Percival Puggina

02/11/2023

 

 

Percival Puggina

 

O episódio aconteceu numa aula do Colégio Anchieta, um dos mais bem conceituados de Porto Alegre. Certo professor de História colocou na pauta o conflito entre Israel e o Hamas, negando o emprego da palavra terrorista para designar a atividade desta organização. Gravado por uma das alunas, o vídeo (imagem estática), com áudio e legendas da conversa ocorrida pode ser assistido aqui.

Tudo que o professor fala é típico. Ele provoca o assunto definindo o Hamas como grupo político hegemônico representante da população palestina. Cria uma equivalência: os mísseis disparados por Israel equivaleriam às monstruosidades que caracterizaram o ataque do Hamas aos kibutzes vizinhos a Gaza, bem como à festa rave nas proximidades de Re’im. Note-se que os terroristas do Hamas fazem vítimas entre não combatentes, seviciando, matando e incendiando-as, olho no olho de suas vítimas; Israel faz vítimas civis como consequência de bombardeios avisados, aos locais usados pelo Hamas, cujos terroristas se escondem entre os civis. Por isso, são os principais causadores das mortes de que acusam os israelenses. Não obstante, o professor descreve as consequências dssa vilania como "Israel entrar numa área e matar crianças palestinas”. Desonestidade intelectual.

A estética da guerra é sempre tenebrosa, mas há um abismo ético entre as duas situações!

A dialética do professor, idêntica à da esquerda mundial, pinça o que lhe parece mais conveniente. Não menciona os cerca de três mil mísseis disparados pelo Hamas no início de sua operação cujo objetivo é destruir o vizinho. Imagine o estrago que essa chuvarada de mísseis produziria caindo sobre alvos aleatórios em zonas urbanas se Israel não contasse com a proteção antimíssil proporcionada pelo “domo de ferro”.

No momento em que começou a ser confrontado pelos alunos que lhe descrevem os horrores praticados pelo Hamas, o professor muda rapidamente de posição. Israel deixa de ser o causador guerra, mas diz que essa história não começou agora. Afirma que há dois lados e que ele, professor, não tem lado. “Tu tá tomando um lado, cara; eu não tô tomando lado nenhum”. E passa a acusar seus alunos de “terem lado”, informados por fontes “a serviço de Israel e dos Estados Unidos”.

Qual a lição inesperada que o caso proporciona?

Um professor militante, portador desse kit ideológico que infesta a cadeia produtiva da Educação em nosso país, tem problemas para sustentar sua opinião num debate com adolescentes bem formados e informados no ambiente familiar. Desconheço os protagonistas do fato. Contudo, sublinho no exemplo proporcionado pelas “meninas” e pelos “caras” (para dizer como o professor), a lição de que não se deve aceitar passivamente tudo que é narrado ou analisado pelos donos do toco de giz. Senhores pais, cuidem de seus filhos!

A atitude exemplar dos estudantes, contrapondo-se e não comprando opinião por conteúdo didático, gravando conversas desse tipo de aula, inibiria significativamente uma das principais armas de outra guerra – a guerra que a esquerda promove contra a Civilização Ocidental dentro das nossas salas de aula.

É triste, mas verdadeiro. Profissão tão nobre paga, com a própria imagem, as consequências do uso abusivo que tantos fazem de seus kits ideológicos para seduzir corações e mentes infantis e juvenis. 

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

01/11/2023

 

 

Percival Puggina

 

Sou do tipo que abre a porta do carro para a mulher e cede cadeira a senhoras em sala de espera. Mulher não junta nada do chão perto de mim. Então, não se espere qualquer grosseria minha em relação a alguém do sexo feminino. Fui educado assim e assim eduquei meus filhos.

O que direi sobre a atuação de dona Rosângela Lula da Silva e de seu visível desejo de protagonismo é reflexão sobre um fato político, sem a mais tênue misoginia. Acho mulher o ser mais maravilhoso da criação e sem o qual a vida seria aborrecida como deve ter sido a vida de Adão até ceder uma costela ao Senhor para aquela que foi a mais proveitosa cirurgia da história.  Está no Livro.

