Percival Puggina

07/02/2024

 

Percival Puggina 

         Em qualquer placar, 10 a 1 ou 9 a 2 é goleada, com direito a flauta e volta olímpica.

Imagine um tribunal constitucional ser, também, última instância judicial, transformar-se em tribunal penal da sociedade e assumir-se como corte divina, ou seja, onisciente, onividente e onipotente, a emitir sentenças de Juízo Final. Imagine que nesse tribunal quase todos, num grau ou noutro, são "progressistas" ou marxistas, selecionados a dedo segundo a mesma cartilha. Um poder de Estado com tais características faz a revolução com o abanar das togas. Para cumprir seu querer, dispensa luta armada. Não usa barracas de campanha, não cava trincheiras e não precisa de arsenais. Opera a partir de luxuosos gabinetes. Seu material bélico está contido em meia dúzia de princípios constitucionais lançados para onde a ideologia aponta.  

Um tal poder prescinde de Gramsci, Escola de Frankfurt, movimentos sociais, patrulhamento, infiltração e doutrinação. Bastam onze homens e seus votos. E tudo fica parecendo Estado de direito enquanto se proclama servida a Democracia.

A bússola das decisões normativas sobre os grandes temas da vida nacional está saindo do Congresso onde opera a representação proporcional da opinião pública. Aquela história dos três poderes, este faz a lei, aquele executa e aquele outro julga - lembra-se disso? - vai para as brumas do passado. É como se ressoassem para o Brasil as primeiras palavras do Gênesis, pois as instituições estão sem forma e as trevas cobrem a superfície do abismo. Sob tal poder não há nem haverá luz e toda divergência será castigada. Quem ousaria dissentir do rufar das togas?

Sentado diante da tela do computador, ponho-me a pensar sobre o que vejo e me permito afirmar, na perspectiva de uma honesta divergência, que, a despeito de todos os rancores e maus humores:

- Ser conservador não é crime hediondo.

- Ser liberal não é crime hediondo.

- Ser cristão não é crime hediondo.

- Ser de direita não é crime hediondo.

- Ser lavajatista não é crime hediondo.

- Ser bolsonarista não é crime hediondo.

- Haver preferido Bolsonaro a Lula não foi crime hediondo.

- Amar a liberdade e divergir daqueles que a querem reprimir não é crime hediondo.

Cada dia traz novas trevas sobre o abismo produzido por aqueles que usurpam o lugar de Deus enquanto ouvem Hosanas! Canta quem neles crê porque convém e canta o poder por trás do poder. É ou não é, Centrão?

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Percival Puggina

05/02/2024

 

Percival Puggina

            Estávamos num programa de debates sobre direitos humanos. Lá pelas tantas, um dos meus interlocutores falou em “dignidade da pessoa humana”. Eu os sabia marxistas e, portanto, materialistas. Perguntei-lhes, então, como um desafio: qual o fundamento da dignidade da pessoa humana?

Sabia que essa questão coloca o materialismo e seus adeptos num beco sem saída. Para respondê-la, o microfone correu a mesa. Falaram, falaram e nem de longe trataram do tema. Quando retornou a mim, chamei a atenção para o fato de que não haviam me dado qualquer resposta. Mencionada por materialistas, a dignidade da pessoa humana é mera retórica.

Ante a provocação que fiz, um deles saiu-se com esta: "O fundamento da dignidade da pessoa humana é a reciprocidade nas relações". Ora, salta aos olhos que a reciprocidade, vale dizer, a equidade nas relações e trocas interpessoais e sociais, pode ser, em alguns casos, fundamento da justiça, mas nem de longe serve como alicerce para a dignidade do ser humano. Em determinadas situações talvez seja apenas consequência.

Entendamos isso porque é importante. Quem vive em situação de carência mental, material ou física tem, como pessoa, dignidade igual à da mais eminente celebridade e à da mais justa e generosa das criaturas. E em quase nada pode o desvalido contribuir para a tal reciprocidade. Exigi-la em certos casos pode ser puro e duro egoísmo. Há ocasiões em que a reciprocidade, como critério de justiça, se fundamenta na dignidade da pessoa humana, mas o que nela se sustenta não lhe pode servir, também, como suporte.

