• Roberto Rachewsky
  • 30 Abril 2016

 

A genial maneira escolhida para ironizar a hipocrisia da esquerda, evidenciando a promíscua relação entre os amantes do socialismo e os produtos do capitalismo, serve de estímulo a uma análise um pouco mais profunda desta questão.

Devemos nos perguntar, por que Steve Jobs criou e colocou à venda um produto tão magnífico como o iPhone? Por que as pessoas, inclusive você, Socialista de iPhone, adquiriram o seu, pagando o que tiveram que pagar?
Por uma razão muito simples, todos, seja o Steve Jobs, ou qualquer outra pessoa neste mundo, acreditam que é do seu auto-interesse fazê-lo, pois ao final, acabariam lucrando.

Steve Jobs acabou bilionário, porque em nome de seu auto-interesse, atendeu a milhões de consumidores. Assim como, um socialista qualquer, pelo mesmo motivo, incorporou ao seu dia-a-dia, algo com valor muitas vezes maior do que pagou por ele.

Esta é a lógica central, que embasa as relações entre indivíduos, que usam o seu auto-interesse racional, para obter as condições necessárias, para uma vida melhor, mais produtiva, mais econômica e mais feliz.

É o legítimo processo de livre-mercado, onde as trocas voluntárias e espontâneas produzem resultados maiores do que a soma das partes, podendo assim, ser chamado de jogo do ganha/ganha, onde, ganha quem compra e ganha quem vende. Indo além desta análise, que colocou em igualdade de condições, um genuíno capitalista, Steve Jobs, e qualquer Socialista de iPhone, cabe-nos fazer a seguinte reflexão: como alguém pode produzir um iPhone e como alguém pode adquiri-lo?

Obviamente, através da necessária geração anterior de valor. Ou seja, para que Steve Jobs pudesse vender um iPhone, ele precisaria concebê-lo, produzi-lo, divulgá-lo até oferecê-lo ao mercado consumidor. Para que isso se tornasse realidade, além da sua própria mente, da sua genialidade, ele precisaria de gente que financiasse seu empreendimento, no caso, acionistas ou banqueiros que usariam os seus recursos disponíveis para que Steve Jobs pudesse tornar seu sonho uma realidade.

Por outro lado, como alguém poderia adquirir o produto resultante desta iniciativa empreendedora de Steve Jobs? Obviamente também, gerando valor para outras pessoas que retribuiriam pagando pelo que obtivessem. Ou seja, o jogo do ganha/ganha estaria sendo jogado entre todos aqueles que estivessem exercendo o legítimo direito de buscar a satisfação do seu auto-interesse.

Trocas voluntárias, transações livres e espontâneas para a satisfação mútua de autointeresses convergentes, através da produção de bens e geração de valor, são a alma do capitalismo. Por isso que não se diz Capitalista de iPhone. Não faria sentido. Os conceitos capitalista e produto do capitalismo são indissociáveis, não-contraditórios.

Por que torna-se sarcástica a expressão Socialista de iPhone? Por que ela é contraditória. Nenhum socialista quer viver no socialismo. Todos querem alcançar poder suficiente, para viver como um capitalista. Porém, com o dinheiro dos outros.

É por isso que socialistas defendem o uso da violência, como meio para obterem os valores que necessitam para se satisfazer. E é a violência que destrói a alma do capitalismo, o sistema de relações interpessoais, baseado em trocas espontâneas e voluntárias, livres da coerção. É o capitalismo que possibilitou que Steve Jobs criasse o iPhone.
Capitalistas vêem as relações no mercado como um jogo de ganha/ganha, socialistas acreditam se tratar de um jogo de soma zero, onde para um ganhar, o outro tem que perder.

É por isso que socialistas de iPhone são uma contradição ambulante, sujeitos a mais sagaz das críticas, o humor irônico ou sarcástico.

Para fazer uma analogia, um socialista com iPhone é como um ateu carregando um crucifixo no peito.

É claro que há uma diferença fundamental metafísica, o iPhone pode propiciar ao socialista, uma vida melhor.
Encerro com um desafio: ou vocês deixam de ser socialistas, ou devolvam seu iPhone na loja mais próxima.

– Publicado originalmente no Socialista de Iphone.

 

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  • Colégio Americano de Pediatras
  • 29 Abril 2016

 

Introdução do Dr. Heitor de Paola, que faz os comentários em itálico na declaração que segue: O texto abaixo, um position statement do Colégio Americano de Pediatras, é uma das primeiras manifestações de uma entidade científica respeitada que rompe o bloqueio da ideologia de gênero e sua “narrativa sagrada” que não admite discussões, menos ainda dissenções explícitas. Este não é um texto político ou ideológico, apenas técnico, baseado em conceitos estabelecidos pela prática médica.