Não obstante isso, dona Rosângela se assume como alter ego do mandatário e já é vista assim por muitos que reconhecem nela uma personagem ativa nas questões do governo. Aqui no Rio Grande do Sul, chamou atenção, por exemplo, o fato de ter sido ela e não o vice-presidente quem esteve à testa da visitação feita por setores da administração federal ao rastro de destruição e mortes deixado pela enchente do Rio Taquari.

Há setores da opinião pública que vive, nestas questões de gênero, uma espécie de puberdade. Tudo é sexo e sexualidade é tudo. Estão sempre querendo saber quantos homens e quantas mulheres tem aqui ou ali, nesta e naquela atividade, cobrando quotas que já começam a se estender para cada uma das letrinhas e símbolos da sigla lgbtqia+, como se cada uma delas abarcasse espécimes distintos da humanidade. Um porre!

Muitas vezes, a logicidade de certas situações se esclarece por inversão. Imagine o leitor que a presidência da República seja ocupada por uma mulher casada – uma “presidenta”, para dizer como os petistas se referem a Dilma Rousseff. E que seu marido se tornasse um protagonista da política, com ingerência e influência sensíveis nas questões de governo. Qual seria a reação da militância feminista? Eis aí algo que eu gostaria de saber porque tenho a impressão de que o sujeito logo seria visto como um ogro machista intrometido.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

Percival Puggina

30/10/2023

 

Percival Puggina

         O confronto entre o terrorismo do Hamas e o poderoso sistema de defesa militar de Israel acabou me trazendo uma informação nova e terrível sobre o que está acontecendo com a comunicação social.

Meus leitores habituais sabem a importância que atribuo à preservação de nossas raízes culturais e à seiva que trazem ao tempo presente. Tenho consciência de que os princípios e valores que preservamos nos protegem de muitos males. Sei quanto bem nos produz o conhecimento herdado sobre o bem, o belo, o justo e o verdadeiro.

Há uma guerra cultural em curso e seu alvo é o Ocidente. É evidente que sua destruição ou submissão a qualquer outra Cultura ou à avidez de alguma forma de totalitarismo precisa derrubar seus pilares. Os filósofos do revolucionarismo os conhecem e atacam: a tradição religiosa judaico-cristã, o bom Direito que herdamos de Roma e a sã Filosofia legada pela Grécia.

Esse enfrentamento se dá no tempo presente e segue a cadência dos acontecimentos, conforme os conhecemos no noticioso noturno, nas manchetes matinais, nas “narrativas” que mudam a cor do céu e da grama. O escrutínio das manchetes é das tarefas que mais surpresas revelam a quem estiver apto a identificar suas maliciosas construções.

A mentira é arma de todas as guerras e não seria diferente na guerra cultural, supostamente mais humanitária, na qual parece não correr um único fio de sangue. Surge, então, o fenômeno moderno da fake news, tarefa assumida por desmiolados de parte a parte. “Se eles fazem, vamos fazer nós também”. Que estrago, senhores! Cada dia nos chega com sua carga de dejetos produzidos por camarões humanos que têm os intestinos no lugar do cérebro.

Sempre é bom lembrar que há atividade mais danosa que a dos propagadores de fake news. Refiro-me aos autores de fake analysis quando, não respeitando sua titulação, torturam os fatos e a ciência ante as câmeras das conveniências políticas.

Uma nuvem negra avulta, agora, no horizonte do Ocidente acossado pela guerra cultural. Ela surge como consequência do trabalho abestado dos propagadores de fake news. O fato nu e cru desaparece de toda conversa levando consigo nossa capacidade de conhecer o que não transcorreu sob nossos olhos! Basta que alguém invoque o estigma verbal gritando “Fake news!” para que o fato, suas causas e consequências percam sentido e se dissipem no ar.

