• Maria Lima, Marco Grillo e Simone Iglesias
  • 05/05/2016
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O GLOBO SOBRE DILMA E SUAS MORDOMIAS NOS PRÓXIMOS MESES

 

Em matéria dos jornalistas Maria Lima, Marco Grillo e Simone Iglesias, O Globo de hoje analisa os direitos da presidente em período de afastamento.

RIO E BRASÍLIA — Se tiver o mandato suspenso por até 180 dias, na próxima semana, a presidente Dilma Rousseff terá de adaptar seu dia a dia a uma estrutura enxuta. Os direitos de Dilma como presidente afastada serão estabelecidos pelo Senado, que deverá decidir por um padrão modesto, mas não tanto como o concedido ao ex-presidente Fernando Collor, em 1992, quando o Congresso também o tirou do cargo.

Dilma e o PT pretendem transformar o Palácio da Alvorada num “bunker” de resistência para tentar impedir a cassação definitiva do mandato. A permanência na residência oficial da Presidência já está garantida; o próprio vice Michel Temer a considera pertinente.

Collor passou o período de quase três meses entre o afastamento e a cassação definitiva, em 1992, sem acesso a uma estrutura oficial oferecida pelo governo. O então ministro da Casa Civil, Henrique Hargreaves, e a equipe de Collor chegaram a negociar a instalação de um gabinete na Granja do Torto, além da cessão de assessores e carros, mas o acordo não prosperou.
Segundo a assessoria do hoje senador Fernando Collor (PTC-AL), durante o afastamento, em outubro, até o julgamento, em dezembro, ele ficou “à míngua”, isolado na Casa da Dinda, propriedade de sua família.

ITAMAR REJEITOU PEDIDOS DE COLLOR
O ex-presidente trabalhava na biblioteca, um anexo da Dinda, acompanhado de poucas pessoas: o jornalista Etevaldo Dias, porta-voz da Presidência no fim do seu governo, o ajudante de ordens, coronel Dário César Barros Cavalcante, uma secretária e uma pessoa responsável pela limpeza. Dois seguranças particulares também foram contratados.
Dias conta que a equipe era mantida pelo grupo de comunicação da família de Collor, em Alagoas, além da eventual ajuda do ex-senador Luiz Estevão, fiel aliado. Em 7 de outubro de 1992, o GLOBO publicou a lista de pedidos de Collor durante seu afastamento: acesso à Granja do Torto, vinte assessores, um helicóptero para deslocamentos curtos, dez carros oficiais, cinco motos, oito seguranças, passagens aéreas gratuitas para viagens nacionais e internacionais e apoio logístico de órgãos públicos e embaixadas, caso saísse de Brasília.
Isolado. Em seu afastamento, Collor passava o dia num escritório improvisado num anexo da Casa da Dina - Roberto Stuckert/17-12-1992
Ao assumir o poder, o presidente Itamar Franco estudou editar uma medida provisória para definir os direitos do presidente afastado.
— Não teve medida provisória nenhuma. O Collor teve o que a lei do impeachment previa: um carro oficial com dois motoristas, seguranças e o salário reduzido — diz Hargreaves.
Itamar assustou-se com a lista de desejos, e nada foi oficializado. Os pedidos repercutiram no mundo político na época: “Se o governo quer dar casa para o Collor, então que conceda um espaço na Casa de Detenção. Ele cometeu o que cometeu e agora vem pedir mordomias? Ele que vá pedir para o PC (Farias)”, disse Luiz Inácio Lula da Silva, então presidente do PT.
— A primeira sinalização que tivemos foi a de que iriam respeitar, manter o status de presidente (para Collor) e permitir o uso da Granja do Torto. Mas durou 24 horas. Chegamos na Casa da Dinda e, em seguida, foram retirados os carros e seguranças — afirma Dias: — Não houve nenhum apoio oficial. Não tinha nem cafezinho. É o maior isolamento que uma pessoa pode passar.
O ex-porta-voz se lembra de uma viagem de Collor nesse período, a São Paulo, no avião de Estevão, já que não houve cessão de aeronave oficial. Nessa fase, ele não fez nenhuma viagem ao exterior, portanto não houve necessidade de apoio de embaixadas.

ENTRE AS REQUISIÇÕES, UM AVIÃO DA FAB
Nas conversas que representantes do governo Dilma vem tendo com integrantes do Senado e do Judiciário, foi acertado que ela apresentará na próxima semana, se for afastada, uma lista de pedidos para seu dia a dia. A solicitação deve ser entregue ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que comandará o processo de impeachment.
Entre os pleitos já feitos por integrantes da Casa Civil, estão a permanência no Alvorada, a manutenção das estruturas de segurança e de tratamento médico a Dilma e sua família — a preocupação maior é com a mãe dela, Dilma Jane, de 92 anos. Outro pedido é a cessão de um grupo de assessores remunerados, ainda sem tamanho certo, mas que deverá girar em torno de 15 pessoas, e um avião da FAB para deslocamentos. Essa aeronave não deverá ser o avião presidencial.

SALÁRIO NÃO DEVERÁ SER REDUZIDO
O Senado tende a não reduzir o salário de Dilma. A Lei do Impeachment prevê um corte pela metade, mas a Constituição determina que é inconstitucional essa redução. O objetivo no Senado é deixar que o presidente do STF faça a ponte entre Dilma e o novo governo.
— Seria ridículo o plenário do Senado ter que decidir quantos assessores a presidente terá e qual estrutura manterá. Imagine senadores apresentando emendas para ampliar de dez para 30 assessores, e assim por diante — diz um auxiliar do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL).
Renan disse, na quarta-feira, que a definição sobre os direitos de Dilma, caso seja afastada, só acontecerá após a votação do relatório do senador Antônio Anastasia (PSDB-MG).
— Não tem nada decidido sobre isso. Cada dia com sua agonia. Não vou fazer nenhum movimento que dê a entender que estamos consolidando uma decisão — disse.


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