Percival Puggina

09/03/2024

 

Percival Puggina

         Assisti parte das duas sessões do STF em que os ministros retomaram as deliberações sobre limites para a posse de maconha pelos consumidores. Não consigo me habituar à onipresença, onisciência e onipotência que caracterizam as atuações e manifestações de suas excelências. São predicados que ficam muito bem em Deus, mas soam alarmantes quando assumidos por seres humanos.

Os primeiros efeitos dessa inclinação são: a perda da noção dos próprios limites, a perda do senso de proporção (a “tabuada do 10” ajuda para isso) e a invasão de competência dos outros poderes (as tais quatro linhas que ninguém deveria ultrapassar).

No presente caso, o Supremo discute a diferença entre posse e tráfico na relação entre venda e consumo, a partir da quantidade de maconha em mãos de pessoa abordada em atividade policial. As apostas começam com 10g, passam por 25g e chegam a 60g e sinalizam que este último será o peso vencedor. Já que é para consumo pessoal, que não se restrinja a demanda.

Em diversos tipos penais existe relação entre fornecedor e consumidor, quer o objeto da venda seja arma sem origem, para-choque de fusca 1959 ou maconha. Em todos os casos, os dois lados do balcão cometem crime tipificados. No caso da maconha, o legislador já concede tratamento privilegiado ao consumidor, ao determinar que ele não seja preso, mas submetido a algum tipo de constrangimento que o tribunal vem chamando “administrativo”. 

A ralé conservadora e direitista, a quem o Estado não ouve, sabe que os estados paralelos do mundo do crime logo serão maiores do que o Estado e só existem com tal extensão e audácia porque existem os idiotas do consumo e seus protetores. A turma cuja opinião não interessa, paga as contas do Estado, os luxos das muitas cortes e sofre com as consequências do tráfico e do uso de drogas. Ela é inteiramente contra qualquer medida que possa ser entendida como “descriminalização” do consumo ou sinalize sua insignificância. Todos os dias, milhões de brasileiros são de algum modo infernizados por esse comércio infame, seus operadores e seus consumidores. Segundo a OMS, 12 milhões de brasileiros o são!

Não estou incluindo na lista dos incômodos que menciono as muitíssimas ocasiões em que, assistindo a algum filme Netflix ou Prime Vídeo, aparecem em cena simpáticos vovôs e vovós, papais e mamães, moderninhos e “progressistas”, compartilhando um baseado com filhos e netos, em meio a risos desconectados da realidade, tão frouxos quanto psicóticos. Tenho ganas de ir à polícia fazer um B.O.. Naturalizar o consumo de drogas é estimulá-lo.

Que o parlamento cumpra seu papel, reflita o pensamento majoritário da sociedade e seja sensível à ameaça que pesa sobre o país. Hoje, o Brasil caminha para se tornar um narcoestado.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

06/03/2024

 

Percival Puggina

         O “freio puxado” que marcou os discursos na Av. Paulista no dia 25 de fevereiro foi um dos fatos mais eloquentes daquele evento e sobre ele já muito se falou. Não é normal que, diante de tamanha multidão, personagens tão destacados da política brasileira, incluindo parlamentares com liberdade de expressão protegida pela Constituição, oradores brilhantes, discursem com freio de mão puxado. Há algo muito errado num país onde isso acontece! Deveria ser motivo de escândalo. E não foi.

Silas Malafaia, em suas primeiras palavras, antecedendo um discurso duríssimo, afirmou que não estava ali para criticar as instituições [de Estado] porque isso seria atacar a República. É proibido criticar as instituições? Merecem elas louvores? Não, claro que não! Criticá-las é próprio e útil a qualquer regime democrático. Não poder fazê-lo dá atestado de óbito à democracia.

Comecei a escrever para jornais em 1985 e, desde então, não mais parei de criticar nossas instituições. De início, eu o fazia advogando a adoção do parlamentarismo e como defensor do voto distrital puro. O passar dos anos, a Constituinte de 1988 e tudo que veio a seguir, consolidou aquelas convicções. Quatro décadas e centenas de artigos mais tarde, chegamos ao recente evento da Av. Paulista, ao discurso de Silas Malafaia e à reação irada da imprensa amestrada.