Enfim, a questão que propus é irrespondível pelo materialismo. Se tudo é matéria, instinto e razão, o ser humano é apenas o mais complexo dos animais. E somente isso. Resulta, assim, meramente retórica toda menção que marxistas façam à dignidade humana. A prova provada me veio logo após, quando, tendo eu comentado a animalização conceitual da pessoa, se vista apenas como ser material, meu interlocutor da ocasião afirmou que "os animais também têm dignidade". Foi ou não uma rendição? Homem e bicho é tudo a mesma coisa? Animais merecem respeito, mas a eminente dignidade, fundamento das melhores constituições, quem a tem é o ser humano.

Há muito proponho essa questão em debates e ainda não encontrei um materialista que fizesse a respeito dela qualquer afirmação consistente. Falam sobre direitos humanos como parte de uma agenda muito mais ideológica do que efetivamente humana. O humanismo sem Deus é um humanismo desumano, reafirmou recentemente Bento XVI na encíclica Caritas in Veritate. Com efeito, somente o revelado à tradição judaico-cristã satisfaz como resposta à questão contida no primeiro parágrafo deste artigo. É por isso que nela se fundamenta toda uma civilização e o que há de melhor em sua cultura: o homem é imagem e semelhança de Deus, e objeto de Seu amor.

Alguém poderá dizer: “Eu sou ateu e trato com respeito os meus semelhantes”. Sei disso, no entanto, é preciso perceber: a conduta civilizada que independe de identitarismos tem base cultural. É a cultura de uma civilização que herdou princípios da preciosa fonte judaico-cristã. Reinstituir os identitarismos é, por assim dizer, um retorno ao paganismo.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

02/02/2024

 

Percival Puggina 

         Todos sabemos que os principais veículos de comunicação do país, à semelhança do sistema antimíssil de Israel, instalaram um iron dome (cúpula de ferro) de proteção ao governo Lula. Todos sabemos quem custeia essa abundante proteção e a repetição goebbeliana de narrativas e correspondentes adjetivos criados em laboratório e descarregados sobre a direita.

Nem mesmo esse pseudojornalismo, porém, conseguiu dissimular o tamanho do buraco que se tornou visível no fechamento das contas federais do 2023. Foi o segundo maior desde quando Tomé de Sousa inaugurou o Brasil instalando o Governo Geral na vila de Salvador em 1548. A bem da verdade, o número é ainda maior porque o governo incluiu como “receita primária” os R$ 26 bi esquecidos pelos trabalhadores no cofrinho do Fundo PIS/PASEP e transferidos para o Tesouro.

No final do governo anterior e com a legislatura eleita em 2018, o governo que assumiu em 2023 pressionou o Congresso para elevar em R$ 170 bi o teto de gastos. Ou seja, quis entrar no Palácio distribuindo favores como Papai Noel perdulário, pendurado no bilionário cartão de crédito corporativo que arrancou do Congresso.

Já nem falo nos pequenos e grandes luxos que reserva para si mesmo o casal governante quando, para o conforto próprio, esbanja no Brasil e no exterior. Refiro-me às despesas com 11 e 12 dígitos que surgem quando o senhor da Casa Grande se lembra da senzala e dá curso à política de distribuição de benefícios. Matéria do próprio governo destaca 75 programas, entre novos e retomados. Por exemplo: aumento do salário mínimo acima da inflação, o Desenrola, Minha Casa Minha Vida, Programa de Segurança Alimentar, Programa de Aceleração do Crescimento, Bolsa Atleta, Mais Médicos, Bolsa Família, Brasil Sem Fome, Brasil Sorridente, Luz para Todos, Voa Brasil. Por aí vai a lista, bilhões para cá, bilhões para lá, como se não houvesse amanhã para pagar. Nada, absolutamente nada, diferente do que já vimos em versões anteriores de Lula e de PT. 

O governo, porém, soma programas sem qualquer articulação, visando apenas a atender a autopromoção de Lula e da oligarquia que se serve da mesma mesa.