Assim, num verdadeiro crime de laboratório intelectual, a verdade – não a mentira – está a morrer diante de nossos olhos enquanto as pessoas só acreditam no que serve para suas cabeças como os sapatos que usam servem para seus pés. Não há mais realidade nem compreensão da realidade.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

29/10/2023

 

 

Percival Puggina      

        Na Universidade Federal do Amazonas, marmanjos e marmanjas tentaram expulsar a gritos e empurrões um palestrante judeu que precisou ser escoltado por PMs.

Em Brasília, a Caixa Cultural (da Caixa Econômica Federal) custeou e patrocinou a exibição de “O grito”, mostra de imagens onde a bandeira do Brasil é usada para agressivas e grosseiras mensagens politicamente afinadas com o atual governo da União.

O Ministério da Igualdade Racial gastou metade da verba de uso livre, que é de R$12,5 milhões, em viagens e diárias de assessores e dirigentes com destinos dentro e fora do país.

O governo, seu partido e seus militantes se recusam a qualificar o Hamas como organização terrorista. Responsabilizam Israel pelo indescritível ataque sofrido no momento em que negociava sua convivência pacífica com o Egito.

Em Goiás, professora de uma escola particular postou em rede social foto sua usando camiseta com a frase do artista Flávio Oititica – “Seja marginal, seja herói”.

Em todo o país, para o jornalismo militante (e qual não é, nos mais destacados veículos?), entrechoques entre policiais e bandidos só dão causa a críticas dirigidas aos primeiros e a análises sociológicas sobre a dura vida dos segundos. É raro, raríssimo, encontrar, aqui ou ali, um reconhecimento do valor, dos riscos cotidianos e das agruras inerentes à atividade policial. 

As Salomés da política, instaladas na pagadoria da publicidade oficial pedem aos Herodes de cada meio de comunicação as cabeças dos Joões Batistas conservadores ou liberais. Os Herodes entregam e o jornalismo brasileiro expurgou para as mídias sociais seus melhores profissionais.

O que une esses fatos, todos tão recentes, seja entre si, seja a muitos outros semelhantes no passado (e, com certeza, também no futuro)? Qual é o problema desse pessoal?!

Todos esses eventos envolvem o ativismo esquerdista e expressam características fascistas. Seus adversários políticos são o destino final de todas as maldições, vivem ao desamparo de direitos fundamentais e são as únicas pessoas no mundo a quem tratam como criminosos e para quem pedem cadeia... Sobre os verdadeiros bandidos, dizem que “no Brasil se prende demais” e que “prender não resolve”. Por isso, defendem o desencarceramento.

São filhotes de Mussolini. Querem a censura e a interdição dos “lugares de fala” de toda divergência. Festejam quando seus adversários são julgados à distância, por crimes que não cometeram e condenados a penas desproporcionais. Aplaudem a omissão do presidente do Senado e as manobras do presidente da Câmara. A discordância política sobre o agir das instituições é classificada como “discurso de ódio”.

Os atores desses eventos promovem usos abusivos de eventuais situações de poder. Alguns, como os marmanjos e marmanjas das universidades públicas, por serem majoritários, oprimem a minoria se ela se atreve a divergir. Outros, servem à causa ou querem atiçar a revolução social.

Já passou da hora de propor que a fobia à direita política – causa de discriminações, opressões e origem de violência – seja considerada, também, “crime análogo ao racismo”. Ah, Brasil!

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

26/10/2023

 

Percival Puggina

        Faça o teste: pense em um bem não material pelo qual você tenha apreço e verifique se ele não é combatido por esquerdistas e comunistas, ou seja, por gente de mentalidade revolucionária que se diz “progressista”. Depois, pense em algo útil à ascensão social dos mais necessitados e me diga: as mesmas facções políticas que combatem seus valores e seus bens culturais e espirituais, não atacam tudo que proporciona prosperidade material e desenvolvimento social – liberdade, empreendedorismo, combate às drogas e à criminalidade, abertura de horizontes?

Você sempre os verá em salas de aula à moda Paulo Freire, olhos postos no coletivo, na instrução de militantes da classe ou da causa, sejam elas quais forem. Por isso, o Programa Nacional de Educação está convocando para 28 a 30 de janeiro, em Brasília, a conferência “Plano Nacional de Educação 2024-2034: Política de Estado para garantia da Educação como direito humano com justiça social e desenvolvimento socioambiental sustentável”.