Então, caro leitor, pensemos juntos. O Brasil não vai bem. Nossos problemas se acumulam. A taxa de investimento se mantém muito inferior à que seria necessária.  O Brasil perde atração e posições no ranking de investimentos externos (já foi 4º, hoje e 14º). O crescimento econômico é lento e Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é de terceiro mundo. A renda média da população decresce e o endividamento sobe (72 milhões de brasileiros estão inadimplentes). Cem milhões não dispõem de coleta de esgoto. Trinta e cinco milhões não recebem água tratada. Um terço da população vive em condições de pobreza. Educação de qualidade é exceção, rarefeita e onde ocorre é malvista. Convivemos com cinturões de miséria, criminalidade consolidada em estados paralelos e insegurança pessoal. Insegurança jurídica. Infraestrutura precária.

A lista é imensa. Complete-a você mesmo e responda. A culpa disso é sua? Minha? Nossa? Da sociedade? Ou é do Estado que arrecada muito e gasta mal? Ou é do Estado onde uma elite instalada em instituições que existem para servir à sociedade se abastece de privilégios e regalias crescentes, julgando-se credora de luxos e mesuras dos tempos do absolutismo monárquico? Ou é de um Congresso cujos graves equívocos constitucionais, judiciais e legislativos se combinam para o converter num shopping com lojinhas de venda de votos parlamentares? Ou de governos e mais governos nos quais a virtude é punida e o vício recompensado e protegido? Ou é de um judiciário que perde o senso de justiça e de medida, invade competência dos outros poderes, usa a Constituição ao gosto, como livro de receita e se assume como tutor da sociedade? Ou é da corrupção estrutural? Ou é dos partidos, que do Estado se abastecem? Ou é de instituições de Estado que têm como lacaia a nação a que deveriam servir e impõem a ela o temor que lhe deveriam ter?

Não será delas que virá a solução porque elas são o problema. Estão concebidas para atuar como atuam e proporcionar os resultados que proporcionam. Há responsabilidades individuais? Sim, claro! E também brilhantes méritos individuais. Mas estamos vendo, periodicamente, que não basta trocar nomes porque a regra do jogo determina como o jogo político e institucional é jogado. Em decorrência dessa realidade estrutural, congênita, que afasta representantes de representados, governantes de governados e julgadores de julgados, os cidadãos veem afastar-se, célere, a liberdade e, com ela, a democracia e as possibilidades de uma reforma institucional.

Independentemente do que o politburo pense, imponha ou consinta, eu sigo fazendo minha parte.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

03/03/2024

 

Percival Puggina

         Não é preciso que me digam. Há uma esquerda que não sofre dos mesmos males que afetam o esquerdismo brasileiro produzindo sequelas institucionais, econômicas e sociais gravíssimas. Existe uma esquerda diferente, sim, mas no Brasil ela é como certas espécies raras da nossa fauna: difícil de achar. A que mais se tem por aí herdou os resquícios do comunismo clássico, ainda vigente no Leste Europeu à época da fundação do PT em 1980. Naqueles momentos iniciais, o partido incorporou a maior parte da intelectualidade comunista e da militância na luta armada beneficiadas pela anistia. Eram trotskista em muitos casos, stalinista noutros.

Foi por esse DNA que, dez anos tarde, quando os governos comunistas europeus foram obrigados a se apear ou foram jogados para fora do lombo das sociedades que tinham como montaria, o partido e seus congêneres na América Latina criaram o Foro de São Paulo em iniciativa de Lula e Fidel Castro. E o fizeram com as confessadas intenções que todos conhecem: recuperar aqui o que foi apeado de lá.