Por outro lado, manter de pé a ficção que levou Lula à presidência está cobrando da sociedade um outro preço, altíssimo. A confiança nas instituições despencou.  Por conseguinte, na mesma proporção, engrossou o tom das ameaças à sociedade e ganhou vigor a autoproteção do regime. Subiu a cotação do voto parlamentar enquanto se esculpiu em pedra, como para sempre, a inerte cara de paisagem das presidências da Câmara e do Senado.  

É o que a oligarquia quer que também a sociedade faça: que se mantenha inerte, muda, com cara de paisagem, enquanto a democracia morre e o futuro não é uma dádiva, mas uma dívida.   

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

29/01/2024

 

Percival Puggina 

         As presidências das casas do Congresso Nacional deveriam ser troféus que distinguissem seus titulares. Afinal, são o topo da pirâmide de nossa representação política. É no parlamento que ganha voz o pluralismo da sociedade. Seus presidentes, na Câmara e no Senado, recebem dos respectivos pares a honra de dirigir as casas legislativas e falar por elas.  

No Brasil, porém, mede-se em léguas a distância entre o que é e o que deveria ser. As presidências das duas Casas são favorecidas por um modelo institucional feito sob medida para dar errado e concentrar poderes nas mãos de seus titulares. Em relação a elas, ambos são senhores dos raios e dos trovões. Na Câmara e no Senado, só chove quando eles querem. Conhecendo os Regimentos Internos e o modo como funciona a política no Brasil, só poderia dar no que se vê. Imagine, então, no que não se vê...

Por isso, os dois parlamentos quase nada fazem do que a sociedade deseja que façam. Quando eventualmente isso acontece, estamos perante uma incomum coincidência entre o que a sociedade quer e o que eles querem.   

Este artigo, porém, se refere à Câmara dos Deputados. A Casa legislativa virou estande de tiro ao alvo político nos inquéritos do STF, poder de Estado onde esses inquéritos se dividem em dois tipos:  os por corrupção, parados em água de poço no aguardo da prescrição e os voltados ao polo direito do espaço político nacional, que tramitam em velocidade proporcional ao barulho que fazem.

Na Câmara dos Deputados vigora o absolutismo monárquico de Arthur, rei das duas Coroas – rei da Câmara dos Deputados e do Centrão. Não faltará quem sinta, em relação a isso, um déjá-vu de tempos passados, como, por exemplo, durante a presidência de Eduardo Cunha. A repetição da situação apenas sublinha a impropriedade desse acúmulo, pois a coroa da minoria ambulante chamada Centrão, território livre e paraíso fiscal da criptomoeda moeda chamada “Emenda parlamentar”, não se confunde com a Câmara dos Deputados. A sobreposição da coroa do Centrão à do Legislativo para atender às conveniências do rei faz mal à cabeça de Arthur. E ao Brasil. Como cidadão, protesto.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

27/01/2024

 

Percival Puggina 

         Lendo sobre Goebbels, lembrei-me da conversa pública entre Lula e Nicolás Maduro. Provavelmente, Hitler também recomendava a Goebbels que construísse uma boa narrativa e garantia a seus generais que ela seria melhor do que a narrativa dos que falavam mal dele – ingleses, norte-americanos e demais Aliados. Isto, porém, é mera especulação minha.

Através do trabalho de Goebbels, o Führer influenciou a estética e as expressões artísticas durante o Terceiro Reich, cobrando delas resultado político, ideológico e de afirmação da superioridade ariana. Joseph Goebbels sabia a importância dos meios culturais para a política e os usou para que a sociedade alemã refletisse a doutrina do Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemães. Impôs seu projeto ao cinema, ao teatro, à música, às artes plásticas, à arquitetura e à literatura. Com uma das mãos, criou a Casa de Arte Alemã e promoveu a exibição Grande Arte Alemã; com a outra, queimou milhares de obras ditas “degeneradas” porque não cumpriam o dever de espelhar e proclamar a superioridade biológica do mesmo povo que levavam para o abismo da guerra.

É curioso que, apesar da multiplicidade das competências de Goebbels em várias áreas de conhecimento, sua fama reverbere apenas o sujeito que falou sobre a eficácia da mentira contada mil vezes. Merecido epitáfio! De fato, a mentira foi eixo de sua sinistra existência, em cujos atos finais matou a mulher, os seis filhos e a si mesmo.

