• Percival Puggina
  • 06/05/2025
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Na vala, mas ainda pensando

 

Percival Puggina

         O governador da Bahia (dizê-lo petista seria redundância) quis motivar seu distinto público sugerindo um remédio nada santo aos problemas nacionais: colocar Bolsonaro e seus eleitores numa “enchedeira” e levar tudo para a vala.

Não se deu conta o enfezado baiano de que outros já fizeram isso por ele. Com palavras rebuscadas e por obra de suas canetas, definiram a vala como lugar adequado a quem não é de esquerda, a quem prefere urna com voto impresso, a quem defende a liberdade de expressão, a quem entende que todos são iguais perante a lei e, por senso natural de justiça, intui que quem investiga ou acusa não julga.

Ao ouvir as palavras do governador, me vi na multidão cativa pela caçamba da enchedeira. Senti-me erguido no ar e observei o giro do braço mecânico em direção à vala onde fomos jogados. Até aqui nada de novo, pensei; isto é uma metáfora da vida real sob um governo da pior esquerda que este país já teve. Uma esquerda que não se renova e não aprende; apenas fica mais velha e mais velhaca. Isto é, também, metáfora do que o STF vem fazendo já há vários anos com quem tem a audácia de considerar imprópria, excessiva e inconstitucional a ingerência da Corte na definição dos rumos políticos do país.

Nenhum poder arbitrário, nenhum ditador ou tirano deixou de aclamar as próprias ações como o mais elevado serviço de sua dedicação ao bem do povo. O fato de que o país vá de mal a pior e de que as aves de rapina tenham agigantado as asas na proporção da voracidade não altera a devoção à narrativa que repetem nem ao produto de suas mãos.

Expoente do Consórcio Goebbels de Comunicação, o jornalista Josias de Souza, quando soube do discurso do companheiro governador, descreveu a fala como ato de burrice política, que reforçava a pobreza que assola a política brasileira. Você entendeu, não é leitor?  Com uma frase, em cima do lance, antes mesmo que o governador pedisse desculpas, Josias declarou o empate e encerrou o jogo e o assunto. Afinal, esse seria o nível do jogo, certo?

Só que não! A imensa parcela da sociedade brasileira que está na vala, pensando, sabe que os interesses envolvidos no jogo do poder deformaram importantes instituições e manda mais quem não tem voto. Este período de nossa história será conhecido como a “República do rabo preso”, onde é evidente a perda da noção de ridículo e de limites e onde, “só por uns dias”, tudo ficou como o diabo gosta.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

 


Bia Kicis -   06/05/2025 18:22:31

Parabéns pela lucidez e pelo texto. Seus textos são um presente para nós.

Luiz R. Vilela -   06/05/2025 16:28:23

Em tempos de revolução, guerras selvagens, governos extremamente arbitrários, era comum o uso de valas para se depositar os corpos dos indivíduos aos quais se combatiam, quase sempre por pensarem diferentemente. Em pleno século 21, quando se ouve um governador de estado, pessoa que deveria ter responsabilidade, falar em mandar seus adversários para a vala, soa como algo jurássico, sem propósito e anacrônico. Se fosse da direita, certamente o STF já teria expedido ordem de serviço mandando a PF investigar esta verdadeira apologia ao ódio. Mas o energúmeno é de esquerda, e como os menores, silvícolas e alienados, é protegido pelo manto da impunidade, levando a barbaridade ser considerada apenas uma expressão infeliz. Dois pesos e duas medidas, embora não esteja prevista em lei, hoje vigora com toda a pompa e circunstância nas altas esferas da justiça brasileira. Se houvesse a tal lei do ostracismo no Brasil, como existia na Grécia antiga, esta governador da Bahia, certamente seria uns dos convidados a se retirar. Será que esta pais ainda tem jeito?