A ideologia de gênero é uma falácia do argumento feminista, segundo o qual o gênero seria uma mera construção cultural. Quando a maioria das sociedades científicas e psicológicas se rende à nefasta ideologia de gênero, são os pediatras que vêm mostrar a crua realidade da infância, da puberdade e da adolescência e as mentiras dos defensores da transgeneralidade.

Creio de bom alvitre publicá-lo com meus esclarecimentos para o público leigo e comentários pertinentes. A tradução do original é de William Uchoa e os esclarecimentos e comentários estão entremeados no texto (em itálico). O Colégio Americano de Pediatras insta educadores e legisladores a rejeitarem todas as políticas que condicionam as crianças a aceitarem como normal uma vida de personificação química e cirúrgica do sexo oposto. Fatos - não ideologia - determinam a realidade.
Dr. Heitor de Paola


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1. A sexualidade humana é uma característica biológica binária objetiva: "XY" e "XX" são marcadores genéticos de saúde – não marcadores genéticos de um distúrbio. A norma para o projeto humano deve ser concebida como macho ou fêmea. A sexualidade humana é binária por princípio, com a finalidade óbvia de reprodução e florescimento de nossa espécie. Este princípio é auto-evidente. Os distúrbios extremamente raros de diferenciação sexual (DSD - disorders of sexual differentiation), incluindo, mas não limitados, à feminização testicular e hiperplasia adrenal congênita, são todos desvios medicamente identificáveis da norma binária sexual, e são justamente reconhecidos como distúrbios do projeto humano. Indivíduos com DSDs não constituem um terceiro sexo.

HP – A feminização testicular, mais corretamente chamada de síndrome de insensibilidade androgênica (AIS) verifica-se quando uma pessoa geneticamente do sexo masculino (tem um cromossoma X e um cromossoma Y) é resistente aos hormônios masculinos chamados andrógenos. Como resultado, a pessoa possui algumas ou mesmo todas as características físicas de uma mulher, apesar de possuir a composição genética de um homem.
Hiperplasia adrenal congênita: distúrbio hormonal uma mutação genética, que provoca produção demasiada de andrógenos no feto. Em indivíduos do sexo feminino, causa uma masculinização da genitália externa e aumento do clitóris. Indivíduos do sexo masculino afetados possuem genitália externa normal e o diagnóstico pode não ser feito na primeira infância. Entretanto, o excesso de hormônio, em ambos os sexos, leva a um crescimento rápido e maturação esquelética prematura.

Certamente é auto-evidente que não constituem um sexo aparte, mas é preciso ter olhos adequados para perceber o óbvio. Quando a mente está bloqueada por um distúrbio ideológico, o óbvio se torna obscuro. A tomada da mente pela ideologia feminista impede seu uso dentro de limites razoáveis. A falsa concepção precisa ser “comprovada” a todo custo, forçando e suprimindo a realidade.

2. Ninguém nasce com um gênero. Todos nascemos com um sexo biológico. Gênero (uma consciência e senso de si mesmo como homem ou mulher) é um conceito sociológico e psicológico não um conceito biológico objetivo. Ninguém nasce com a consciência de si mesmo como masculino ou feminino esta consciência se desenvolve ao longo do tempo e, como todos os processos de desenvolvimento, pode ser prejudicada por percepções subjetivas, relacionamentos e experiências adversas que ocorrem desde o início da vida, o período de recém-nascido. As pessoas que se identificam como "sentindo a si mesmos como se fossem do sexo oposto" ou "em algum lugar entre os dois sexos" não pertencem a um terceiro sexo. Permanecem homens biológicos ou mulheres biológicas.

HP – Neste ponto recordo a assertiva de Olavo de Carvalho, com a qual concordo inteiramente: “quando um conservador diz que o sexo é um fato biológico, mas o gênero é apenas uma categoria sociológica, ele só mostra o quanto o seu cérebro já foi dominado pela linguagem do adversário. Gênero não é nem nunca foi uma categoria sociológica. É uma categoria meramente gramatical à qual se pretende, pela propaganda repetida, dar uma dimensão sociológica”.