Enquanto ele se dedicava a tratorar culturalmente a Alemanha de seu tempo (1933 a 1945) para a colheita de Hitler, um grupo de marxistas judeus alemães criava e começava a operar a Escola de Frankfurt (1930). Nela, filósofos e cientistas sociais como Horkheimer, Adorno, Marcuse, Fromm, Benjamin, Pollock desenvolveram ideias anticapitalistas e avessas ao comunismo soviético. Seus trabalhos, nas décadas seguintes, foram usados para atacar pelo lado esquerdo as bases da tradição judaico-cristã. Nas bibliotecas universitárias, as obras desses autores estão, ainda hoje, na altura dos olhos de quem percorre suas prateleiras.

Naqueles mesmos anos trágicos da década de 30 do século passado, Antônio Gramsci escreveu os famosos “Cadernos do Cárcere” (1929-1939) na casa de reclusão de Turi onde cumpriu pena até dois dias antes de morrer. Suas anotações revolucionaram as estratégias comunistas, mostrando como a manipulação dos meios culturais permitiria estabelecer a hegemonia de “uma nova forma de consciência” e capturar a ordem política nas sociedades capitalistas. Há 90 anos, portanto, o pensamento revolucionário, totalitário e desumano, já conhecia a importância política da cultura.

Em 1933, a Escola de Frankfurt, fugindo da perseguição nazista, migrou para os Estados Unidos. Certamente por isso aquele país disponibiliza o maior arsenal bélico à guerra cultural contra si mesmo e contra o Ocidente. “Mas e o Brasil?”, perguntará o leitor. Como tenho repetido, a esquerda brasileira “copia, traduz e cola”. Copia do idioma inglês as receitas para desagregação da sociedade e demolição do Ocidente, traduz para o português pelo Google Translator e cola em seus estudos, cartilhas e bibliografias. Serve-se, pois, do mesmo arsenal norte-americano e com ele orienta a produção das narrativas feitas sob medida para a realidade brasileira. Por isso, na falta de mato para carpir, Lula pode dar “aula de narrativas” a Nicolás Maduro.

A insurreição cultural em curso tem gerado no Brasil uma decadência dos padrões de convívio social. Parte essencial de sua estratégia inclui exatamente o combate à beleza, à verdade e às virtudes. Ela exige a degradação do ser humano até sua desumanização, incluindo a bandidolatria, o aborto, a cristofobia, o desamor à pátria, o relativismo moral, a liberação das drogas, etc. Pessoas das quais não se poderia esperar um compromisso com a mistificação repetem narrativas fraudulentas por condicionamento “da nova consciência” imposto pela repetição.

O advento das redes sociais, caóticas por natureza, rompeu a hegemonia da comunicação que se estabelecera no Brasil. Isso criou problemas para a dominação cultural esquerdista que seguia os velhos ensinamentos da Escola de Frankfurt, dos Cadernos do Cárcere e das ações com que Goebbels implantou o conjunto ideológico do nazismo na cultura do povo alemão. Todo o empenho em “regulamentar as redes sociais” quer, mesmo, impor a elas um silenciador, minimizando seu impacto.

A oligarquia que retomou o poder no Brasil depende, fundamentalmente, da Rede Goebbels de narrativas. Ela faz o trabalho cotidiano de bate-bate na mesma tecla que ficaria enfadonho e insuficiente se assumido pelos oligarcas em suas manifestações. Na prática, eles constroem as versões e a Rede, com habilidade e boa técnica, repete em escala nacional não mil, mas milhões de vezes, há décadas, as ideias e narrativas esquerdistas, frankfurtianas e gramscianas, prendendo-nos a um passado tão perverso quanto corrupto.

Os males que disseminam não proporcionam, porém, fundamento estável ao êxito que, por enquanto, comemoram.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

24/01/2024

 

Percival Puggina 

        "Crês que a oposição vai derrotar a esquerda com discurso sobre ética? Com teses sobre o Brasil? Com visão de história? Com críticas construtivas? Papo furado, cara!". Meu amigo continuou a descrever suas observações:  "O PT começa a trabalhar o eleitor desde que ele entra na estufa da maternidade. Lá já tem uma atendente criticando "o sistema".