O passado deixa seus sulcos nas faces das pessoas, na vida das sociedades e em seu futuro. São eles que determinam muito de nosso presente. Por que o fazem, se noutras partes do mundo o comunismo, como tal, foi abandonado?  Até a China mantém uma rígida ditadura, mas deixou referências ideológicas de lado, virou capitalista e rapidamente tirou da miséria mais de meio bilhão de chineses. A Rússia, faz a mesma coisa. Os países que integravam a desventurada franja da antiga “Cortina de ferro” deixaram a ideologia de sua miséria e submissão no lixão do passado e prosperam com a liberdade e a operosidade de seus povos. Na Ásia sobraram Vietnã, Laos e a patética Coreia do Norte.

O pior comunismo do Ocidente sobrevive como inspiração e ensaios de poder no Brasil e em nossas cercanias ibero-americanas. Nossos afetos e afagos vão para Cuba, Nicarágua, Venezuela e para qualquer ditadura de esquerda que se destaque por antiamericanista e anticapitalista como faziam os grêmios estudantis dos anos 60 do século passado. Àquela época nos arrastam.  

É por isso que Lula, um comunista de gostos “modestos”, como se sabe, e desapegado dos bens materiais, proclama: “Muito dinheiro nas mãos de poucos, como era antes, é concentração de renda. Pouco dinheiro nas mãos de muitos é distribuição de riqueza”. Falácia! É preciso que haja mais dinheiro nas mãos de uns que de outros para que os investimentos produtivos sejam privados e não estatais. Pouco dinheiro nas mãos de muitos ou de todos, como delira o esquerdismo que acabei de mencionar, é receita de miséria e opressão perenes e crescentes. Sem exceção, todas as experiências o evidenciam desde 1917.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

 

 

Percival Puggina

28/02/2024

 

Percival Puggina      

          O jornalista Sérgio Tavares veio ao Brasil cobrir para seus canais nas redes sociais a manifestação do dia 25 deste mês na Avenida Paulista. Se o relato das observações que fez em nosso país buscasse inspiração na carta de seu antecessor Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manuel, ele provavelmente diria: “A terra continua boa e generosa, mas a gente que manda é nada bondosa”.

O Brasil está cada dia mais parecido com Cuba. Se os membros dos poderes de Estado assistissem um pouco menos a Globo, a CNN e afins, isso talvez não afetasse seus modos de agir, mas daria tempo aos seus ouvidos para a voz das ruas, onde dezenas de milhões de brasileiros têm a percepção de que a liberdade se extingue em nosso país. Não é a concordância, não são os puxa-sacos, nem os negocistas, nem os medrosos, nem os omissos que legitimam uma democracia, mas os que dissentem, divergem, discordam, refutam.

O conterrâneo e colega do escriba lusitano de 1500 foi submetido ao constrangimento de um escrutínio político. Isso não é aceitável; não é parâmetro de qualquer democracia.

Quando fui ao inferno caribenho pela segunda vez, em 2003, com o intuito de escrever “Cuba: a tragédia da utopia”, fiz contato com dissidentes e acabei sendo seguido, filmado, tive minhas ligações monitoradas de modo tão ostensivo que, buscando segurança, fui à embaixada do Brasil, já então sob comando de Tilden Santiago, ex-deputado federal do PT. Essa visita e a conversa que tive com o “companheiro” secretário da embaixada, estão minuciosamente relatados no livro. Minha preocupação maior era com as condições de saída do aeroporto preservando imagens e anotações que levava sobre minhas conversas com os dissidentes. O funcionário foi nada receptivo. “O senhor veio a Roma e não agiu como os romanos. Eles não gostam que pessoas entrem como turistas e saiam falando mal do país. Aqui tem muita coisa boa; as coisas não são como o senhor parece crer que sejam”, etc. etc.

Vejam que meu constrangimento em Cuba, ainda que tenha se prolongado por uma semana, foi muito menor do que o de Sérgio Tavares aqui. Mau sinal. Enquanto o totalitarismo cubano me controlou à distância, a suposta democracia brasileira submeteu o jornalista português a um interrogatório político. Nessa ideologia e em seu ruinoso trajeto pela história, democracia e liberdade são vocábulos de marketing, mas têm conceitos de confraria, de aplicação restrita, intimistas e excludentes.