Segundo Roger Scruton, “evado ao extremo – e o feminismo leva tudo ao extremo – a teoria reduz o sexo a uma mera aparência, com o gênero como realidade. Se, depois de ter forjado sua verdadeira identidade de gênero, você encontra-se alojado no tipo errado do corpo, então é o corpo que tem de mudar. Se você acredita ser uma mulher, então você é uma mulher, não obstante o fato de você ter o corpo de um homem. Daí que os médicos [deveriam] observar as operações de mudança de sexo como uma violação grosseira do corpo e, na verdade uma espécie de agressão (...)” [*]

3. A crença de uma pessoa que ele ou ela é algo que eles não são é, na melhor das hipóteses, um sinal de pensamento confuso. Quando um menino biologicamente saudável acredita que ele é uma menina ou uma menina biológica, biologicamente saudável, acredita que ela é um menino, um problema psicológico objetivo existe e está na mente não no corpo, e deve ser tratado como tal. Estas crianças sofrem de Disforia de Gênero (GD), anteriormente conhecida como Transtorno de Identidade de Gênero (GID), transtorno reconhecido pela mais recente (a quinta) edição do Manual de Diagnóstico e Estatística da Associação Psiquiátrica Americana (Diagnostic and Statistical Manual of the American Psychiatric Association (DSM-V). As teorias psicodinâmicas e sociais do GD / GID nunca foram refutadas.

HP - Absolutamente correto, mas os autores suspendem seus argumentos na “melhor das hipóteses”, não vão às últimas consequências. Quando uma pessoa sente que é algo que não é, afirma ser aquilo que “sente” ou deseja ser, a ponto de comportar-se com sendo, estamos frente a um grave distúrbio mental e não apenas um “pensamento confuso”. É claro que existem gradações, como veremos adiante a respeito da adolescência, mas se este distúrbio se instala de forma permanente, estamos vendo um delírio alucinatório, um quadro psicótico. Estes estados delirantes são difíceis de tratar e, tal como o distúrbio correlato da homossexualidade, se tornaram modernamente quase impossíveis, pois dada a pressão dos movimentos LGBT sobre os órgãos profissionais, os últimos podem ser processados por homofobia e se expor a processos judiciais e a toda sorte de ofensas e ataques, inclusive físicos. A psiquiatria cria belos nomes, como Disforia de Gênero ou Transtorno de Identidade de Gênero, para tentar negar o inegável: o grave distúrbio psicótico.

4. A puberdade não é uma doença e o bloqueio de hormônios da puberdade pode ser perigoso. Reversíveis ou não, o bloqueio de hormônios induz a um estado patológico – a ausência de puberdade – e inibe o crescimento e fertilidade em uma criança antes biologicamente saudável.


5. De acordo com o DSM-V, cerca de 98% de meninos e 88% de meninas confusas com o gênero, aceitam seu sexo biológico após passarem naturalmente pela puberdade.

6. Crianças que usam bloqueadores da puberdade para personificar o sexo oposto vão exigir hormônios do sexo oposto (cross-sex hormones) no fim da adolescência. Os hormônios do sexo oposto estão associados a riscos perigosos para a saúde incluindo, mas não se limitando, a aumento da pressão arterial, formação de coágulos sanguíneos, acidente vascular cerebral e câncer.

HP – (Comentários aos itens 4, 5 e 6): hormônios bloqueadores da puberdade que impedem o desenvolvimento normal têm sido largamente utilizados para suprimir a puberdade, alterando as características sexuais secundárias em crianças que sentem que seus corpos não correspondem às suas fantasias sexuais. O objetivo da supressão da puberdade é preparar a criança para uma vida transgenérica totalmente artificial com graves danos à sua personalidade.

É preciso um esclarecimento para os leitores leigos na matéria.
Em torno dos 11 anos nos meninos e 10 nas meninas a glândula pituitária libera dois hormônios: o luteinizante (LH) e o folículo estimulante (FSH). O aumento destes hormônios estimula as glândulas sexuais a produzirem hormônios sexuais: os testículos produzem a testosterona e os ovários os estrogênios. São estes hormônios que levam às modificações típicas que ocorrem na puberdade.

O bloqueio da puberdade ocorre quando são administrados agentes do tipo gonadotropin-releasing hormone analogs (GnRHa) (Leuprolide ou Depot Lupron e Supprellin ou Acetato de Histrelina - este, um implante sob a pele da parte interna do braço), que bloqueiam a liberação de LH e FSH pela pituitária, o que interrompe a liberação da testosterona pelos testículos ou dos estrogênios pelos ovários. Portanto, estes agentes suprimem a puberdade e o aparecimento das características sexuais secundárias.

O uso terapêutico destes supressores é indicado em casos de puberdade precoce e em certos tipos de câncer sensíveis à terapia hormonal.

Mas trata-se aqui do uso em jovens “transgêneros” para suprimir as mudanças endógenas da puberdade, as quais muitas vezes pioram a “disforia ou distúrbio da identidade de gênero”, condição em que a pessoa sente que sua identidade de gênero é incompatível com seu sexo biológico real. Isto, no mundo real, significa delírio corporal psicótico. Não sendo exposto aos hormônios sexuais adequados acrescentando-se hormônios do sexo oposto (cross-sex hormones) torna mais fácil atingir a “aparência física desejada”. Também são utilizados em indivíduos adultos no processo de “transição de gênero” com concomitante aplicação de hormônios do sexo oposto. Um contato com a realidade da amputação física e mental de uma parte essencial do desenvolvimento humano e a decepção daí decorrente poderá ter como consequência o exposto no próximo item.

