Percival Puggina

03/07/2024

 

Percival Puggina

         Circunstâncias especialíssimas empurraram Lula à presidência. “Circunstâncias?”, se espantará o leitor. Pois é, circunstâncias, entre elas as facultadas pelo transtorno psicológico delirante com que alguns protegeram o próprio poder e pela saudade que outros sentiam do dinheiro e dos negócios que a Lava Jato lhes tomara. Tudo se passou num período de tempo – você haverá de lembrar – em que a liberdade de expressão e a democracia começaram a ficar engraçadinhas no Brasil.

Havia, também, circunstâncias relacionadas a seus dois primeiros mandatos. Ao longo deles, Lula foi escolhido pela esquerda mundial para ser “o cara”, tipo laranja de amostra de um bem sucedido projeto de poder da extrema-esquerda que se apelida de progressista. Durante os 12 anos anteriores a sua primeira eleição, com o petismo azucrinando a vida de quem sentasse na cadeira que ele ambicionava, o Brasil fizera o duro dever de casa. Entre os fundamentos necessários, dois eram sólidos: a moeda forte (Real), à qual Lula e os seus se haviam oposto, e o agronegócio, cujos bons resultados nada devem à extrema esquerda, como se sabe. Para “o cara”, ficou a colheita farta e a repentina abundância malbaratada em seus delírios de Midas sonhando se tornar liderança mundial. Entre os objetivos de então contavam-se: tornar o Brasil membro permanente no Conselho de Segurança da ONU, abrir caminho para virar, um dia, secretário-geral ou presidente do mesmo organismo e o Nobel da Paz.

Hoje, sua tarefa mais comum, quando ocasionalmente no Brasil, é visitar algum lugar no interiorzão, organizar ali um ato em ambiente fechado e anunciar um presentinho qualquer – normalmente um programa de governo de pequena monta e aplicação restrita.

Lula vive disso e dos discursos que faz nessas ocasiões. No exterior, sua imagem desidratou e virou farelo moído por conhecidos malfeitos internos, péssimas companhias externas e declarações que fazem dele um Biden rouco e tagarela. No Brasil, seu governo não consegue ocultar a irresponsabilidade fiscal que se exibe no déficit horroroso das contas públicas (li hoje, 02/07, que liberará R$ 30 bi em emendas parlamentares antes das eleições de outubro). Esse dinheiro falso, que está derrubando o valor da nossa moeda, lhe permite lembrar-se de que tem algum poder e ainda pode arrancar aplausos dos auditórios quando, a portas fechadas, brinca de Papai Noel temporão entre os pobres depois de atender aos ricos.

Duvido que saiba o nome de seus ministros. Nem mesmo a mídia fiel, que vive a soldo consegue sublinhar, dentre os 40, um nome sequer que mereça destaque. Quando consegue arrebanhar uma parte desse grupo, Lula cobra resultados que, para ele, se traduzem em distribuir recursos públicos e não em gerar benefício concreto à nação.

Zero surpresa. Não quero aqui tripudiar sobre as escolhas de quem quer que seja. Mas o fato é que governo e economia afundam juntos e desse barco só os dólares têm o poder de sumir. Desculpem a franqueza, se os 40 ministros de Lula fossem escolhidos mediante sorteio nacional, com cupons grátis, ao sabor do acaso, sairia dessa coleta aleatória uma equipe melhor do que a selecionada por ele e pelos partidos que o apoiam. Ela parece buscada no mercado por um recrutador de recursos humanos brincalhão que, depois, abriu uma cervejinha e se acomodou no sofá para apreciar a confusão.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

        

Percival Puggina

30/06/2024

 

Percival Puggina

         Assim como o botão da flor é a própria flor em botão, assim também toda vida no útero materno é humana em diferentes e progressivos estágios de desenvolvimento. Alterações de forma não alteram a natureza, como qualquer idoso constata ao olhar a própria fotografia quando bebê, tão diferente na forma que só saberá ser sua aquela imagem se alguém de confiança lhe houver, um dia, informado isso. Um recém-nascido é mais semelhante ao feto que era do que com o idoso que será aos 90 anos.