Essa conversa aconteceu em algum momento do final do governo Dilma I e, no fundo, as coisas ainda estão muito parecidas com isso. A apropriação das mentes começa cedo e passa pelas experiências coletivistas do maternal. Engrossa nos cursos fundamental e médio quando o sistema cai nas mãos dos pedagogos marxistas, dos discípulos de Paulo Freire, do politicamente correto e dos “coletivos” étnicos ou identitários. Vai promovendo a relativização da verdade e do bem, a tolerância com tudo que está errado e a intolerância para com quem se atreve a apontar quaisquer erros na ortodoxia esquerdista. E vai adiante com o controle dos sindicatos, dos fundos de pensão (oba!), dos movimentos sociais, de uma constelação de ONGs (oba!), dos cursos de graduação e de pós, das carreiras jurídicas, dos seminários e cursos de teologia, da CNBB, da Globo, da cozinha dos jornais, do escambau. Se o convidarem para um Clube do Bolinha, leitor, em seguida você descobrirá que o Bolinha que manda é companheiro.

Quando eu estava desfiando a lista, meu amigo perguntou: "Os sindicatos a que te referes são de trabalhadores ou patronais?", ao que eu esclareci - "De trabalhadores, claro". Mas ele me advertiu que também as organizações patronais se aparelham quando o partido assume o controle do Tesouro e do BNDES. Imagine o leitor: temos no Brasil empresários tão petistas quanto seus operários. E arrematou: "Por motivações opostas".

Ninguém pode acusar o PT e sua parceria esquerdista, quando fora do governo (de qualquer governo), de fazerem oposição cordial, bem educada, respeitosa, construtiva. Como o boxeador martela o fígado do adversário, sistematicamente eles cuidam de desfigurar a imagem do opositor. Nariz, lábio, supercílio, orelha. Vencido o pleito, ocupada a cadeira, o que passam a cobrar de seus opositores? Colaboração e fidalguias. Talquinho e perfume. E até a pequena oposição que no Congresso Nacional resiste às tentações inerentes ao cabaré do Erário passa a ser acusada de radicalização e impertinência, polarização (!) e discurso de ódio.

Aqui, desde meu ponto de vista, o nariz quebrado que vejo é o da Constituição, o supercílio aberto é o do Estado de Direito, olábio esmigalhado é o da liberdade de expressão e a orelha rasgada é a do direito à informação e do respeito à intimidade da vida privada.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

22/01/2024

 

Percival Puggina

         Durante três décadas contadas da redemocratização (1985), passando pela Constituinte (1988), até a eleição de Bolsonaro (2018), o pensamento conservador, assim como o liberal, estiveram emudecidos. Tal silêncio era quebrado apenas, aqui ou ali, por eventuais articulistas dispersos em veículos da “grande mídia”. Entre estes, se agigantou o inesquecível e emocionante Olavo de Carvalho, com sua extraordinária obra intelectual e pedagógica. O notável mestre tomou para si o encargo de formar, desde o exílio em Richmond, na Virginia, uma geração de intelectuais brasileiros.

Desde 1985, eu fui um daqueles articulistas dispersos. Escrevia para jornais e participava de programas de debates. Ao longo do período, quem queria me depreciar usava os adjetivos conservador e liberal como xingamento. Eu agradecia a observação, mostrava surpresa com o esquerdismo confessado pelo interlocutor e ia em frente.

O teatrinho das tesouras montado pelo PT e pelo PSDB, ou seja, por Lula e FHC, obstruiu a propagação e a organização de movimentos conservadores e liberais, disponibilizando à esquerda todo o tempo do mundo para submeter a nação ao pesadelo gramsciano – a hegemonia do espaço cultural. Simultaneamente, porém, as décadas de encenação proporcionaram o tempo de observação necessário para que a verdade fosse percebida, mesmo no denso nevoeiro das narrativas: levavam-nos aos portais do inferno descrito por Dante. Dezenas de milhões de brasileiros se descobriram conservadores, liberais, de direita!

Nesse momento, Bolsonaro emerge da cena política com meia dúzia de ideias cuja validade a nação reconheceu. A partir daí, como fogo morro acima, o povo o pôs nos ombros e o levou às ruas e à presidência.