7. As taxas de suicídio são vinte vezes maiores entre os adultos que usam hormônios do sexo oposto e se submetem à cirurgia de mudança de sexo, mesmo na Suécia, que está entre os países mais afirmativos de LGBQT. Que pessoa compassiva e razoável condenaria crianças a este destino, sabendo que após a puberdade 88% das meninas e 98% dos meninos acabarão por aceitar a realidade e alcançarão um estado de saúde física e mental?

8. Condicionar crianças a acreditar que uma vida inteira de representação química e cirúrgica do sexo oposto é normal e saudável, é abuso infantil.Endossar discordância de gênero como normal através da educação pública e políticas legais confundirá as crianças e os pais, levando mais crianças a buscar as "clínicas de gênero", onde lhes serão dados medicamentos bloqueadores da puberdade. Isto, por sua vez, praticamente garante que eles vão "escolher" uma vida inteira de hormônios do sexo oposto, cancerígenos e tóxicos, e provavelmente considerar desnecessária a mutilação cirúrgica de suas partes do corpo saudáveis quando adultos jovens.

Michelle A. Cretella, M.D.
Presidente do Colégio Americano de Pediatria
Quentin Van Meter, M.D.
Vice-Presidente do Conselho Americano de Pediatria
Endocrinologista Pediátrico
Paul McHugh, M.D.
Professor Universitário de Psiquiatria da Universidade Johns Hopkins Medical School, detentor de medalha de distinguidos serviços prestados e ex-psiquiatra-chefe do Johns Hopkins Hospital
[*] As considerações de Scruton, altamente recomendáveis, pode ser encontradas em seu artigo Refutando o radicalismo feminista e a ideologia de gênero
 

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  • Silas Velozo
  • 29 Abril 2016

 

Ao zanzar menino nas ruas da cidade com meu pai eu apontava discretamente um chaveirinho na direção de quem considerava pobre ou triste. Era meu talismã, desejando-lhe coisas boas. Como habitou e habitará tantos, a busca da sociedade harmoniosa já me pegava também. Mesmo desconfiando dele, o socialismo me arpoou. Parecia quase tudo evidente: igualdade, oportunidades, justiça, paz e bens a todos. Certo, algumas conexões não se encaixavam, p. ex., a liberdade de agir, se expressar sem ser taxado de pequeno-burguês, as palavras de ordem agressivas propondo paz. Havia também uma suspensão no ar, pois ninguém se atrevia a traduzir em frases claras a magnitude iluminante do que seria um mundo socialista. Ficávamos na concepção genérica do novo mundo. Essas assombrações a gente trancava dum jeito ou de outro nos porões da mente e do coração. Abraçamos a causa com fé. E fé não admite questionamentos. Era um prazer na banguela, despejar noções de um novo mundo sem saber ao certo como ele seria. Me lembro de anos atrás tentar parar o pêndulo dessa ideologia e buscar respostas concretas às minhas dúvidas. Não durou muito a tentativa. Logo chutei tudo pro alto, me agarrando de novo ao prazer do não-pensar. Mas, como tudo mal-acabado, a nódoa crescia.

Uma das primeiras vozes a me fazer virar a cabeça e contemplar outra concepção política foi o então senador Mário Covas, disputando a presidência da república na eleição de 1989. Me aturdiu e me emputeceu no primeiro instante sua fala de o Brasil necessitar de “um choque de capitalismo”. Como assim?! Um cara digno declarando tamanha barbaridade? Fiquei desantenado vários dias. Pingue-pongando a mente depois, meu jeito de analisar as ideias que aterrissam em mim, fui aos poucos descobrindo novas perspectivas e encarando as feridas abertas do socialismo. Travessia difícil. Tantas vezes parei de ler ou nem comecei um artigo expondo as falhas estruturais da esquerda. Mas a curiosidade me atiçava. Voltava, lia o raio do artigo, mesmo espumando de raiva.