Com graves consequências na vida social, a moralidade contemporânea se ajoelha em adoração perante as conveniências. A genuflexão da moral frutifica. Nasce a corrupção e explodem escândalos que se desfazem em fumaça tão rapidamente quanto as provas. Nasce o comércio clandestino das drogas e a restrição ao trabalho policial. Nascem o servidor público militante político e o professor redutor de cérebros. Nascem as narrativas e suas sequelas. Nascem a sexualização precoce, a gravidez das adolescentes e nasce o aborto como “direito da mulher”. Dessa genuflexão nasce até a vigarice que chama o projeto de Lei do Aborto de “Lei do Estupro”.

Os legisladores que despenalizaram o aborto em três casos, entre eles o de estupro, não fixaram o número de semanas a partir do qual o procedimento seria vedado. Entendo a dificuldade: a partir de quantas semanas se torna “humana” uma vida que é humana desde a concepção? Para evitar o pior, uma regra subsidiada pelo caso Amillia Taylor (bebê norte-americano nascido em 2006 com 21 semanas e seis dias de gestação) limitava a 22 semanas o tempo a partir do qual o feto tinha possibilidades de viver fora do útero materno. Matar um bebê que poderia viver fora do útero materno ficava parecido demais com homicídio.

Embora se saiba que mesmo antes disso, o procedimento abortivo causa sofrimento ao feto, o Conselho Federal de Medicina, com a autoridade que lhe confere a lei, proibiu o aborto após a 22ª semana de gestação. Contra isso se insurgiu o PSOL, alegando que a lei que autoriza o aborto em caso de estupro não estabelece “marco temporal” (em relação às terras indígenas, a Constituição estabelece o marco temporal, mas esse não convém aos partidos de esquerda). Os princípios andam de mãos dadas com a conveniência, ou, no dizer do comediante Grouxo Marx: “Esses são meus princípios, mas se não lhe servirem, tenho outros”.

A prefeitura de São Paulo informou recentemente ao ministro Alexandre de Moraes que seus hospitais realizaram 68 abortos em 2024, sendo três em bebês com 22 semanas e um com 30 semanas de gestação. Sete meses! Ao que noticiou O Globo, houve um caso, no hospital municipal de Campo Limpo, onde uma mulher, por duas vezes, teve negado o atendimento por estar com 24 semanas de gestação, serviço “não oferecido pelo hospital”. Está formado o rolo.

Atenção, senhores e senhoras congressistas cuja moralidade não se curva às conveniências! De uma vez por todas, votem lei impondo limites a essa barbárie sustentada por quem se compraz com atender conveniências mediante lixeiras hospitalares recheadas de pedaços de pequenos seres humanos. Ponham um freio nessa loucura sinistra!

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

27/06/2024

 

Percival Puggina

         É fácil, muito fácil, compreender a inimizade que nossa Suprema Corte nutre em relação às redes sociais. Os ministros Luiz Fux e André Mendonça, mais o primeiro do que o segundo, acabam de romper a cortina de silêncio e autolouvações com que o STF vinha tentando eclipsar seu litígio com dezenas de milhões de brasileiros incomodados pelo ativismo esquerdista da Corte. Embora o ministro Dias Toffoli se sinta “representante” de cem milhões de votos (na curiosa soma dos votos dados ao presidente que o indicou com os votos dos senadores que o aprovaram), nesse sentir ele é um “trans” – um não eleito que se sente consagrado nas urnas. O poder dos ministros não deriva de representação popular.   

Aliás, aproveitando a analogia: o sentir de alguns membros do Supremo, produz um efeito “trans” reverso na sua percepção sobre conservadores e liberais. Cidadãos com apreço à cultura ocidental e seus fundamentos judaico-cristãos são vistos, percebidos e tratados, como “de extrema direita”, suscitando rejeição por se oporem ao falso progressismo tão ativo no topo do judiciário brasileiro.