Os anos subsequentes são de passado bem recente. Não é preciso rememorar os meios e os caminhos pelos quais os magos da esquerda – cartolas na cabeça, com prestidigitações, panos vermelhos, sigilos, coloridas explosões e baforadas de fumaça – restauraram sua hegemonia.

Hoje, sabemos que o Brasil é parte do grande teatro onde se desenrola a guerra contra o Ocidente. Toda uma cultura e civilização – não por acaso as mais elevadas que a humanidade já conheceu – está sob ataque. O inimigo não é externo, mas interno. Seu plano de poder precisa promover o suicídio do Ocidente, com a morte de seus princípios e valores fundantes! O confronto é cultural, é político e se trava por humanidade, liberdade e democracia.

Quem comanda o que está em curso não quer que você perceba. Quer você submisso na senzala. Não o quer ciente e consciente, tendo a audácia de se posicionar contra progressistas, iluministas, socialistas, comunistas, Nova Ordem Mundial ou lá o que for que se reúna nas Casas Grandes da Praça dos Três poderes. Ou em Davos.

A oligarquia brasileira, embora não tolere apaziguamento e despeje discursos de ódio e xingamentos aos microfones, condena a polarização como se não devesse haver confronto ao que está em curso. Mas é disso que necessitamos! Só a polarização bem definida e só o antagonismo esclarecido, atuante e organizado podem restaurar a democracia no Brasil. A polarização sadia é a chance da democracia!

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

 

 

        

Percival Puggina

19/01/2024

 

Percival Puggina

         Em maio do ano passado, ao receber o ditador venezuelano Nicolás Maduro com honras de chefe de Estado e beijos no coração, Lula lhe proporcionou aconselhamento patriarcal sobre como resolver os problemas de imagem de seu governo.

A Venezuela é uma ditadura escancarada, daquelas que prendem adversários que podem se tornar incômodos, cujos verdugos espancam e matam a população que sai às ruas, que corrompeu suas forças armadas, seu judiciário e cuja elite política opera no mundo do narco-business. Alguns meses antes, ainda falando na condição de candidato, prometendo doces frutos do comunismo a seus eleitores e ferro e fogo a seus adversários, Lula disse que falava assim por estar mais Maduuro, espichando a segunda sílaba para marcar a metáfora. Ou seja, reconhecendo, ele mesmo, a deplorável imagem de seu camarada, irmãozinho de fé.

No entanto, quando se abraçaram em Brasília, Lula disse a ele:

“Se eu quiser vencer uma batalha, eu preciso construir uma narrativa para destruir meu potencial inimigo. Você sabe a narrativa que se construiu contra a Venezuela, de antidemocrática e de autoritarismo”. E, pouco depois: “Eu vou em lugares que as pessoas nem sabem onde fica a Venezuela, mas sabe que a Venezuela tem problema na democracia. É preciso que você construa a sua narrativa e eu acho que, por tudo que conversamos, a sua narrativa vai ser infinitamente melhor do que a que eles têm contado contra você”.

Transcrever falas de Lula é um desafio a quem foi alfabetizado antes dos anos Paulo Freire, mas era necessário fazê-lo para dar relevo ao modo como Lula vê a força política das narrativas, vale dizer, o modo como os fatos são levados ao conhecimento da população.

Precisamente aí está o “xis” do enorme problema em que se tornou a comunicação social no Brasil. Ao longo dos últimos anos, a cada manifestação minha, em artigo, vídeo ou entrevista, reclamando do lamentável papel desempenhado pelo jornalismo brasileiro, alguns leitores cuja desinformação e ingenuidade andavam de mãos dadas, saíam em defesa desses manipuladores. Agora penso que, finalmente, lhes caiu a ficha, pois silenciaram de vez.

Se hoje, a oligarquia dominante faz o que bem entende, se ministros do STF assumem postura política, linguagem política e influenciam a política a curto, médio e longo prazos, isso só pode acontecer porque se enquadra no que Lula poderia chamar de “narrativa vencedora”, que outra coisa não é senão uma mentira bem contada e suficientemente repetida. E ela só pode ser exitosamente repetida porque conta com as bênçãos da agência oficial em que se transformou o outrora vigoroso jornalismo brasileiro.

