• Antônio Augusto Mayer dos Santos
  • 08/09/2014
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FEDERALISMO FICTÍCIO E BANCADAS MUTILADAS

Em tempos de pacto federativo – o novo lero-lero convertido em retórica salvacionista – a desproporcionalidade nas representações regionais junto ao Congresso Nacional é uma anomalia histórica tolerada sem esboço de reação.

Indiferentes e soberanos às tímidas tentativas de ajuste ou correção pela via legislativa, os 20 estados que formam as regiões Norte (7), Nordeste (9) e Centro-Oeste (4), embora reunindo menos da metade da população brasileira (43%), monopolizam 74% das 81 cadeiras do Senado Federal.

Na Câmara dos Deputados a situação não é outra quando as mesmas bancadas controlam 50,1% das cadeiras (257), enquanto que os deputados oriundos das 7 unidades que formam as regiões Sul (3) e Sudeste (4), as mais industrializadas e populosas do país (IBGE 2010), preenchem 49,9% (256). Também a maior parte dos eleitores está localizada na região Sudeste, que concentra 43,44%, somando 62.041.794 pessoas (TSE 2014), e o maior colégio eleitoral se localiza no estado de São Paulo, com 31.998.432 eleitores (TSE 2014).

Tanto a sobre-representação daquelas primeiras quanto a sub-representação das demais foram introduzidas pelo Código Eleitoral de 1932 e incrementadas a partir da Constituição Federal de 1934. É indisfarçável que essas normas, reproduzindo os desmandos e despotismos vigentes à época, sacramentaram uma federação mutilada e parlamentarmente deformada, onde a representação de várias unidades goza de um peso extra refletido através de desigualdades na formação de comissões, votações, etc. De lá para cá, a situação se consolidou. Aliás, conforme recentemente lembrou o jornalista e escritor Laurentino Gomes, tais distorções são fortemente enraizadas e tem origem no Império, quando “os conservadores tinham representação mais forte nas províncias do Nordeste e, em geral, favoreciam a centralização do poder imperial, enquanto os liberais representavam as províncias do Sul e do Sudeste – especialmente São Paulo, Minas Gerais e Rio Grande do Sul – e defendiam uma maior descentralização em favor da economia regional” (2013, p. 106).

O Brasil da década de 30, aquele queera tipicamente rural, não dispunha de urna eletrônica eonde pouco mais de 6% da população brasileira votava, estabeleceu um federalismo ilusório, assentado numa representação congressual fictícia onde a maioria da população elege menos representantes do que deveria e a minoria elege além do que devia.
Diante de configurações políticas desnaturadas pela desproporcionalidade – e pela complacência –, a representação dos estados perante o Parlamento não é autêntica.

*Advogado eleitoralista