Levei anos para desmontar minha esquerdite. E quando ela implodiu tive dores de cabeça, caganeiras, deprês, gripes violentas, sinusites, dermatites. O chão sumiu debaixo dos meus pés várias vezes, dias vazios me vararam. Não foi e nunca será fácil abdicar duma pseudocerteza coalhada de boas intenções. Num Brasilão doente então, cheio de defeitos congênitos e vícios encardidos, tomar a mão duma estrada que aparenta não ter tanta dor e promete o paraíso terrestre hipnotiza. Duramente aprendi: as boas intenções apregoadas pelo socialismo se desmancham no ar por incompreender a economia concreta e propor mudanças estressantes e voláteis ignorando a complexidade humana. E também: o alimento superior do ser humano, a liberdade, tem de se entender com a responsabilidade.Doeu, mas cheguei ao patamar de mente e coração mais leves. Xingar o mundo, o sistema, os sacripantas endinheirados nos torna falsamente críticos. Ricos, médios e pobres sempre existirão, a pobreza sendo relativa em cada sociedade. Ou alguém ainda crê nas cúpulas comunistas renitentes no século 21 vivendo como a plebe? Não é com a penumbra marxista que iluminaremos as falhas da civilização. Aos trancos e barrancos a humanidade evoluiu e a base da esquerda clássica ruiu.

Toda essa travessia custosa que eu e tantos tomaram poderia ser abreviada ou nem necessária se tivéssemos lido ao menos os clássicos liberais. Caras como o genial economista britânico Alfred Marshall (1842-1924). De família pobre,desde os 8 anos de idade tomava diariamente ônibus, barco e caminhava a pé através dos mais degradados bairros fabris e cortiços londrinos situados à beira do rio Tâmisa, pensando em ajudar aquela gente um dia. Marshall contemplou o semblante dos pobres durante toda sua vida.Numa época onde a economia havia chegado ao impasse de achar natural a prosperidade crescer na mesma proporção da pobreza, foi dele a inspiração a reverter essa sina: “O melhor remédio para os salários baixos é uma educação melhor”, proclamou, pois levaria ao aumento da produtividade e consequentemente da renda dos trabalhadores. Ao contrário de Marx, que supôs a competição fazer convergir os salários dos trabalhadores qualificados e sem qualificação ao nível da subsistência, Marshall observou o contrário, pois os trabalhadores especializados já estavam ganhando mais que os não qualificados. Não bastasse esse instante bacana, foi um dos primeiros a apoiar o voto e o estudo feminino, inclusive incentivando sua esposa a cursar faculdade, algo impensável às mulheres daquele tempo e ser favorável à criação dos primeiros sindicatos. 24 anos mais jovem que Marx, de quem foi contemporâneo, Marshall achava o capitalismo a solução, não a fonte do impasse econômico e social, e que este devia ser aprimorado, não demolido.

Acredito que existam no mundo poucas coisas com maior capacidade de conter poesia do que a tabela de multiplicação... Se for possível conseguir capital mental e moral para crescer a alguma taxa anual, não haverá limites para o avanço que se poderá obter; se pudermos lhe proporcionar aquela força vital que tornará aplicável a tabela de multiplicação, isso se tornará uma pequena semente que se transformará numa árvore de tamanho ilimitado (escreveu no livro “Leituras para as mulheres”, de 1873). “O mundo se move, mas o ritmo com que ele se move depende de quanto pensamos por nós mesmos”, disse também na época.

O socialismo e o comunismo deram errado por si próprios. Além de Marshall, seus defeitos congênitos foram estampados por outros dois geniais economistas e filósofos liberais austríacos, Ludwig von Mises (1881-1973), em artigos para jornais já em 1920 e aprofundados no seu livro “Liberalismo”, publicado em 1927, e Friedrich August Hayek (1899-1992), Prêmio Nobel de Economia em 1974, que publicou obras sobre o tema endossando o premeditado fracasso da esquerda radical, concretizado em 1989 com o colapso da União Soviética e leste europeu, e de certo modo da China, que adotou o capitalismo de estado depois das frustradas tentativas de estatização total na era Mao-Tsé-Tung e de sua esposa sucessora.Assim, duramente ou não, é preciso aprender:

. a produtividade despencará sem economia de mercado; sendo este volátil e transformador, não pode ser conduzido por burocratas e padrões rígidos;

. os cidadãos devem ser iguais perante a lei e, dentro do possível, com chances semelhantes de oportunidades, mas a igualdade econômica é uma falácia contraproducente, pois tira das pessoas seu desejo de ascensão material e espiritual, não reconhece a diversidade humana e o mérito, e conduz a sociedade ao empobrecimento;

. prescindir dos empreendedores privados significa desperdiçar energia, progresso e dinamismo econômico e social. É da natureza humana haver pessoas desejosas de tocar o próprio negócio sem ter de seguir ordens. São eles que alavancam a economia, cabendo ao Estado prover justiça a todos e liberdade de mercado para evitar monopólios e protecionismos;