Para que este cumprisse seu iníquo papel, foi necessário expurgar das redações os grandes profissionais avessos às teses e práticas da pirataria desinformativa das redações. Hoje, fazem sucesso nas redes sociais e nos seus próprios canais e, por isso, se tornam, agora, alvos preferidos da oligarquia que não admite conviver com a divergência e com a liberdade plural das opiniõo. Apontá-los como fonte dos males faz parte da narrativa fraudulenta que hoje quer virar história no país. A eles minha reverência e gratidão.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

17/01/2024

 

Percival Puggina

         Você sabe por que o Brasil não consegue solucionar o problema da miséria? Porque, de um lado, deixamos de agir sobre os fatores que lhe dão causa, e, de outro, constrangemos e coibimos a geração de riqueza sem a qual não há como resolvê-la. As frequentes mobilizações contra o agronegócio são apenas isso – as mais novas expressões de um fenômeno tão antigo e renitente quanto descabido. O pior de tudo é que minha experiência de quase oitenta anos me adverte: são pequenas as possibilidades de emergirmos dessa histórica tragédia que afronta toda consciência bem formada.

Creem os profetas de tribuna, púlpito e palanque, escrutinando os fatos com as lentes do marxismo, que os pobres no Brasil têm pai e mãe conhecidos: a natural perversidade dos ricos e a ganância essencial dos empresários. Em outras palavras, a pobreza nacional seria causada justamente por aqueles que criam riqueza e postos de trabalho em atividades desenvolvidas sob as regras do mercado.

Estranho, muito estranho. Eu sempre pensei que as causas da pobreza fossem essencialmente culturais, políticas e jurídicas, determinadas por um modelo institucional cheio de equívocos, em especial na função Governo, que nos coloca no lugar 51 entre 167 países classificados pelo World Economic Forum.  Pelo jeito, enganava-me de novo quando incluía entre as causas da pobreza uma Educação que prepara semianalfabetos e nos coloca, entre 80 países do PISA, nos lugares 65, 62 e 52, respectivamente, em matemática, ciências e leitura. Sempre pensei que havia relação entre pobreza e atraso tecnológico e que nosso país não iria longe enquanto ocupasse o 54º lugar nesse ranking. Na minha santa ignorância, acreditava que a pobreza que vemos fosse causada, também, por décadas de desequilíbrio fiscal, gastos públicos descontrolados e tomados pela própria máquina, inflação e elevado crescimento demográfico, notadamente na segunda metade do século passado. Cheguei a atribuir responsabilidades pela existência de tantos miseráveis à concentração de 40% do PIB nas perdulárias mãos do setor público (veja só as tolices que me ocorrem!). E acrescento aqui, se não entre parêntesis, ao menos à boca pequena, que via grandes culpas, também, nessas prestidigitações que colocam nosso país em 94º lugar entre 180 países no ranking da percepção da corrupção elaborado pela Transparência Internacional.

Contemplando, com a minha incorrigível cegueira, os miseráveis aglomerados humanos deslizantes nas encostas dos morros, imputava tais tragédias à negligência política. Não via como obrigatório o abandono sanitário e habitacional dos ambientes urbanos mais pobres. Aliás, ocupamos a 87ª posição no ranking mundial do acesso a saneamento básico (UNICEF/OMS). Pelo viés oposto, quando vou a Brasília, vejo, nos palácios ali construídos com dinheiro do orçamento da União, luxos e esplendores de desfile de escola de samba. Entre eles o do TSE, com seus 115 mil metros quadrados de puro requinte.

Mas os profetas de megafone juram que estou errado. A culpa pela pobreza, garantem, tampouco é do patrimonialismo, do populismo, dos corporativismos, do culto ao estatismo, dos múltiplos desestímulos ao emprego formal. Isso para não falar no “capitalismo” dos “companheiros”. Não é sequer de um país que esbanja em futilidades e luxos para a elite dos poderes de Estado apesar de o ranking da desigualdade (PNUD 2022) colocar entre os 15 mais desiguais do mundo,

A nós, dizem que os culpados pela pobreza são os geradores de riqueza, os que produzem, que agregam valor com seu trabalho, investem e correm riscos em seus negócios. E nada disso se resolve com cartilha nem com simples partilha, como crê a CNBB.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.