• Percival Puggina
  • 23/04/2025
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No confessionário de Harvard

 

Percival Puggina

         Entendi perfeitamente o ministro presidente do STF, Luís Roberto Barroso, quando se referiu ao populismo autoritário em videoconferência dirigida a evento brasileiro na Universidade de Harvard. Populismo autoritário, no vocabulário do ministro, é uma síntese elegante para tudo que não presta. O que pensar de ruim se encaixa na moldura, mais ou menos como, de modo rasteiro, o esquerdismo universitário faz com a palavra fascismo e com o adjetivo fascista. Democrático, por outro lado, é tudo que ele aprecia, incluídas as descriminalizações do aborto e do porte de drogas para uso pessoal.

Claro que isso também soa como autoritário quando decidido à margem do Congresso Nacional. Impossível não perceber a manipulação de conceitos em modo discursivo, criando ilusões, como a do grão de ervilha em três cascas de noz. O autoritarismo sempre está onde interessa na hora do discurso. Por isso, quando fala sobre aborto, o ideal democrático correspondente considera a sociedade brasileira ainda despreparada para tratar do assunto... e decide por ela. Decide que feto com três meses está pronto para morrer.  

Imagino, então, que o oposto do populismo autoritário deva ser um elitismo iluminista, civilizador, que decide por todos, visto que o atributo ignorância não pode ter peso numa democracia de excelência (ou seria melhor dizer “de excelências”?).

O que mais me chama a atenção na fala do ministro não é tanto o que diz, mas o silêncio sobre o alinhamento de nosso país com China, Irã, Cuba, Venezuela, Nicarágua, Hamas e com organizações políticas do Foro de São Paulo. Algumas destas últimas chegaram ao poder e se afundaram nas negociatas verde-amarelas da Odebrecht, proporcionadas bem se sabe por quais influências. Será que aos olhos e cuidados proativos da atual composição do STF, esses parceiros não se caracterizam como extremistas nem autoritários, nem populistas? Transitam, então, sob simétrico silêncio, as consequentes rupturas, por desalinhamento, com nossos históricos parceiros do Ocidente civilizado e democrático. Meninos de Harvard, it’s complicated.

O iluminismo elitista nada diz sobre a mácula do descrédito que exceções e excessos causaram às instituições republicanas. Nem sobre a notoriedade mundial a que se alçou a ação política da instituição, por meios próprios, com estupor externo e apreensão interna.

Com a devida vênia, é impossível não comparar a conferência do ministro em Harvard com a história do sujeito que, no confessionário, se jactou de seus pecados.

Percival Puggina (80) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.


marilia mendes -   24/04/2025 17:16:23

Muito boa a analise .

Frederico Hagel -   24/04/2025 10:34:47

A questão é o que fazer com esse ministro e parte dos demais. Esperar por quanto tempo a luz, justiça Divina chegar?

Afonso Pires Faria -   23/04/2025 12:49:26

Pois é: Sinto que estamos "malhando em ferro frio". Estas criaturas já perderam a noção do razoável. Estão em um beco sem saída e, tal qual quem está se afogando, age apenas por instinto de sobrevivência. Pouco importa a quem estejam prejudicando. "sic transiti glória mundi"