. os gastos da classe rica com luxo têm de ser mirados pela ótica da inovação e do perfeccionismo. Há pouco mais de 20 anos, possuir telefone no Brasil era um luxo: minha mulher chegou a vender um VW fusca paracomprar uma linha telefônica. E no seu início, os celulares eram artigos de ricos, sem contar os banheiros nas casas, carros, computadores, eletrodomésticos, etcéteras;

. detonar o capitalismo, como proposto pelos socialistas e comunistas, além de estressante e antieconômico, rouba das pessoas sua capacidade crítica, pela incapacidade de discernir realmente o que precisa ser aprimorado na sociedade, aniquilando aí a promessa de fraternidade, já que o tal novo mundo viria embasado em destruição do mercado, a mais antiga instituição de relacionamento humana;

. por ser centralizada na raiz e dirigida por partido único, uma sociedade planificada é geneticamente ditatorial, não permitindo o livre fluxo de ideias, desprezando a liberdade individual e a diversidade;

. os arremedos supostamente evolutivos da esquerda clássica, como o estatismo, onde o Estado intervém em menor escala na economia e nas esferas da vida privada dos cidadãos, embora menos deletérios, também agridem a natureza humana e empobrecem material e criativamente a sociedade;

. não existe luta de classes. Qualquer ser humano com um mínimo de respeito ao seu semelhante não aparta as pessoas por sua posição social. Apesar da inveja que atiça alguns, a maioria sabe de suas limitações e que possuir bens materiais depende de trabalho, talento, estudo, determinação... ou sorte, se fulano ganha na loteria ou recebe uma herança. Assim como alguns desejam ser patrões, há muito mais outros ansiando por emprego, pois não querem ou não dão conta da responsabilidade de ter o próprio negócio;

. o historicismo fatalista – teimoso na ideia errada de que a civilização caminha inexoravelmente para o totalitarismo – inexiste de fato, pois não cabe à ciência prever o futuro a longo prazo, mas sim fazer projeções não-taxativas a curto prazo. Quem faz a História são as pessoas, sujeitas portanto a todos graus de decisões racionais ou não;

. relativizar o direito, colocando-o como benesse estatal também enseja sua deformação, por submetê-lo aos humores do estado. O direito individual, pelo qual a humanidade tanto lutou, não pertence a ninguém, a não ser a cada cidadão. Se o estado ferir esses direitos, naturalmente cabe ao indivíduo interpor ação jurídica contra tal desfeita, sem o temor de ser punido por estar supostamente contra a “revolução”, a sociedade ou seja lá o quê;

. a propriedade privada não é apenas o esteio econômico por si sóde uma sociedade aberta. Ela oferece segurança e confiança aos cidadãos, dando-lhes estabilidade diante de uma natureza ao mesmo tempo generosa e cruel;

. a divisão do trabalho, a qual Marx (de novo!) combateu, proporciona especialização, interconexão social, disseminação e variedade de bens e serviços a amplas margens das populações, que anteriormente nem podiam sonhar em obtê-los;

. a felicidade advém de conquista pessoal, desafio de cada ser vivente. O estado pode e deve oferecer condições propícias a isso, tornando a vida em sociedade segura e fluida, fazendo bem o que lhe compete através de serviços públicos dignos e livre mercado. Mais que isso é promessa vã, invasão emocional na psique dos cidadãos.Felicidade é um bem íntimo, impossível de ser replicado por decreto;

. sem economia de mercado não há um sistema de preços funcional, essencial para alcançar uma alocação racional dos bens de capital para usos mais produtivos. O socialismo falha porque a demanda não pode ser conhecida sem preços estabelecidos pelo mercado, ou seja, não há como precificar produtos e serviços;

. a mais-valia, ou seja, o lucro obtido exclusivamente sobre as horas de serviço dos trabalhadores foi outra concepção errada de Marx. Também a gestão eficiente, o aumento da produtividade através de novas rotinas de trabalho e inovações tecnológicas, oportunidade de negócios e demanda por bens e serviços geram lucro. O suor dos trabalhadores tem de ser dividido com todos esses outros vetores.

