• Sílvio Munhoz
  • 27/05/2023
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HUMORISTA: leve a sério...

 

Sílvio Munhoz

          O tema censura não pode sair da pauta até o Congresso decidir e – queira Deus – rejeitar o PL 2630. Fato que repercutiu há poucos dias foi a censura ao especial publicado no YouTube pelo comediante Léo Lins (confesso que não conhecia).

A solidariedade dos colegas veio rápida e outro comediante lascou: ”Um absurdo! Não cabe à Justiça – e nem a ninguém – aprovar e censurar piadas alheias. Pode-se gostar, detestar ou criticar a comédia ou o comediante, mas piadas são só piadas”.

O frasista é um conhecido progressista/esquerdista e, como costuma acontecer, não se importa quando a censura é contra quem sustenta ideias diferentes.

Não gosto de dizer isso, mas, EU AVISEI, assim como inúmeras outras vozes no Brasil, quando o autoritarismo – e, com ele, a censura - chega, acaba atingindo todo mundo, inclusive os comediantes e as piadas... mesmo aqueles que apoiam os detentores do poder. É inexorável, sempre foi assim, sempre será e a história demonstra.

A censura determinada pela “justiça” a pedido do MP paulista, por estar o ator “reproduzindo discursos e posicionamentos que hoje são repudiados” – expressão vaga em cujo contexto cabe quase tudo -, com base na lei nº 14.532, promulgada pelo atual Presidente no dia 11/01, escondido pela efervescência do momento, pois o Brasil só discutia os atos de 08/01 na praça dos três poderes, que viraram tema de CPMI do Congresso Nacional para os devidos esclarecimentos.

 A lei equipara “injúria racial” a “racismo”, dizendo: “Injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional”. Não analisarei, agora, aspectos como a analogia de “cor”, “etnia”, “procedência nacional”, “pessoa ou grupos minoritários” (art. 20-C) com raça para atrair os rigores do inciso XLII, do artigo 5º da CF, nem possibilitar, como no caso, censura prévia, vedada pela Constituição e o Pacto de San José da Costa Rica (art. 13.2).

No tocante à comédia, à piada, a previsão está no §2º-A, que fala em “atividades... culturais destinadas ao público” e no art. 20-A que estabelece: “Os crimes previstos nesta Lei terão as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade, quando ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação”. Eis a piada, aliás, em artigo de leitura obrigatória, a Lei foi apelidada de Antipiada.

Errado, portanto, o progressista da frase citada acima, pois agora há uma lei que criminaliza a comédia e, portanto, a Justiça pode sim, com base nela, vetar a piada.

Há, entretanto, uma clara contradição que pode levar a declaração de inconstitucionalidade, ilegalidade ou inaplicabilidade do artigo que censura piada ou comédia... para configuração do tipo penal de INJÚRIA RACIAL necessário dolo específico - no jurídiquês, animus injuriandi. Não basta “injuriar alguém ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro”, a isto deve ser agregada a vontade de injuriar.

E aí, realmente, “pode-se gostar, detestar ou criticar a comédia ou o comediante, mas piadas são só piadas”. Quando um comediante conta a piada não há dolo específico de injuriar, seu desejo, seu intento (dolo) é fazer a plateia ou interlocutor rir. Não há crime, pois. Muito embora alguém se sinta ofendido. O fato de alguém se ofender não significa que o autor da piada tinha “o desejo, o ânimo, o dolo” de ofendê-lo...

Fato é - seja comediante ou não, seja de esquerda, centro, direita - quem não quer ser “amordaçado” em futuro próximo, pois para o “novo governo” – espero que seja só bravata - nas palavras do “ministro da justiça”: “esse tempo da liberdade de expressão, como valor absoluto que é uma fraude, que é uma falcatrua, esse tempo acabou no Brasil, acabou, foi sepultado”, comece, imediatamente, a lutar não só para que o Congresso revogue o absurdo artigo 20-A da Lei, mas, sepulte e enterre bem fundo o PL 2630, alcunhado PL DA CENSURA.

Encerro com frase do artigo recomendado acima, onde a lei é chamada de “Lei  Antipiada”.

“A proibição do humor — ou, antes, a sua substituição por um humor permitido e reverente aos donos do poder — é a marca registrada das ditaduras.” Flávio Gordon.

Que Deus tenha piedade de nós!