• Percival Puggina
  • 26/08/2023
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De papo furado a escândalo nacional

 

Percival Puggina

         A boa notícia da semana infelizmente não serviu de lição a ninguém, porque ninguém pediu desculpas pelo que fez. O ministro Alexandre de Moraes, do alto de sua magnanimidade, encerrou o inquérito aberto contra seis dos oito empresários daquele grupo de WhatsApp que entretiveram um diálogo sobre intervenção militar.

Tudo começou com matéria exclusiva do jornalista Guilherme Amado, no Metrópoles, informando que sua coluna, sabe-se lá como, acompanhava [há meses] os diálogos do grupo (sim, sim, dane-se a intimidade alheia!). De todo esse tempo de alcovitagem, ele fisgou seu peixe: um mero papo furado. Como todo pescador, porém, exagerou no tamanho da presa. Escreveu ele, ao anunciar o achado:

 “A possibilidade de ruptura democrática foi o ponto máximo de uma escalada de radicalismo que dá o tom do grupo de WhatsApp Empresários & Política, criado no ano passado e cujas trocas de mensagens vêm sendo acompanhadas há meses pela coluna. A defesa explícita de um golpe, feita por alguns integrantes, se soma a uma postura comum a quase todos: ataques sistemáticos ao Supremo Tribunal Federal (STF), ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e a quaisquer pessoas ou instituições que se oponham ao ímpeto autoritário de Jair Bolsonaro”.

A partir daí, o temporal da maledicência da ex-imprensa desabou sobre oito membros do grupo. Na falta de picanha, ela rói os ossos que lhe chegam, mas sempre, claro, em defesa da democracia e da liberdade de opinião. Associações e entidades que fazem parte da Coalização em Defesa do Sistema Eleitoral (existe sim e é formada por meia centena de organismos “progressistas”) correram ao STF pedindo abertura de inquérito prontamente instaurado.

Foi o assunto dos dias subsequentes. Os oito perigosos cidadãos tiveram suas vidas devassadas, foram submetidos a uma operação de busca e apreensão de bens, seus celulares foram recolhidos e suas redes sociais, bloqueadas. Furiosa, a democracia brasileira subiu nas tamancas. 

A história rolou um ano inteiro! Os muitos incômodos a que os oito cidadãos foram submetidos se assemelham aos de inúmeros outros ainda jogados no fundo de inquéritos de instalação imediata e conclusão incognoscível. Agora, o ministro encerrou o inquérito de seis investigados, postergando por 60 dias os de outros dois (certamente não pelo peixinho que a coluna do Metrópoles fisgou – que é um nada por conta própria – mas por outras razão de Estado).

Em trecho da decisão, o ministro escancara os excessos:

"Não foram confirmados indícios reais de fatos típicos praticados pelos investigados ou qualquer indicação dos meios que os mesmos teriam empregado em relação às condutas objeto de investigação ou, ainda, o malefício que produziu, os motivos que determinaram, o lugar onde a praticou, o tempo ou qualquer outra informação relevante que justifique a manutenção da investigação".

Sei que para conhecer é preciso investigar, mas há uma demasia escancarada nesse caso. As conversas vazadas são rasas, coloquiais e expressam meros pontos de vista, em ambiente fechado. Todo o escarcéu serviu apenas para a tenebrosa autocensura avançar mais um passo – esta sim, adoece à democracia e constrange a liberdade de opinião. A única coisa que aconteceu nesse episódio, como em tantos outros, foi o factoide, tempero da narrativa que a militância midiática serve à sociedade.

Transcrevo trecho do excelente artigo de Alexandre Garcia publicado na Gazeta do Povo:

Neste inquérito, Moraes levou mais de um ano para dizer que é patente a ausência de causa para se ficar mexendo numa coisa dessas. Ainda perguntou: quais os fatos praticados por eles? Nenhum. Que meios eles têm para dar golpe de Estado? Nenhum. Capacidade de fazer acontecer algum dos objetos de comentário deles? Zero. Ou seja: ausência absoluta de materialidade.

E aí o ministro reconhece que houve um injusto e grave constrangimento. Quebraram sigilos, bloquearam bens e atingiram famílias desses empresários, responsáveis por empresas como Coco Bambu, Multiplan, Barra Shopping, W3, Mormaii, Sierra Móveis.