 

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

26/02/2024

 

Percival Puggina

        Leio no Estadão (24/02/2024) que o volume de emendas parlamentares pagas pelo governo Lula em 2023 chegou a R$ 34,5 bilhões. A cifra representa 17,9% das chamadas despesas livres. Em 2014, as emendas pagas correspondiam a 0,1% (R$ 200 milhões). Comparado com isso, o valor aprovado para 2014 é 179 vezes maior – R$ 53 bilhões (“b” de bola e “i” de índio, como diz o senador Girão)!

O Orçamento da União está comprometido com gastos obrigatórios (aposentadorias, salários, etc.), restando uma margem de apenas 7% para as despesas discricionárias destinadas a investimentos em obras, por exemplo.

Essa farra tem efeito nocivo no comportamento político do parlamento e na saúde da democracia como um todo, pelo que é feito e pelo que não é feito. Disseminou-se como um mal sobre os legislativos nos três níveis em que se organiza a teórica federação brasileira, cada dia mais centralizada. Maus exemplos pegam de galho.

Esse tipo de crítica precisa ser feito, mas não acontece nos níveis em que mais amplamente se conduz a opinião pública. É de louvar, pois, a matéria do Estadão, que pode ser lida aqui. Ela traz comentários e informações evidenciando que a dispersão dos recursos nacionais em mãos de congressistas não se reflete em melhoria de bem estar aos munícipes das localidades mais carentes, em especial na área da Saúde. Silenciou, porém, sobre o tema político que abordarei a seguir.

Quando altas autoridades da oligarquia que comanda o país com mão de ferro dizem que as instituições funcionam, eu confirmo. Sim, funcionam como seus operadores desejam, mas não como a sociedade gostaria que as ver operando.

Tudo se agrava por impróprios e confessados motivos: as emendas parlamentares são as criptomoedas com que se adquirem votos no Congresso, corrompendo consciências e alterando a natureza dos laços que deveriam aproximar representantes e representados. Parlamentares vendem a representação por emendas e com elas ampliam apoios em suas bases eleitorais. As cabeças coroadas do Centrão reúnem-se com Lula e irrigam seus plenários com dinheiro dos nossos impostos.

O cidadão que não se embriagou nessa desgraceira e está preocupado com sua liberdade, com o direito de opinião, com o desrespeito à Constituição, com a expansão do autoritarismo, com os furiosos discursos contra os tais discursos de ódio, com as ameaças constantes e excessos crescentes que pairam sobre a oposição e sobre toda a divergência, pergunta: “E a democracia, tchê?”. Quem a conhece informa que está de ressaca. Mas isso haverá de passar.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

23/02/2024

 

Percival Puggina

         Que diriam Chico Anysio, Costinha, Dercy Gonçalves, Ronald Golias, José Vasconcellos, se chamados do Além para proferir algumas palavras neste velório silencioso do humor brasileiro? Por vezes, penso que alguém impôs sigilo até às exéquias do bom humor nacional.

No início, pareceu-me que as máscaras da Covid vinham para ficar. O riso e o sorriso sumiram sob a tirania dos elásticos e das sanções. No entanto, saíram os elásticos e as sanções permaneceram. Pobre e triste Brasil! Tão ferida está tua alma que o humor circula na criptografia dos e-mails e das mensagens pessoais que tanta curiosidade (e ira) suscitam. De fato, nas catacumbas onde alguma privacidade é preservada, os dias nos surpreendem com o qualificado humor de muitos.  A criatividade e a inteligência resistem à bisbilhoteira inteligentzia oficial.

O humorismo sumiu do rádio, da tevê, das revistas e dos teatros; está custodiado em uma ou outra página perdida por aí. Suprimiram-lhe os melhores personagens, os mais atuais e engraçados, ou seja, certos políticos e suas performances. Tomaram-lhe, principalmente, os penetras do palco, noviços da arte política e seus excessos. Se tiram do humor a vertente dos plenários e dos plenos, de onde viriam o riso e a graça? Das narrativas repetidas numa constância de provocar engulhos até em cantor de rap? Vamos deixar a realidade num cabide e fazer humor com os vestidos desta ou daquela dama?