Todos temos observado, ao longo dos últimos anos, partidos de pouco voto nas urnas e, por consequência, nos plenários, subirem no banquinho de uma estatura política também ela “trans” para se autoproclamarem os únicos representantes das aspirações populares. Sentindo-se assim, bem impressionados consigo mesmos, mas derrotados nas deliberações de plenário, a toda hora correm e recorrem ao STF para buscar lá, entre 11, a maioria que não tem entre seus 513 pares de legítima representação popular. E funciona...! 

Em 2019, o ministro Barroso, hoje presidente do STF, proferiu palestra na Universidade de Columbia. Matéria do Estadão sobre o evento, publicada no dia 25 de abril daquele ano, reproduziu uma série de vigorosas afirmações de S. Ex.ª, entre as quais destaco duas. 1ª) “Uma Corte que repetidamente e prolongadamente toma decisões com as quais a sociedade não concorda e não entende tem um problema". 2ª) Depois de esclarecer que tal não era sua opinião, mas fato, afirmou que na percepção da sociedade "alguns ministros demonstram mais raiva dos promotores e juízes que estão fazendo um bom trabalho do que dos criminosos que saquearam o país".

Em março, mês anterior ao referido evento, fora instalado o inquérito 4781 (das Fake News) e uma semana antes, ocorrera a censura ao site O Antagonista e à revista Crusoé. Os problemas de maior porte estavam apenas começando.

É normal que a opinião livre expresse contrariedades. Perguntem à sociedade onde vê mais inverdades, mistificações, falsidades, narrativas, sofismas e omissões. Será nas redes sociais? Ou nos poderes políticos? Ou na velha imprensa? Combater o debate popular autônomo nas redes sociais e na mídia digital é um disparate pois as razões para fazê-lo valeriam contra tudo e contra todos. É muito bom que o cidadão possa dizer o que pensa e isso alcance a muitos. Ele pode fazer soar a campainha do celular no bolso do deputado, acessar suas páginas nas redes, opinar em seus vídeos, falar ao presidente. Qualquer indivíduo pode propagar suas ideias em espaços próprios, em páginas, perfis e canais. Pode criticar seu vereador e seu senador; seu prefeito e seu governador. Pode criticar o Papa. E ninguém dirá que isso é agir para descrédito das instituições. Aliás, esse desabono, quando ocorre, é gerado dentro dos poderes. Não é a crítica que causa o descrédito, mas o descrédito que a motiva.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

Percival Puggina

24/06/2024

 

Percival Puggina

 

         Para a extrema esquerda, silenciar as redes sociais é questão de sobrevivência! Antigamente, seu pessoal tinha hábitos de leitura, dirigentes e militantes escreviam e frequentavam livrarias. Exibir ao menos um certo “verniz intelectual” era tão importante que até os camaradas mais vadios, nada estudiosos, portavam “livros de sovaco”, jamais lidos, mas levados para passear e chamar atenção. Conheci e debati com vários.

Paulo Freire acabou com isso. Os atuais professores aprenderam dele que o importante é a conscientização e o uso de palavras com poder de causar esse efeito (1). Os verdadeiros objetivos da revolução cultural podem ser alcançados, então, com multidões militantes e votantes, tão incultos quanto fortemente motivados. Eis por que resulta inútil discutir com extremistas de esquerda. Eles nada sabem sobre a organização de um argumento, sobre premissas e conclusões, mas percebem toda contraposição como assédio maligno, rejeitado por ser moralmente inferior... Vivem em lockdown intelectual. Se o objetivo é conquistar corações, quanto mais vazias as mentes, melhor. Para os sentimentos que quer provocar, é suficiente um bom arsenal de substantivos e adjetivos esparsos devidamente trabalhados.