Fala sério! “Política de Estado”? “Justiça social”? “Desenvolvimento socioambiental”? E as nossas crianças e jovens? E sua formação? E o desenvolvimento proveitoso das potencialidades individuais para o bem deles mesmos, de suas comunidades e do país? Perceberam o quanto isso é atirar o futuro aos cães, para colocar todo o aparelho educacional a serviço do palavrório ideológico e dos interesses de um partido político e seus anexos? Quanto isso é igual ao que acontece em Cuba!

Platão dizia que a mentira é mãe de todos os vícios, mas deveria abrir espaço para apontar a omissão dos cidadãos como vício da tolerância perante os males proporcionados pelo Estado.

Pensando sobre o tamanho de nossa omissão, dei-me conta, outro dia, de ser ela uma das causas para que tantos congressistas, uma vez eleitos, saltem olimpicamente sobre os compromissos assumidos perante os eleitores e se bandeiem para a porta do Tesouro Nacional. Representantes de eleitores omissos, omissos serão, ora essa!

O Brasil tem 150 milhões de eleitores. Mesmo em nossas mais impressionantes manifestações levadas a cabo entre 2019 e 2022, quando cerca de seis milhões de cidadãos saíram às ruas e praças do país, 144 milhões assumiram que aquilo não lhes dizia respeito. Para cada patriota de verde e amarelo, outros 96 ficaram em casa assistindo futebol. No pleito de 30 de outubro do ano passado, 32 milhões de eleitores se abstiveram, 3,9 milhões anularam o voto e 1,7 milhão votou em branco.

A inércia que observamos no Congresso não é diferente da que vejo na sociedade. Por isso, a tarefa mais urgente das organizações liberais e conservadoras em formação no país deve ser a conscientização sobre as sinistras evidências dos males em curso. E a definição, em cada comunidade, das formas legítimas de ação social, política e cultural.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

25/10/2023

 

 

Percival Puggina

 

         Tenho visto pessoas generosas, dotadas de virtuosa rejeição à violência e à guerra, clamar por paz ante o atual conflito entre Israel e o Hamas, ou entre Israel e as organizações terroristas de seu entorno, sem dizer de onde viria essa paz.

Ora, senhores! Hamas, Jihad Islâmica, Al-Fatah, Estado Islâmico, Hezbollah, etc., estão para a paz no mundo assim como o câncer está para a saúde. A pessoa com câncer pode acusar a doença de seus males, mas só terá saúde quanto for curada a fonte desse padecimento. Portanto, não há como clamar por pacificação no Oriente Médio enquanto o terrorismo, lado agressor do conflito, não for eliminado como forma de ação política. É impressionante como as principais obviedades desse conflito parecem escapar à compreensão de muitas pessoas movidas pelas melhores intenções!

De todas as nações da terra, certamente Israel é a que mais precisa de paz. Precisa de paz para existir. O pequeno Israel sabe que sua existência causa desconforto religioso naquela região do mundo onde é um enclave e que jamais submeterá o imenso mundo islâmico em seu entorno. Pode até vencê-lo numa guerra, como já aconteceu, mas jamais submeterá vizinhos como Iraque, Síria, Jordânia, Egito, Líbia, Arábia Saudita, etc.

Sua segurança, portanto, depende de uma política de pacificação e boa vizinhança, como a que vinha sendo costurada com o Egito, claro. Mas depende de que reaja com vigor às agressões sofridas. Não se trata de mera retaliação, ou seja, na forma da Lei de Talião. Essa é a lei do empate; olho por olho, dente por dente. Seria, então, estupro por estupro, monstruosidade por monstruosidade?

Ou seja, para sobreviver, Israel precisa, quando agredido, reagir com todas as cautelas relativas às populações civis e em conformidade com as Leis da Guerra (jus in bello). Contudo, a proporcionalidade entre ataque e resposta ao ataque seria um estímulo à continuidade das ações do Hamas. Exposto a reiteradas agressões, Israel precisa conter definitivamente o terrorismo. 

