• Antônio Fernando Pinheiro Pedro
  • 24/07/2016
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O CONTRA-GOLPE É O VERDADEIRO GOLPE NA TURQUIA

Antônio Fernando Pinheiro Pedro
(Publicado originalmente por VozdaTurquia)


Na minha juventude, era um devorador de livros sobre história, política e estratégia. Assim, posso dizer que sou mantenedor do meu próprio “google” – um “buscador” próprio, com razoável capacidade de remissão…

Recentemente, três livros me vieram à mente, ao me deparar com a fracassada tentativa de “golpe militar” contra o presidente Recep Tayyip Erdogan, chefe de Estado da Turquia. São eles: “Golpe De Estado – Um Manual Prático”, de Edward Luttwak, “Manual do Golpe de Estado”, de Cúrzio Malaparte e “A Insurreição Armada”, editada pelo Comintern – Internacional Comunista, de 1928.

Curzio escreveu sua obra no início dos anos 30, observando a contaminação da sociedade, a intimidação política e a tomada do Poder nos estados submetidos a estruturas “frágeis”, levadas a cabo por comunistas, fascistas e nacionalistas – sob o ponto de vista político, psicológico e social. Luttwak escreveu seu manual no final dos anos 60, baseado em sua experiência como estrategista militar americano, descrevendo o esquema-padrão de golpe militar típico dos anos da Guerra Fria. Já o Comintern abordou várias insurreições ocorridas no primeiro quarto do século XX, na Ásia e Europa, para delas extrair lições práticas de como organizar militarmente forças populares, tomar o poder nas metrópoles e iniciar a revolução nas Capitais (abordagem tipicamente urbana).

O que vou tratar aqui, no entanto, não será do conteúdo dessas obras – recheadas de considerações de ordem prática e ideologicamente bastante diversas. Mencionei os livros porque concluí o que entendo que seus autores concluiriam, analisando o caso do “golpe” na Turquia: não foi um golpe mas, sim, um simulacro visando justificar um CONTRA-GOLPE.

Com efeito, não se toma o poder em um país como a Turquia, bloqueando pontes, assumindo programação de redes de TV, metralhando multidões a esmo com um helicóptero (sem ter apoio aéreo), bombardeando pela metade o parlamento e protagonizando quarteladas (sem assumir o comando das forças policiais de Estado). Muito menos se toma o poder sem prender ou eliminar o chefe de Estado e seus ministros…

Inadmissível que militares tarimbados, no comando de uma das mais poderosas forças militares da Europa e Oriente Médio, protagonizassem tamanho fiasco, a menos que estivessem reagindo fragilmente a um golpe de estado iminente do próprio governo em exercício.

Se alguém saiu fortalecido em sua estratégia de endurecer o regime e suprimir o que restava de liberdades no Estado Turco, este foi a própria “vítima” do golpe fracassado – o Presidente Recep Tayyip Erdogan.

Convenientemente “fora” do alcance dos golpistas, Erdogan retornou, não para Ankara, a Capital mas, sim, para Stambul, o centro midiático da Turquia, para anunciar, já no aeroporto, o fim do golpe, antes que as tropas golpistas estivessem efetivamente desmobilizadas…

Até o momento, o governo turco já prendeu mais de 6000 pessoas, incluso milhares de magistrados, oficiais militares, parlamentares, clérigos, professores, jornalistas e diplomatas…

Erdogan fará uma “limpa”, não de golpistas mas, sim, de elementos de sustentação do Estado Democrático de Direito na Turquia. O golpe, portanto, não foi contra Erdogan. Foi de Erdogan contra a democracia e o laicismo no Estado turco.