização de seus projetos de poder. Eles jamais abandonam o tabuleiro das opções e seus males sempre se fazem sentir.

* Percival Puggina (75), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.


Auto Posto Baruk Ltda -   19/04/2021 21:26:07

Grande Percival. Resumindo: O plantio é livre a colheira é obrigatória. Colhemos exatamente oque plantamos. DEUS com certeza não joga mas com toda certeza fiscaliza. Usa sempre de "inimigos" para corrigir a quem ama e quer salva-los, não podemos perder, perceber e aceitar a correção.

Vladimir S Silva -   19/04/2021 20:57:49

Comentário apenas sobre a parte onde Jesus Cristo pergunta "Deus meu, por que me abandonaste?". Quando Jesus Cristo estava na cruz ele estava assumindo os pecados dos eleitos. Deus o abandonou porque não pode ver o pecado, nem mesmo em seu FILHO sem punir o pecador ainda que ele fosse somente um representante. Agora imagine quão sério é o pecado e a devida punição naqueles que o praticam sem qualquer arrependimento. De fato o pecado será punido, seja na cruz, seja no inferno.

José Rui Sandim Benites -   19/04/2021 15:18:36

Este tema, me fascina, porque estamos aqui? para onde vamos? como devemos agir com nossos semelhantes? enfim como devemos agir no mundo que nos cerca? São respostas que não encontram respaldo na Ciência, pensamento lógico e cognitivo. Por isto, que se busca a chamada inteligência emocional e a inteligência metafísica baseada na fé. Não há espaço para desenvolver todos o pensamento dessas inteligências. Porém se procurarem se aprofundar nestes pensamentos, e não só na Ciência, poderão reduzir a ansiedade, o estresse e a lidar com a insegurança e, de outros pensamentos negativos. O mundo, e este que vivemos, felicidades e tristezas. É um paradoxo. Quem não possuir valores fica escravizado. A fé a Deus, cada um de acordo com sua religião. A minha é católica. Remove montanhas. Um abraço. Paz e Bem.

Fernanda -   15/04/2021 15:36:41

Prezado Sr. Puggina, se me permite uma observação, separar e compreender o que, de fato, é causado pelo vírus e o que é provocado por ações de homens autoritários, incompetentes, despreparados e mal-intencionados é fundamental. Mortes, esgotamento de recursos materiais, humanos e financeiros estão diretamente relacionados ao vírus. Todavia, fechamento de igrejas, destruição de empregos, falências, fome decorrem da mais pura politicagem, egoísmo e autoritarismo daqueles que utilizam o medo como arma de controle e manipulação populacional. Obrigada por seu excelente texto!

Menelau Santos -   14/04/2021 18:35:10

Bela reflexão. Às vezes penso que o sofrimento que passamos atualmente é o preço por ter acreditado nas benesses prometidas pelos nossos esquerdistas. Esse infame STF é uma herança dessa gente. Tomara que a penitência não seja em vão.

Dorothea Parente -   14/04/2021 11:50:22

Muito bom o texto. Uma profunda reflexão, obrigada ????

Luiz Alberto Mezzomo -   14/04/2021 09:46:08

Deus não é nosso gerente. Excelente observação professor.

FERNANDO A O PRIETO -   14/04/2021 08:36:24

Esta pergunta, que no fundo recai na razão de Deus permitir a existência do Mal e o sofrimento, não tem resposta satisfatória em têrmos humanos... Acaba recaindo em Fé e aceitação de um Plano Divino insondável para nós, pelo menos no nosso estágio atual. Mas segundo uma opinião que respeito: "Deus - e só Ele! - consegue, do Mal, tirar o Bem". Quanto a nós, ou confiamos nEle e esperamos a vitória do Bem, ou achamos que tudo é aleatório e não tem sentido algum....