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

23/10/2023

 

Percival Puggina

 

         Décadas de vida e centenas de debates políticos me proporcionaram boa experiência em lidar com interlocutores esquerdistas. Ao escrever sobre eles devo dividi-los em dois grupos: o das raras e brilhantes exceções e o dos seguidores da regra geral que consiste em tentar vencer sem ter razão.  Confrontar opiniões com o primeiro grupo era instigante e proveitoso; com os demais, um exercício de comiseração para com a miséria moral alheia, que tem tudo a ver com o que chamam “luta política”. Ela justifica tudo, menos a si mesma porque são termos antagônicos: ou é política ou é luta.

Mesmo assim, procure no Google a expressão “luta política”. Vai encontrar mais de meio milhão de referências em português, um milhão e meio em inglês (political fight) e quase dois milhões em espanhol (lucha política). Achou muito? Dê uma olhada nos textos em que as expressões aparecem e verá que em sua totalidade são de viés esquerdista. A conexão de “política” com “luta” está no DNA da esquerda; as duas palavras são o espermatozoide e o óvulo da revolução.

Conservadores e liberais não usam essa expressão. Ao menos, nunca me deparei com ela sendo utilizada fora da cartilha esquerdista. Sempre a vi como incitação à luta ou como rota de fuga para a desonestidade intelectual justificando meios viciosos com a suposta virtude dos fins.

Perdi a conta das vezes em que ao apontar e advertir o interlocutor por suas contradições, falácias, mistificações, ou agressividade verbal, ouvi como explicação: “É a luta política, Puggina”. Isso é dito como salvo-conduto para impropriedades ou como proveitoso passaporte retórico que credencia o portador a se conduzir como um James Bond, um 007 em relação à verdade ou à reputação alheia, a serviço de sua majestade – a revolução proletária.

Esse aparentemente simples dado da realidade explica muitos dos acontecimentos brasileiros dos últimos anos. Políticos, cidadãos ocupantes de posições de representação e relevo social, titulares de nobres funções de Estado, fizeram coisas que lhes seriam inconcebíveis, contradisseram as próprias palavras ditas e escritas, afrontaram as respectivas biografias, puxaram intocáveis cordéis por exigência da “luta política”. Ou da política transformada em caricatura de si mesma, com danos à democracia, ao estado de direito e à liberdade dos cidadãos.

Enquanto esse modo “vale tudo” de fazer política não for percebido e rejeitado pela sociedade, ou seja, por quem está nas galerias e vota, o palco da disputa pelo poder continuará sendo o preferido das tragédias sociais.  Como afirmei no parágrafo inicial desta crônica, ao falar sobre as “raras e brilhantes exceções”, já conheci gente melhor.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

Percival Puggina

22/10/2023

 

Percival Puggina

        

         Escreveu alguém, não lembro quem, que a anistia funciona sobre o ambiente político como rescaldo em área incendiada, quando se borrifa água para extinguir focos de fogo ou brasa persistentes junto às cinzas.

Imposição de um já longo momento histórico

O momento político brasileiro se inclui entre os mais complexos de que tenho lembrança. Há quase cinco anos o país convive com a censura, com os assuntos proibidos e as opiniões restritas, com a ditadura do consórcio de mídia e a manipulação da informação, com o cerceamento das redes sociais e com a teimosa recusa às urnas com impressora. Assistimos o tratamento díspar proporcionado às forças políticas em confronto e vimos a carranca ameaçadora dos inquéritos do fim do mundo num mundo sem horizonte. Há setores da sociedade que a tudo chancelam e aplaudem delirantemente. Por vezes, o aplauso tributado a uns foi, também, o apupo dirigido a outros e um contundente depoimento coletivo...

