• Percival Puggina
  • 11/06/2023
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Estranho país, onde governar é emendar a Constituição.

 

Percival Puggina

 

         De início, vi a Constituição de 1988 com os olhos da suspeita, posteriormente, com repulsa e, mais recentemente, a tenho chamado em tom jocoso “queridinha do vovô”.  Esta última atitude, porém, é motivada pela observação do pouco caso que dela fazem as atuais composições dos tribunais superiores. Estaríamos melhor se ela fosse menos manipulada por casuísmos e consequencialismos não autorizados por quem tenha voto para os conceder.

Por outro lado, hoje, governar é emendar a Constituição. União e Estados estão sempre às voltas com a contagem de votos nas bases parlamentares de apoio de seus governos para emendar constituições. É uma demanda da vida real, que agrava a dificuldade de comporem, os governos, suas bases de apoio. O que normalmente seria obtido com metade mais um, se eleva para os três quintos sem os quais a Constituição é “imexível”, como o ex-ministro Magri disse ser o Plano Collor de 1990. Nossos constituintes de 1988 tinham certeza de haver realizado a obra prima do moderno constitucionalismo...

Nos longos anos de petismo, o Brasil pobre se tornou ainda mais metido a besta. Quis a Copa, as obras da Copa, e foi fazendo muito mais estádios do que necessário. Enterrou bilhões (do dinheiro de todos) no Rio de Janeiro dos Jogos Olímpicos. E jogou muitos outros bilhões de dinheiro bom em empresas trambiqueiras e governos ainda mais trambiqueiros para alimentar a corrupção no Brasil e no bas fond internacional. Agora, retomamos a gastança do dinheiro que não temos, como se a necessidade criasse dinheiro.

Pode ser rico um país com 214 milhões de habitantes que gera um PIB de apenas dois trilhões de dólares? Rico com um PIB per capita que não chega a 10 mil dólares e nos coloca na lista do FMI entre Tunísia e Azerbaijão? Rico com um PIB 10% inferior ao do Canadá, que tem uma população seis vezes menor?  Pode ser rico um país cuja economia produz tanto quanto a cidade de Tóquio? Pode ser rico um país cujo déficit fiscal cresce na batida do relógio?

Claro que não é só a Constituição a travar o desenvolvimento econômico do Brasil. Há um amplo conjunto de fatores que se foram habilmente articulando para produzir o mesmo efeito. Instituições irracionalmente concebidas geram crises, insegurança jurídica e instabilidade política. A atração dos ditos “progressistas” por tudo que possa ser ideologicamente aparelhado e atrasado dá causa a graves danos educacionais, culturais, científicos e tecnológicos.

É pouco provável que o Estado brasileiro deixe de ser metido a besta. O atraso cultural, afinal, dá força ao populismo que vive em união estável com o corporativismo. E ambos lambem a mão do Estado.

Percival Puggina (78), membro da Academia Rio-Grandense de Letras, é arquiteto, empresário e escritor e titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+.

 


Afonso Pires Faria -   12/06/2023 13:50:16

A nossa Constituição já era ruim. Ficou pior e está a piorar a cada emenda ou julgamento ao arrepio dela, pela nossa suprema côrte. Se pensarmos em uma nova, poderá já nascer pior ainda. Aceitemos pois, que vivemos em um outro regime que não o democrático.

MARCO ANTONIO GEIB -   12/06/2023 12:38:17

" Y HECHA LA LEY, HECHA LA TRAMPA" Professor jamais, em tempo algum, uma Constituição foi tão vilipendiada, desrespeitada, usada de forma mesquinha, interpretada a bel prazer de qualquer um, rasgada, reduzida a frangalhos como se fosse um bloco de anotações qualquer, como a atual "Constituição Cidadã". Os seus 250 artigos originais já sofreram mais de 119 Emendas, fora as aplicações de procedimento jurídicos feitos e decididos a revelia do Manto das Leis. Resultados temos um Brasil em completo "desgoverno político, econômico e social", aliado a uma completa insegurança jurídica onde nada tem validade. Em vez da JUSTIÇA temos a VINGANÇA ...!!! abs.