Até o velho “livrinho vermelho dos pensamentos de Mao” ou o Minidicionário do guerrilheiro urbano” se tornam exemplos de loquacidade desnecessária. Palavras eficientes, fazem o serviço em corações e mentes esvaziadas e manipuladas de modo emotivo em sala de aula. Observem Lula. Todo discurso dele fala em pobreza, fome, desigualdade, raça, opressão, ganância, exclusão, exploração, discriminação, injustiça social e por aí vai. Paulo Freire na veia da testa.

Dado que o método exige repetição sem fim, anexa ao prédio da extrema esquerda opera sua fábrica de “mantras”.  Dali saem etiquetas da moda para rotular os adversários: fascista, racista, machista, nazista, golpista, negacionista, terraplanista, extremista e mais recentemente as acusações preferidas: discurso de ódio e fake news. É pouco, mas ganha potência se as imputações forem associadas a algum tipo penal preexistente, ou a ser criado ou, ainda, considerado suficiente para justificar censura e repressão, lançando a Constituição às urtigas. Ali também operam as contradições do progressismo retrógrado, do multiculturalismo anticristão e antissemita, do pluralismo que não admite contradição e – novo achado da cartola! – o gabinete da ousadia, para onde o extrema esquerda levou sua conhecida experiência em amabilidades e meiguices.

Quando estou estressado com a situação do país, tenho duas possibilidades de recuperar a paz: vou à Igreja rezar ou escuto certas falas, entre outros, de meia dúzia de ministros do STF. São lições gentis de mansidão e equilíbrio. Quando me inquieto na busca da verdade, posso ler a Imitação de Cristo ou me aprofundar em vídeos com discursos de Lula.

Ante os olhos vagos e baços da maioria do Congresso, os outros dois poderes de Estado montam seus aparelhos para patrulhar opiniões.

  1. Sobre o tema, indico fortemente a leitura do livro “A pedagogia do marxismo”, de James Lindsay, ed. Avis Rara 2024.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

20/06/2024

 

Percival Puggina

         Deveríamos pensar mais na política como um campeonato de muitos jogos pois essa perspectiva enriquece a percepção de erros e acertos. O direito de participar do jogo é conquistado mediante decisões bem tomadas.

O objetivo deste artigo, porém, não é ensinar a vencer eleições, pois sequer tenho credenciais para isso. O que pretendo é chamar a atenção para um fato bem simples: no jogo político, como em qualquer outro, um conjunto de regras determina a conduta dos jogadores e o modo de jogar. A maior parte dos disparates que observamos na política brasileira ao longo de sucessivas legislaturas, governos e administrações é consequência das regras inconvenientes determinadas para nosso modelo institucional (financiamento público dos partidos e das campanhas, emendas parlamentares, foro privilegiado, eleição proporcional, excesso de siglas encarecendo a formação de maiorias, etc.). Eleições presidenciais são o tônico do populismo!

Há, contudo, uma diferença essencial entre o jogo da política e todos os demais: nela, a regra determina, também, quem joga. A eleição proporcional para os parlamentos, por exemplo, atrai políticos com o perfil que hoje se tornou majoritário no país; a eleição distrital recrutaria candidatos com outro perfil, interessados em ouvir a opinião de todos cidadãos, bem como a pôr os pés na calçada e os pneus na estrada.

Boas regras nascem do propósito de proporcionar bons resultados. Na política, isso significa parlamentos que efetivamente representem as opiniões ou consensos existentes na sociedade e governos qualificados para as tarefas que correspondem a seus titulares. Quando isso acontece apenas ocasionalmente e em número reduzido de casos, muito provavelmente o problema está na regra. Nosso modelo eleitoral para eleições de deputados e vereadores, dito proporcional, é péssimo. Tão sofisticado nos cálculos e na “proporcionalidade” e tão propício a que representantes vendam votos e apoio a quem comanda o caixa, omitindo-se na representação de seus eleitores.  Com as regras do voto distrital, isso muda radicalmente.