O humor falece junto com a liberdade. Por isso, as verdadeiras democracias preservam o humor político como verdadeiro tônico da participação social; não prendem nem constrangem seus humoristas ao exílio.

***

A três palmos de meu nariz, estão os livros que mais frequentemente acesso. Entre eles, dois preciosos volumes de “Uma campanha alegre”, coletânea de artigos de Eça de Queiroz para o jornal “As farpas”, que ele e Ramalho Ortigão lançaram em 1871 para combater as instituições portuguesas de então. Creiam: é gênio em prosa!

Num texto de agosto desse mesmo ano, após criticar certa situação específica envolvendo a Câmara dos Deputados, ele interroga os parlamentares portugueses:

Por que não tiram, para maior comodidade de suas pessoas, a consequência lógica de seu procedimento? Se se desprenderam de todo respeito, por que não se desembaraçam de suas gravatas? Se se atribuíram o direito de dizer injúrias, por que não se dão o direito de trazer chinelas? Por que conservam uma certa compostura de toilette – se têm desabotoado tanto a dignidade?

E mais adiante, depois de uma página e meia de impiedosas ironias em cascata, parece falar para leitores de outro continente, 153 anos mais tarde:

Temos nós obrigação de respeitar a Câmara quando ela se não respeita? Ela vive nas assuadas indecorosas – e há de exigir que nos curvemos como se ela vivesse nas ideias elevadas?

Se alguém espera humor a favor, terá que se munir de paciência e boa poltrona. Não existe humor a favor, não existe humor pró! Para isso, o que existe é a ironia, mas cuidado, essa anda sobre o perigoso fio da navalha da hipocrisia. A causa mortis do riso e da graça é bem simples: o humor político se inspira em algo ou alguém que pode não gostar. Por isso, como toda forma de expressão do pensamento, precisa das garantias constitucionais. Para que tenha vida social, impõe-se que o humor seja contido, apenas, pelos limites de lei legislada em regime democrático, não da lei desejada por alguns espíritos arrogantes e de convicções itinerantes.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

20/02/2024

 

Percival Puggina

 

         Escrevo sobre a frase de Lula a respeito da guerra entre Israel e o Hamas:

“O que está acontecendo na Faixa de Gaza com o povo palestino não existiu em nenhum outro momento histórico. Aliás, existiu. Quando Hitler resolveu matar os judeus”

Pois é. Se Lula fosse judeu e estivesse sentado na cadeira de Netanyahu é óbvio que a estas alturas já teria tomado meia dúzia de chopes com Al-Synvar. O terrorista teria trazido seus reféns de volta para aconchego familiar em Israel e, meio sem jeito, diria a Lula “Foi mal!”. Lula, por sua vez, encerraria o ciclo de negociações bebuns com um “Desculpa qualquer coisa, companheiro” e voltado cambaleante para casa. Mas Lula não é judeu, não é primeiro ministro de Israel, Al-Synvar é terrorista casca grossa e não bebe.

Então, como cidadão brasileiro, se pudesse falar a Lula, lhe diria o mesmo que o rei Juan Carlos I, de Espanha, disse a Hugo Chávez em novembro de 2007: “Por que no te callas?”. Mania essa de ficar, sempre, no lado errado da História, arrastando suas vítimas à mesma perdição!

Para quem não lembra, escolher o lado errado é uma síndrome petista. Querem ver?