Por trás do pensamento socialista-comunista há sempre uma essência dadivosa, claro. Só pessimamente direcionada. Não ajudamos os pobres dilatando a pobreza, estendendo-a a quase toda a sociedade (pois a cúpula sempre terá privilégios além do alcance dos mortais). Subtrair a liberdade de ir e vir, de se expressar, de empreender denota pobreza também, ao roubar das pessoas sua capacidade de decidir suas vidas por si próprias. Ainda não experimentamos o real liberalismo no Brasil – livre mercado, poderes verdadeiramente soberanos, prestação de contas do dinheiro dos contribuintes, justiça para todos independente do status social, serviços públicos dignos, empreendedorismo realizável, menos impostos, ambiente de negócios desburocratizado,infra-estruturas dignas, etc. Vivemos num país monopolista, estatista e cartorial desde as capitanias hereditárias, obviamente com algumas ilhas de exceção.Toda essa malévola teia de relações espúrias entre estado e grandes empresários desvendada pela operação Lava-Jato (tirando seu caráter único de crime organizado desenvolvido pelo governo petista e aliados) permeia nossa história nacional. Ficou patente a necessidade de diminuir o tamanho do estado, tornando-o eficiente, responsável financeiramente, respeitável, menos sujeito a corrupção e ao toma-lá-dá-cá político nefasto. A direita, que tanto esperneamos contra, precisa ser compreendida como projeto político-econômico-social viável, produtivo e distributivo de renda, na medida em que faz a economia fluir, gera empregos e facilita o crédito também à população mais pobre.E a esquerda precisa evoluir, entender e aceitar a diversidade de ideias que fecundam a civilização e acatar o livre mercado como suporte de toda sociedade sadia. Essa compreensão pode ser hoje nosso talismã. Sem abrir corações e mentes, deixando o orgulho e a vaidade para trás, não avançaremos discussão nenhuma no Brasil.

E já perdemos tempo demais.

 

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(*) – Funcionário aposentado da Assembleia Legislativa MG, 60 anos. Trabalhou nos jornais de esquerda “De Fato”, “Em Tempo” e “Movimento” e atuou no Comitê Brasileiro pela Anistia-MG no fim das décadas de 1970 e início de 1980. Contribuinte financeiro do PT na década de 1980 e filiado ao partido e desfiliado anos depois. Funcionário de gabinete do primeiro deputado estadual mineiro do PT de 1983 a 1987.Criador do projeto de arte Zás no Teatro da Assembleia MG. Livros publicados: “Sim” (poemas) e “Olhos jins” (prosa romanceada). Pai de um casal de filhos, recasado com Morena há 27 anos.

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Fontes de consulta:

. “A imaginação econômica”, de Sylvia Nasar, editora Companhia das Letras, 2012. Tradução: Carlos Eugênio Marcondes de Moura.

. “Liberalismo”, de Ludwig von Mises, editora Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010, 2ª edição e-book. Tradução: Haydn Coutinho Pimenta.

. “O caminho da servidão”, de Friedrich August Hayek, editora Instituto Ludwig von Mises Brasil, 2010, 6ª edição e-book. Tradução: Anna Maria Capovilla, José Ítalo Stelle e Liane de Morais Ribeiro.

. “O essencial Von Mises”, de Murray N. Rothbard, editora Instituto von Mises Brasil, 2010, 3ª edição e-book. Tradução: Maria Luiza Borges.

. “Why nations fail – The origins of power, prosperity, and poverty”, de Daron Acemoglu e James A. Robinson,editora Crown Publishers (EUA), 2012, 1ª edição e-book.

. “O retrato”, de Osvaldo Peralva,editora Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2009.

. “Civilização – Ocidente x Oriente”, de Niall Ferguson, Editora Planeta, 2012, 1ª edição e-book. Tradução: Janaína Marcoantonio.

. “Guia politicamente incorreto da história do mundo”, de Leandro Narloch, Editora Tainã Bispo(Direitos reservados à Texto Editores, do grupo Leya), 2013, 1ª edição e-book.

. “Ditadura à brasileira – 1964-1985: A democracia golpeada à esquerda e à direita”, de Marco Antonio Villa, Editora Leya, 2014, 1ª edição e-book.

. “A guide to ‘The poverty of historicism’”, de Rafe Champion, Editora Barnes, Catmur & Friends (Nova Zelândia), 2013, 1ª edição e-book. Guia sobre o livro do filósofo austríaco Karl Popper (1902-1994), publicado em 1957.


 

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  • Jorge Béja
  • 28 Abril 2016

 

(Publicado originalmente na Tribuna da Internet)

A notícia do O Globo de hoje, com destaque (“Há Vaga. Procura-se um ministro da Justiça. Tratar no Jaburu”), lida na página 7 e assinada por Paulo Celso Pereira, tocou meus brios e a vocação inata de servir ao próximo. Nem a idade (70, alcançada sábado passado, 23 de abril), nem a condição de aposentado e a mudança para Brasília me levam ao desânimo. E o incentivo maior é estar investido dos poderes, atribuições e competência que a Constituição Federal outorga aos ministros de Estado e desempenhá-los da forma mais ética, inteligente e com a máxima isenção, sem partidarismo, negociata ou conchavo. E com isenção, sabedoria e arte, tocar o país para frente.