O leitor já sabe que nossos problemas têm causas institucionais. Instituições mal concebidas que privilegiam a representação e não os representados, protegem o Estado e não a sociedade. Junto a isso, regras erradas e urnas herméticas, opacas, que os sacerdotes da Sagrada Ordem das Urnas Sem Impressora consagram como cristalinas e diáfanas.

“E a regra nº 1, qual é?”, perguntará o leitor, vendo que concluo o texto.

Pois então. A regra nº 1 diz assim: “O juiz não joga.”

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

17/06/2024

 

Percival Puggina

Brasil!

Mostra a tua cara

Quero ver quem paga

Pra gente ficar assim

Brasil!

Qual é o teu negócio?

O nome do teu sócio?

Confia em mim.

(Cazuza)

 

        As coisas no Brasil funcionam assim. A corrupção levou até as moedinhas? Convoquem-se os ladrões. A política ficou suja e eleitores vendem votos a políticos que, depois, vendem os próprios votos nos parlamentos? “Estanque-se a sangria”, acabe-se com a Lava Jato, reelejam-se os patifes, expurguem-se os mais sérios. A democracia corre perigo, instale-se a censura. A insegurança é uma vergonha nacional? Chame-se o partido que não gosta da polícia, que defende penas curtas, desencarceramento, saidinhas e bandido na rua. As redes sociais fecharam a porteira do paraíso onde a oligarquia era feliz e não sabia? Instale-se a censura, prendam-se os recalcitrantes. O povo quer protestar? Que o faça em silêncio e, se falar, não desagrade as cortes.

Estou mergulhando na essência da “racionalidade” à moda da casa! Vamos em frente. O governo quer gastar mais? Criem-se novos tributos para esfolar quem produz. Faltam recursos financeiros para o futebol, para os esportes, para os hospitais? Crie o governo vários joguinhos e tome dinheiro dos trouxas. Transforma-se o país, então, numa sinecura em que se institucionalizaram as mais criativas maneiras de lucrar com a esperança dos miseráveis. Cometem-se centenas de milhares de abortos por ano? Encarregue-se o governo de executar a chacina com as luvas esterilizadas da irresponsabilidade essoal. Aborto público, gratuito e de qualidade, ora bolas!

É também por essa linha que andam os defensores da legalização das drogas e de seu comércio. Converteram-se elas em flagelo social? Encarregue-se o Estado de produzi-las e servir pó em bandeja para a farra dos usuários. Ou então, crie-se um sistema de quotas para traficantes e consumidores, fracionando-se o mercado. Afinal, alega-se, a repressão é inútil e só tem servido para enriquecer o submundo do crime. Poderíamos fazer algo semelhante com o contrabando, com os sequestros, com o estelionato e com os crimes cibernéticos. Viveríamos em paz num mundo onde só fake news seriam, enfim, duramente penalizadas.

Tributadas essas operações pelo leão da receita, as taxas e impostos estabelecidos permitirão que, em vez de perdermos cem por cento, recuperemos uma boa parte do que os bandidos nos levam. E os mercados dormirão em paz.

São tolices, sim, que fazem lembrar mais uma vez Tito Lívio sobre a Roma de seu tempo: “Chegamos a um ponto em que já não podemos suportar nossos vícios nem os remédios que os poderiam curar”.

*       Texto inspirado em artigo que publiquei em setembro de 2018 na Gazeta do Povo. Como se vê, antecipei muito do que aconteceria quatro anos mais tarde.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

13/06/2024

 

Percival Puggina

         Pessoas adultas, seguras de si, não costumam mostrar interesse sobre a vida sexual dos outros. Publicizar a própria sexualidade, propagandear prazeres e supostas competências é coisa de adolescentes e de adultos com mais problemas do que competências. A estratégia política de levar às salas de aula um pacote de ideias erráticas e volúveis sobre a sexualidade humana, como faz a “ideologia de gênero”, tem causado grande preocupação à sociedade.