  1. O petismo foi contra a Constituição Federal (ele a queria mais socialista);
  2. Foi contra o Plano Real;
  3. Foi contra o pagamento da dívida externa;
  4. É contra as privatizações;
  5. É contra a Lei de Responsabilidade Fiscal
  6. É contra o teto de gastos;
  7. É contra o agronegócio;
  8. É contra o marco temporal e quer entregar tradicionais áreas de lavoura aos índios;
  9. Apoia as estripulias imobiliárias dos quilombolas;
  10. É contra o direito de propriedade;
  11. É contra o direito de herança;
  12. Quer implantar a novilíngua e impor a tirania do “politicamente correto”;
  13. Apoia, sustenta e agora alimenta as ditaduras de esquerda;
  14. Quer impor a censura das opiniões;
  15. Quer patrulhar as redes sociais;
  16. Criou o MST que promove invasões;
  17. Incentiva conflitos, quer sejam de classe, quer sejam identitários;
  18. Condena a atividade policial e protege a criminalidade;
  19. Quer desarmar as instituições policiais;
  20. Manifestamente entende que direitos humanos são privativos de bandidos e companheiros;
  21. Quer políticas de desarmamento dos cidadãos de bem;
  22. Jamais cogita em tomar as armas dos bandidos e enfrentar os estados paralelos das organizações criminosas;
  23. Opõe-se à redução da maioridade penal;
  24. Possui verdadeira fobia por presídios e órgãos de segurança;
  25. Vale-se da laicidade do Estado para sufocar os valores cristãos, relegando-os ao silêncio das consciências individuais, mas libera e estimula o ataque furioso e multiforme a esses mesmos valores;
  26. Transforma as salas de aula em laboratório de encolhimento de cérebros e formação de militantes;
  27. É contra a escola sem ideologia, homeschooling e escola cívico-militar;
  28. Defende o aborto e naturaliza sua prática;
  29. Oficializa o racismo com leis de quotas;
  30. Criou e instituiu o Foro de São Paulo;
  31. Aparelha a administração pública e os poderes de Estado com seus filiados e aliados;
  32. Onde exerce o poder, defende toda pluralidade, menos a de expressão divergente, mesmo quando amplamente majoritária;
  33. Financia obras para companheiros e governos maus pagadores;
  34. Empenhou-se em impingir à sociedade o PNDH-3 e, agora, quer aplicar a ideologia do partido à rede de ensino com o programa da Conae;
  35. Proporcionou os dois maiores e mais rumorosos escândalos de corrupção deste século, o mensalão e o petrolão.

Tendo sido testemunha viva e atenta desse período da história republicana, conheço pessoas que se encantam com o lado desastroso da história e querem viver nele. Não entendo os que, recusando o inteiro pacote resumido acima, deixam cair os braços, afirmam estar tudo dominado, e repetem, sem cessar, que falar não resolve. Ora, se não resolvesse, Lula e seus consectários não incluiriam entre os objetivos estratégicos comuns os itens 14 e 15 acima.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

Percival Puggina

18/02/2024

 

Percival Puggina

         Acordei, nesta manhã de domingo 18 de fevereiro, com a sensação de estar revivendo dias marcados pela inutilidade do tempo, como se o chão dos meses e anos passasse sob nossos pés, fosse adiante e nós ficássemos para trás. Lembrei-me, então, de um livro que publiquei em 2015 – “A tomada do Brasil pelos maus brasileiros”. Era inevitável a lembrança, afinal, estamos às voltas com os problemas de dez anos atrás agravados em proporções exponenciais.

Apanhei da biblioteca o livro financiado por crowfunding e pus-me a folheá-lo, apreciando a esplêndida edição que o amigo jornalista Mateus Colombo Mendes elaborou para a editora Concreta e que rapidamente se esgotou. A obra foi gratificada por prefácio do mestre Olavo de Carvalho que inicia assim, com generosidade e amizade:

“Decorridos quarenta anos de decadência do jornalismo (digo do jornalismo porque no caso da literatura seria mais apropriado falar em desaparição), ler os artigos do Percival Puggina é um dos poucos consolos que restam a quem estreou na profissão na época de Nelson Rodrigues, David Nasser, Carlos Lacerda, Rubem Braga, Antônio Maria e não sei mais quantos. Hoje em dia, quando se diz que um sujeito é jornalista, o que se entende é que ele não é de maneira alguma um escritor. Então, digo logo de cara, Percival Puggina não é um jornalista. É um escritor.”

