• Marcelo Duarte Lins
  • 11/05/2025
  • Compartilhe:

A eleição dos reflexos

 

Marcelo Duarte Lins

         Assistindo a um documentário sobre lobos, me peguei pensando: será mesmo que somos a espécie mais inteligente do planeta? Porque, veja bem, entre os bichos selvagens, liderança é coisa séria. Não se entrega o rumo da matilha ao mais simpático — nem se espera que o doente indique o caminho da caça. Quem lidera, lidera porque sabe o que faz.

Na floresta, o silêncio obedece ao instinto.

O lobo velho não guia a alcateia porque sorri bem — mas porque sabe o caminho de volta no escuro.

Entre folhas e presas, quem lidera é quem escuta o vento, quem sente o chão tremer antes da tempestade.

Ali, o fraco descansa — não comanda.

Mas no reino das luzes artificiais e dos discursos decorados, os humanos preferem o eco à bússola.

Trocam o sábio pelo simpático, o que vê longe por quem diz o que alivia.

A democracia não falha por si.

Falha quando o povo, em vez de buscar a sabedoria, procura um reflexo que o conforte.

Elege o espelho, não o farol.

Vota em quem lhe devolve o próprio rosto —

mesmo que esteja sujo, cansado ou cego.

Assim, o poder vira palco.

Não há planos — só performances.

O ignorante brilha porque fala fácil,

e o preparado cansa,

porque pensar é verbo que exige pausa —

e a pressa da multidão não perdoa a dúvida.

Nietzsche sussurra, de longe:

“As imagens vencem a razão.”

E nunca os holofotes brilharam tanto para tão pouco.

Vivemos tempos em que a inteligência anda de cabeça baixa,

e a mediocridade desfila como se fosse destino.

A história, esquecida, bate à porta

como um velho professor que ninguém quer ouvir.

Não é “como ele chegou lá” que devemos perguntar,

mas: “por que continuamos empurrando?”

E talvez a resposta seja só essa:

Pensar exige silêncio, exige fôlego —

e há quem prefira gritar slogans

a respirar fundo e enxergar o abismo.

Entre nós, civilizados e cheios de diplomas,

parece que a lógica tirou férias.

Elegemos líderes não por sabedoria, mas por carisma.

Não importa se o sujeito tem visão de futuro;

basta que fale bonito, diga o que queremos ouvir e sorria bem nas selfies.

É o show da representatividade emocional.

Mas, claro: pensar cansa.

E sempre há alguém pronto para obedecer

desde que o idiota tenha carisma.

Aguardemos, pois, a Revolta dos Competentes e dos Probos.

Que ajam como lobos — e saibam liderar o povo indicando o Norte a ser tomado.

*        O autor, Marcelo Duarte Lins é ex-comandante da Varig e autor do livro “Caso Varig”. O texto acima foi extraído da página do autor no Facebook.