Décio Antônio Damin -   12/06/2023 11:37:15

A chamada "Constituição Cidadã" já nasceu com o populismo embutido dando direitos que , indubitavelmente, não poderia garantir....! E os governos sucessivos, exacerbados nos períodos petistas, vão acabando o "aperfeiçoamento" da obra e que está tornando o nosso futuro previsível e tristemente lamentável...!

João Jesuino Demilio -   12/06/2023 09:33:54

Nossa constituição foi OUTORGADA, não foi referendada! Errada deste da constituinte! Manipulada, nascida num momento de vingança da classe política. Quiseram criar por decreto um paraíso e criaram uma inferno! Hoje é modificada de acordo com o BANDIDO da vez! Um colcha de retalhos. Sumariamente ignorada de forma impune! ou seja: O QUE NASCEU ERRADO, NUNCA TEM CONSERTO!!!

Marcelo Assis Lemos -   12/06/2023 09:11:32

E ninguém toca no assunto de modificar a razão de toda essa imundície em que vivemos. A estrutura de poder do judiciário, os seus Tribunais, todos, e não só o STF, tem em sua estrutura a clareza de que não é composto por mérito, e como característica principal o rodízio e o mandato definido, como são no caso do executivo e legislativo. O mérito passa longe, a "indicação" está clara nas letras da Constituição, pois ela depois garantirá a "lisura" dos indicadores. Para ser um mero escriturário há que se ter aprovação de um concurso, mas para ser componente do Tribunal não, basta ser um ativista "adevogante". Rodízio? Aonde! Uma verdadeira panela. Mandato definido aonde? Ora, aos 75 anos na expulsória (Nossa que definição). Num Tribunal, e o mais clássico é o de um Júri, seleciona-se convocando 44 integrantes, sorteia-se 11 e 7 participam da votação (4 suplentes) e aquela turma participa de um determinado número de julgamentos. Para ser ministro há que ter mérito (ser concursado e o acesso por progressão na carreira). Atingido o segundo nível mais alto da carreira, se torna integrante do Tribunal, sorteia-se dentre os integrantes quem participa de determinado julgamento (rodízio) e o integrante do Tribunal permanece nesse nível por 4 anos (mandato definido) quando então será alçado ao nível mais alto de sua carreira.

José Rui Sandim Benites -   12/06/2023 08:36:43

Então! A questão da previsibilidade? A questão do equilíbrio fiscal? A questão de gastar de acordo com a arrecadação? A questão da segurança jurídica? Infelizmente, hoje tudo é superficial. Não se estuda a causa da inflação e dos juros altos. Sempre buscam soluções imediatas e paliativos. Que no determinado tempo não se sustentam. Qual a solução do endividamento? Do atual desgoverno federal. A solução é arrecadar mais. Em uma carga tributária já alta. Em pauta a reforma tributaria. Vamos emendar a Constituição. Com mais de 100 emendas. Uma colcha de retalhos. Não! A solução ao longo prazo. Buscando amortizar a dívida. Para dar mais espaço do orçamento. Assim gastar com sustentabilidade. Solução difícil não está em pauta. O que está em pauta é o consumismo que gera poluição. Opa! Mas não querem um ambiente limpo. Não são a favor do meio ambiente? Quanta demagogia. Fazueli.

Eduardo -   12/06/2023 08:36:16

Obrigado professor pela ótima análise. Ajuda-nos a perceber melhor o que sentimos. Em 1990, já dizia um meu professor na Faculdade de Direito (um decano de minha época), em outras palavras mais formais e próprias do Direito, que a quantidade de leis complementares que a CF de 88 previa e necessitava tornaria o Brasil quase "ingovernável". Parece-me simples assim ...

Menelau Santos -   11/06/2023 22:25:00

Perfeito, Professor. E há momentos em que a Constituição nem é modificada. Simplesmente é ignorada. Vide Daniel Silveira.