Uma curiosidade desse livro é que reuni nele dois amigos pessoais que à época andavam às turras: o Olavo e o Constantino. Na apresentação que ocupa a primeira contracapa do livro, Rodrigo Constantino escreve:

“Para construir uma sociedade de verdade, livre e próspera, pilares morais são fundamentais. No caso, a moralidade presente na tradição judaico-cristã ocidental seria a resposta contra tanta subversão de valores que assola nosso país, tendo o PT como seu maior sintoma. É esta a principal mensagem deste livro de Percival Puggina, com olhar sempre arguto e coragem para remar contra a maré vermelha e colocar o dedo na ferida. A começar por não ter receio de se referir aos indecentes que tomaram conta do país como “os maus”.

Recentemente, o CEDET, em sua área de distribuição de livros tomou o encargo de reimprimir A tomada do Brasil pelos maus brasileiros, de modo que, hoje, basta procurar no Google para encontrá-lo em diversos fornecedores. Na condição de autor, faço aqui a divulgação dessa possibilidade que se abriu num momento em que, andando para trás, nos reencontramos com os maus.

Sim, porque os males são visíveis e a farsa se repete, como farsa, em versão piorada.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

16/02/2024

 

Percival Puggina 

A Educação pode ser a salvação ou a perdição de um povo. Uma Educação que crie condições para o desenvolvimento de aptidões, talentos, competências, virtudes, bem como a superação de dificuldades, promove o bem pessoal e social. Uma “educação” que negligencie estes aspectos e veja a si mesma como instrumento político para aliciamento e formação de militantes resulta em miséria e discriminação. Todas as suas experiências são miseráveis, sendo o êxito e a prosperidade pessoal privilégios dos controladores e de quem lhes escape ao controle. Tal “educação” se oporá, sempre, a movimentos como “Escola sem partido”, escolas cívico-militares e “home schooling”, como fez Lula ao falar durante a Conae. É lógico, esse projeto de poder não aceita abrir mão de uma única vítima! Consulte o Google sobre “escola e cidadania” e você entenderá melhor o que estou afirmando.

O caso cubano serve como exemplo. No início deste século, Cuba envelhecia e esclerosava, parada nos anos 50 do século passado. População empobrecida; três em cada quatro cubanos trabalhavam para o Estado; o salário mensal máximo equivalia a uns US$ 30. O Estado comunista se apropriava da totalidade do PIB gerado para proveito da elite política proporcionando uma infraestrutura miserável ao povo e oferecendo seu alardeado mérito: saúde e educação para a população.

Por três vezes fui lá. Escrevi dois livros e incontáveis artigos a respeito. O equipamento de saúde disponível para a população era indigente, mas, honestamente, não diria o mesmo da rede de ensino. O regime cuidava e cuida dela obedecendo a uma lógica interna. Ele sabe o quanto o ensino serve para formar os herdeiros dos “frutos de la revolución”. Tá bem. Todos os regimes comunistas têm consciência disso e comandam as salas de aula. É por elas que passam tanto os caminhos da liberdade quanto os da servidão futura. Aqui no Brasil, o governo fez sua escolha! A Conae fornece a evidência.

A estas alturas já vi e ouvi o suficiente dessa gestão para saber que veio completar o que ficou faltando às anteriores, tucanas e petistas. Especialmente, combate policialesco à liberdade de expressão nas redes sociais; mais dinheiro aos companheiros “artistas pela democracia”; muita verba publicitária ao jornalismo que engorda no pasto estatal e a joia das coroas totalitárias: controle centralizado, unificado, federal do que se ensina em sala de aula.

Os mecanismos de infiltração já produziram o inteiro suporte ao que está por vir. O futuro apareceu nítido no visual companheiro da Conae e compreensível no que ela propõe. Todas as pautas petistas estão bem servidas! É estarrecedor perceber quanto a máquina produtora do fracasso educacional festeja com risos e aplausos sua cristalização normativa.

Mexa-se, grite, reclame, vá para a rua, escreva, envie mensagens, cobre de seu congressista. Salvo surpresa, talvez não haja pauta mais importante nestes dias. Dependendo do que prevaleça, um futuro mais promissor pode mudar de 2026 para a geração subsequente, lá por 2056.

Percival Puggina (79) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org), colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.