Assisti a isso durante quatro anos e continuo assistindo. Para descrever as causas da completa erosão do ambiente político nacional, devo ainda devo acrescentar dois itens: a surdez institucional à voz das ruas, significando omissão e desprezo à opinião pública e o alinhamento político da sólida maioria dos ministros do STF/TSE. Tal conduta tem sido proclamada com sinceridade cristalina em sucessivas e repetidas manifestações. “Perdeu mané!”, “Missão dada, missão cumprida”, “Tem muito mais gente para prender e multa para aplicar”, “Derrotamos o Bolsonarismo”, “Lula não estaria no Planalto se o STF não tivesse enfrentado a Lava Jato”.

Prisões políticas do passado

         Em passado nada recente, tivemos presos políticos. Muitos eram terroristas de fato, pertenciam a organizações políticas cujo viés revolucionário e comunista estava expresso nas siglas usadas, onde o C era “comunista”, o R era “revolucionário”, o T era “trotskista”, o B era “bolchevique”, etc. Pegaram em armas e cometeram muitos crimes de sangue. Foram anistiados em 1979.

Aliás, a história da República registra quase meia centena de anistias concedidas. No geral, decorreram de negociações políticas, lidaram com processos em curso e condenações penais envolvendo indivíduos ou grupos. No final dos anos 70 do século passado, forte mobilização ganhou as ruas pressionando o governo por uma anistia “ampla, geral e irrestrita”. Graças a ela, militantes da esquerda voltaram ao Brasil, outros saíram das prisões, outros ainda deixaram a clandestinidade e se incorporaram à dinâmica normal da vida política.     

Ao assinar a lei de anistia, em 28 de agosto de 1979, Figueiredo reconheceu “que ela não desfazia divergências”, ao contrário, estas “se refaziam pela liberdade”. Era preciso, porém, continuou, “desarmar os espíritos pela indispensabilidade da convivência democrática”.

Temos mais presos políticos do que Cuba

Passado meio século, o Brasil volta a ter presos políticos. E os tem em número superior aos de Cuba.

Mais de 1,5 mil cidadãos suportaram a pecha de terroristas a eles aplicada por ministros do STF que tinham o dever de saber a diferença conceitual e penal entre 1) estar na praça, 2) invadir um prédio 3) promover um quebra-quebra; 4) praticar golpe de estado e 5) executar um ato de terrorismo.

Permaneceram presos durante meses, submetidos às mesmas “excepcionalidades” circunstanciais que impulsionaram extravagantes decisões judiciais durante a campanha eleitoral de 2022. Os que voltam para casa, portam tornozeleiras e deixaram no presídio direitos de sua cidadania.

Os julgamentos a que assisti me revoltaram o estômago. Apenas o “animus condenandi” foi presença mais presente do que a ausência dos réus. Ah, senhores, as penas! Penas desproporcionais destroem o senso moral da sociedade! Lembro do mesmo tribunal julgando os réus do mensalão. O processo evidenciara o uso da publicidade oficial para financiar, durante o governo Lula I, a compra de votos no Congresso Nacional. O sistema funcionava mediante três núcleos articulados e usados como tais no julgamento: o publicitário, o financeiro e o político. Dentro deles se posicionavam os réus. Tudo caracterizava o crime de formação de quadrilha, só que não. Embora também por esse crime os réus tivessem sido condenados, um recurso de undécima hora, valendo-se do que Joaquim Barbosa chamou maioria de ocasião, excluiu as condenações por formação de quadrilha. Como consequência, os réus do núcleo político escaparam de cumprir parte das penas em regime fechado. Quem tem padrinho não morre pagão e quem não tem comete crime até por estar sentado na praça, numa cadeira de praia, comendo algodão doce.

Os atuais projetos de lei propondo anistia

Sei de três projetos, dois na Câmara dos Deputados (de autoria do Major Vitor Hugo e José Medeiros) e outro no Senado Federal (de autoria do senador Mourão). Têm características diferentes, mas não é impossível chegarem os autores a um acordo.

O que torna indispensável a anistia é o somatório de “excepcionalidades”, o abandono do senso de proporção na fixação das penas e o total desconhecimento das atenuantes. Como desconhecer a cultura política impressa no inconsciente popular em um século e meio de história da República, que sempre viu nas Forças Armadas a função de última instância que nossas constituições jamais providenciaram?  Isso para não falar das atenuantes proporcionadas pela própria atuação dos ministros ao longo dos últimos anos. Eu não aprovaria anistiar os depredadores infiltrados ou não, presentes ou ausentes. Para os demais, contudo, a anistia é exigência do senso de justiça. Ou da aversão à injustiça. 