Só continuam sendo investigados o dono da Tecnisa, Meyer Nigri, e o Luciano Hang, da Havan, que se recusou a fornecer a senha para acessarem os computadores e celulares.

(...)

Mais adiante, conclui Alexandre Garcia:

E aí as pessoas se perguntam sobre os outros 1.390, que estão em situação semelhante e que foram levados para o presídio, viraram réus. Tudo isso é para pensarmos a respeito das liberdades, do devido processo legal e do que está acontecendo no nosso país.

Assim, também eu concluo.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 


Leonco de Carvalho Bones -   28/08/2023 13:58:26

Estamos nas mãos de ditador criminoso, sem direito a nada!! Só a arbitrariedades!!

GERSON CARVALHO NOVAES -   28/08/2023 11:18:25

Estou gostando do brasileirão! Cada time dependendo apenas de si mesmo, cada um em sua raia. Vemos a surpreendente campanha do Botafogo na liderança, seguido pelo Palmeiras a 11 pontos; depois, o sulista Grêmio, na terceira posição; o Flamengo ocupa a quarta, perseguido pelo Fluminense e pela equipe da Red Bul, o Bragantino. O quadro dos 10 primeiros, de onde, com certeza, sairá o campeão, é completado pelo Athletico do Paraná, o destaque do nordeste Fortaleza e o valente Cuiabá do centro-oeste. Adoro o meu país!

MARCO ANTONIO GEIB -   28/08/2023 11:04:29

Restabelecida as verdades do fato...a "Justiça", leia-se Ministro Alexandre Moraes, surge um grande questionamento: quem vai pagar os danos financeiros, morais e psicológicos destas pessoas envolvidas que tiveram suas vidas "devassadas, agredidas sem necessidade" ??? Pagaram o que não deviam, dado ao "excesso de zelo pelo Estado Democrático de Direito" cometido pelo Ministro Alexandre de Moraes. E agora fica simplesmente o "dito, pelo não dito" ??? A Justiça tem compensar física, moral e financeira seus "equívocos".

Danubio Edon Franco -   28/08/2023 10:55:41

Concordo plenamente. O desrespeito ao direito e livre manifestação é patente. Em um país em que para ser preso preventivamente é necessário fazer um enorme esforço interpretativo, pois as dificuldades legais são enormes, em que traficantes e assaltantes são liberados quase que imediatamente à prisão em flagrante, a prisão dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro revela-se um abuso, mesmo porque foram meros atos de vandalismo, que disso não passaram. Dizer que foram atos contra a democracia é ignorar iguais atos praticados em passado recente pelo MST e outros movimentos do mesmo naipe. Se isso não é suficiente, basta lembrar os recentíssimos atos do MST, já no governo atual. Invadir e depredar propriedade alheia não é crime, nem precisa de reprimenda maior. Isso não atenta contra a democracia.

Eloy Severo -   28/08/2023 10:04:02

O Brasil é uma vergonha.

felipe luiz ribeiro daiello -   28/08/2023 09:08:19

Democracia com presos políticos? Sem provas, sem direirto à defesa e em processo que não obedece aos ritos jurídicos.

Julio Dias -   28/08/2023 09:06:13

Os Abusadores do Poder, na agonia de tentar de manter à frente dos Desmandos Alucinados, "dobram as apostas" perdendo cada vez mais o respeito da População.

Wilson Conceição de Melo -   28/08/2023 08:23:58

Cadê a Justiça?

Marinez -   27/08/2023 13:52:34

Uma vergonha , deboche...cadê a grand imprensa "democrata" pra dar essa notícia. Lamentável o que aconteceu e acontece no Brasil. Estamos a mercê dessa gente..

Menelau Santos -   26/08/2023 17:43:06

É muito triste tudo isso que acontece com a corte de justiça mais alta em nosso país. Queria ser um viajante do tempo e estar no futuro 50 anos só pra saber o que vão escrever dessa época obscurantista. E a grande mídia quietinha como sempre. Parabens pelo texto, Professor.

Cesar -   26/08/2023 17:23:59

Boa tarde. Sentimento de covardia, injustiça e sermos obrigados assistir o silêncio de muitos a um ato tirânico é o que mais revolta e dói.