Foi por assim entender que o Congresso Nacional, nos anos recentes, sempre que deliberou sobre questões educacionais, rejeitou conteúdos com menções a “gênero”. Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores têm feito o mesmo, malgrado a furiosa pressão da militância. Quando a Câmara Municipal de Porto Alegre votou uma dessas matérias, assisti à sessão e conversei com vereadores. A ideia de ter que proteger as crianças dos professores e seus problemas era tão surpreendente quanto necessária.

Na ocasião, antevi que a extrema esquerda derrotada pelo plenário não abandonaria a obsessão. Fechada a porta, entraria por alguma janela. Foi o que aconteceu logo após com a inserção, nas escolas, da linguagem de gênero neutro, essa coisa sem pé nem cabeça. No início de 2021, já havia estabelecimentos de ensino recebendo os alunos com saudações do tipo “Querides alunes!”. A temática entrou, irreversivelmente, nas salas onde crianças inocentes e adolescentes novatos estavam confiados a professores errados! Alegando combater preconceitos, inventam palavras não dicionarizadas, chutam a gramática e alteram os pronomes do idioma pátrio para que não identifiquem gênero algum.

Por outro lado, a ideia de que os órgãos genitais são ilusões da mente e devem ser abolidos da identidade pessoal derruba uma biblioteca de genética e outra de biologia. Mas isso não importa à militância, contanto que se propague um mix conceitual cheio de contradições. Segundo ele, masculino e feminino seriam:

  1. ora construções culturais e sociais,
  2. ora deliberações tão frívolas quanto a escolha de uma camiseta,
  3. ora frutos de imposições heteronormativas,
  4. ora livres opções individuais,
  5. ora imposições coercitivas da natureza,
  6. ora produtos de uma "dialética" ocasional da genitália com sabe-se lá o que na cabeça de cada um.

Convenhamos, isso não é assunto para ocupar tempo e esforço pedagógico numa sala de aula com crianças ou no início da adolescência. Não vejo pais apoiando tais práticas. Se o que se quer é combater a discriminação e o preconceito, ganharíamos mais fazendo exatamente isso, valorizando a dignidade da pessoa humana, sua dimensão material e espiritual, a virtude e o amor ao próximo. Assim, estaríamos poupando crianças e adolescentes das confusões e conflitos que já lhes está causando essa pedagogia infeliz.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

10/06/2024

 

Percival Puggina

        Ah, meu caro leitor, a maldade! Em todos os tempos, ela foi e continua sendo liberticida, brutal e letal inimiga da liberdade. Em suas mãos, sempre há o cálice de cicuta servido ao velho Sócrates, não por acaso conhecido como o “Filósofo das ruas”. Quatro séculos antes de Cristo, Sócrates foi julgado e condenado à morte por ensinar a juventude contra os deuses então cultuados. Foi-lhe proposto mudar seu ensinamento, mas ele se recusou. Foi-lhe proposto pedir clemência ao povo, mas ele se negou a fazê-lo. Preferiu morrer a aceitar que sua liberdade, muito particularmente a liberdade de pensar e se expressar, lhe fosse tomada por seus julgadores ou pelo populacho. Platão registra estas esplêndidas palavras proferidas por seu mestre quando já se sabia condenado ao cálice de veneno. Ele parece falar de acontecimentos atuais:

“Mas, ó cidadãos, talvez o difícil não seja isto: fugir da morte. Bem mais difícil é fugir da maldade, que corre mais veloz que a morte. E agora eu, preguiçoso como sou e velho, fui apanhado pela mais lenta, enquanto os meus acusadores, válidos e leves, foram apanhados pela mais veloz: a maldade. Assim, eu me vejo condenado à morte por vós, condenados de verdade, criminosos de improbidade e de injustiça. Eu estou dentro da minha pena, vós dentro da vossa."