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.

 

 

Percival Puggina

19/10/2023

 

Percival Puggina        

         Quanto mais amplo for nosso vocabulário, mais longe irão nossa imaginação, nossa compreensão e nossa expressão. E vice-versa, palavras poucas, ideias poucas. Palavras são matéria-prima da Política, do Direito, da Justiça, da Filosofia, da Fé e de tantas ciências. E da Literatura, e da Poesia, e do Amor.

Dois exemplos recentes me fazem escrever sobre  a importância da luta pelas palavras. Fato 1: O leitor certamente observou o empenho com que o presidente Lula e a esquerda – brasileira e mundial – trataram de driblar por todos os modos a inclusão do vocábulo “terrorismo” e seus derivados nas referências ao grupo terrorista Hamas,  conhecido parceiro de tantos. Ficou visível a luta pela palavra. Fato 2: Em evento de que participei, um orador incluiu entre seus bons objetivos o de contribuir para  a construção de uma “sociedade igualitária”. Ora, sociedade igualitária é o paraíso prometido pelos adversários políticos do orador, mas ele e tantos outros o referem sem se darem conta. Comunistas prometem sociedades igualitárias embora proporcionem inevitávelmente sua consequência natural: miséria generalizada. As desigualdades entre os indivíduos só não afloram sob pressão e opressão de regimes totalitários. No entanto, a palavra adoça a pílula com o veneno que contém e submete até quem o conhece.

A esquerda possui total domínio desse instrumento de dominação cultural. Em 2005, Nilmário Miranda, Secretário de Direitos Humanos do governo Lula I, divulgou a minuta de uma “Cartilha do Politicamente Correto”, com um glossário de 96 palavras reprováveis, avaliadas como politicamente incorretas, por criarem constrangimentos.

O documento causou generalizadas manifestações que iam da ironia à indignação. À exceção da Folha de São Paulo, nenhum jornal o apoiou. O PT disse que o assunto tinha que ser melhor avaliado. Lula I, indignado, mandou recolher a cartilha. O sempre brilhante João Ubaldo Ribeiro disparou um libelo cuja íntegra pode ser lida aqui. Nele, entre outras coisas, diz:

“É estarrecedor. Estamos ingressando numa era totalitária, em que o governo dá o primeiro passo para instituir uma nova língua e baixar normas sobre as palavras que devemos usar? Será proibido em breve o uso de palavrões na língua falada no Brasil? Serão eliminadas dos dicionários vocábulos e expressões não consideradas apropriadas pelo Governo? Palavras veneráveis da língua, como “beata”, em qualquer sentido, deverão ser banidas? Será criada uma polícia da linguagem? Os brasileiros serão proibidos por lei de discutir vigorosamente e xingar os interlocutores?”.

Dezoito anos depois, temos que lutar pela vida das palavras, de seus significados e liberdade como lutamos por outras formas de vida. O politicamente correto foi mais uma poderosa arma de guerra cultural, importada e traduzida para o português e, sim, João Ubaldo Ribeiro tinha razão, ingressamos numa era totalitária. Ela é tão sutil que muitos não percebem sua liberdade esvair-se enquanto o exército malandro da guerra cultural vai avançando e apertando os grilhões.

Nós, porém, nos empenhamos em preservar a vida que resta. Por isso, tantas vezes nos percebo como corpo clínico de hospital de campanha numa guerra pela liberdade e pela cultura ocidental.

Percival Puggina (78) é arquiteto, empresário, escritor, titular do site Liberais e Conservadores (www.puggina.org, colunista de dezenas de jornais e sites no país.. Autor de Crônicas contra o totalitarismo; Cuba, a tragédia da utopia; Pombas e Gaviões; A Tomada do Brasil. Integrante do grupo Pensar+. Membro da Academia Rio-Grandense de Letras.