Altas autoridades da República – da nossa República – não cessam de falar sobre fake news. Onde houver um microfone, logo surgem, como cruzados de uma causa nobilíssima, para atacar as redes sociais antes das quais eram felizes e não sabiam, nas palavras do ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral. No entanto, vocês sabem, não sabem? Há políticos, magistrados, professores, servidores públicos, comunicadores que falseiam a verdade ou fecham os olhos perante o que veem e sabem. Fazem isso profissionalmente. Com grande competência, criam ilusões valendo-se de enganosos fragmentos de verdades. Mudam o passado, falseiam o presente e iludem sobre o futuro. E esse é, talvez, o mais enganoso dos males, nunca mencionado.

O que são as famosas “narrativas” que tanto poluem a compreensão dos fatos? Quanta desinformação geram! Aliás, são construídas com esse fim. Nascem e se reproduzem a partir do ambiente oficial, com apoio da mídia tradicional. Estão por toda parte: nas salas de aula, na imprensa que engorda no pasto do erário, no ambiente cultural de alto valor agregado, nos parlamentos e nas cortes. São a fumaça do também falso progressismo que caracteriza a extrema-esquerda: ambientalismo, aquecimento global, ideologia de gênero, etnicismos, antiocidentalismo, anticristianismo, antissemitismo e o escambau.  

Tentar fazer das fake news a questão chave da democracia brasileira, para silenciar as redes sociais, é uma dessas narrativas. Elas superam as notícias falsas no dano que causam à informação e ao livre discernimento dos cidadãos. 

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

05/06/2024

 

Percival Puggina

         Quando nos mudamos para Porto Alegre, vindos de Santana do Livramento, fui aprovado no exame para ingresso no Colégio Estadual Júlio de Castilhos, carinhosamente chamado “Julinho” e oficializado como “Colégio Padrão”. E era mesmo. Excelentes professores, num ambiente de liberdade, mas de muito estudo, leitura e provas mensais pra valer.

Imediatamente, fui capturado para a política estudantil dos anos 1960, 1961 e 1962. Aprendi muito sobre a extrema esquerda que derrotávamos nas eleições para o Grêmio Estudantil, mas para a qual perdíamos as eleições metropolitanas e estaduais. Uma lição recorrente foi observar e enfrentar a determinação com que, nas assembleias, os “comunas” ou os “vermelhos”, ou ainda, os “do partidão” (PCB), quando minoritários, criavam tumultos para impedir deliberações que os contrariassem. A opinião daquela gurizada deveria prevalecer mesmo se rejeitada, custasse o que custasse. Éramos adolescentes, eu tinha 15 anos, representava minha turma e ali, naqueles entreveros – valho-me do conceito popularizado – aprendi a jogar xadrez com pombos: eles derrubam as peças, defecam no tabuleiro e saem cantando vitória.

Lembrei-me disso agora, no dia 03 de junho, assistindo reportagens com cenas da invasão e vandalismo da Assembleia Legislativa do Paraná por professores e alunos contrários ao projeto de terceirização da administração de 200 estabelecimentos de ensino. Há 15 dias, algo semelhante quase aconteceu em São Paulo durante a votação da criação de algumas dezenas de Escolas Cívico-Militares. É ou não o mesmo desapreço à democracia que eu conheci há 64 anos?

A bancada da extrema esquerda na Comissão de Educação da Câmara dos Deputados está inconformada com a eleição do jovem e brilhante deputado Nicolas Ferreira para presidência do órgão. Por isso, vem usando os meios menos regimentais e mais grosseiros possíveis para impedir, mediante tumulto, que as deliberações ocorram.

Parece pouco? Tem mais. Não é o mesmo desapreço pela democracia e pela representação política que tem levado grupos identitários a entrar no STF contra leis que proíbem o uso de linguagem de gênero neutro? Danem-se o idioma, seu léxico e sua gramática, confundam-se as mentes dos educandos com novocabulário e regras contraditórias, a vontade da extrema esquerda deve imperar!... No fim da linha e da picada, um poder sem voto está passando por cima de toda a sensatez e da Constituição que diz ser o português o idioma do Brasil. Então, porque pode (ou não pode?), faz cumprir, numa canetada, a vontade da minoria ruidosa e ensandecida. Mesmo ao preço do emburrecimento nacional.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.