O que de certa forma me acanha, no entanto, é o oferecimento. Acho feio ser oferecido. Mas a situação do país é de tamanha indigência moral e de escancarada escassez de brasileiros e brasileiras, metidos na política, capazes de ocupar e exercer cargo público, sem qualquer outro interesse que não seja o de servir ao país, que supero o acanhamento e digo ao futuro presidente Temer: Me chame que aceito.

OS COMPROMISSOS
Me comprometo a exercer a orientação, coordenação e supervisão de todos os órgãos, instituições e entidades submetidas ao Ministério da Justiça com o máximo zelo e presença constante. Mas referendar atos e decretos assinados pelo Presidente da República — e esta é uma das atribuições que a Constituição confere aos Ministros de Estado — tanto somente farei se estiverem induvidosamente de acordo com a lei e se forem para o bem do povo e felicidade geral da Nação. Caso contrário, primeiro vou convencer o presidente da República a desistir da prática que identifico ilegal e/ou danosa. E se não conseguir êxito, renuncio.

Igual comportamento terei no que se refere à prática de atos e ordens emanados do presidente, por outorga ou delegação. Se os objetivos não forem cem por cento honestos, altaneiros, legais e de acordo com a Constituição e o Estado Democrático de Direito, deixo o cargo, deixo Brasilia e nunca mais coloco os pés lá.

Não me servirei a defender presidente da República submetido a impeachment, seja qual for o motivo. Ministro da Justiça não se presta para tal missão. Nem mesmo outro servidor ou agente público qualquer. Para tanto deve o presidente constituir advogado particular. Afinal, não se pode servir a dois senhores: a quem lesou o erário nacional e à União lesada.

Me comprometo a apresentar ao Presidente da República relatório semestral (a CF determina relatório anual) da minha gestão, seja no trato e administração da coisa pública, dos encontros e tratativas que tenham sido indispensáveis à boa marcha do ministério e fundamentalmente dos dinheiros recebidos e gastos.

SIMPLICIDADE
Um servidor ou agente público tem o imperioso dever de viver e conviver na mais modesta forma vida. E quanto maior for o destaque e a importância do cargo, maior ainda deve ser a simplicidade, não é mesmo José Mujica? Nada de ostentação, de soberba, luxo, mordomias, palácios… vida fácil e nababesca. A todos receber será a regra número 1. Afinal, como diz o próprio nome da profissão, servidor público presta serviços públicos e ao público, à população. E população, ao lado do território e governo, é o mais importante dos três elementos que dão existência a uma nação. Sem população não existe nação alguma.O povo, a população, de tudo são os destinatários principais e finais. E até mesmo únicos, por que não?

REUNIÕES PÚBLICAS
Não se pode gerir e administrar o bem público como se fosse próprio e privado. Daí o motivo que me levará a instituir reuniões ministeriais públicas, com a presença da imprensa, entre colegas ministros, com as chefias de órgãos, instituições e entidades subordinadas ao Ministério da Justiça e com o próprio presidente da República.

O que é público não pode ser ocultado, nem sigiloso. Tudo é para ser feito e tratado às claras, na presença e com o conhecimento do povo, salvo raríssimas exceções que recomendem o sigilo desde que em benefício da ordem e das garantias constitucionais e a bem do Estado Brasileiro.

MAIS COMPROMISSOS
Assumo o compromisso de priorizar, revitalizar e proporcionar todos os meios necessários para o bom e fiel desempenho e atuação da Defensoria Pública da União, do Departamento de Polícia Federal, das Policias Rodoviária, Ferroviária, Marítima, Aérea e de Fronteiras. De defender, intransigentemente, a Ordem Jurídica, os Direitos Civis e Políticos, os Direitos dos Indígenas e dos Consumidores e dos bens e dos próprios da União. Da prevenção e repressão, ininterruptas e com os melhores aparelhamentos, materiais e humanos, ao contrabando, aos entorpecentes, à lavagem de dinheiro, à cooperação jurídica internacional. Garantir a Segurança Pública, dia e noite, de forma preventiva e repressiva.

Planejar, coordenar e administrar o sistema penitenciário nacional, mas para valer, de forma concreta e eficaz, para que esse ideal deixe de constar apenas nas leis e nas intenções dos governantes e ministros da Justiça que até hoje pontificaram no nosso país. Serei rigoroso com a determinação inscrita no artigo 221 da Constituição Federal que obriga que a produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atendam aos princípios da preferência e finalidade educativas, artísticas, culturais e informativas e aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

REPRESENTAÇÃO E O GABINETE
Face à dimensão do território brasileiro, em cada Estado haverá um gabinete de representação do Ministério da Justiça para que a população possa a ele se dirigir, sem necessitar de longos deslocamentos, para reivindicar e/ou denunciar o que entenda necessário e preciso.

Meu gabinete em Brasília terá mobiliário modesto e quem lá for será recebido — e muito bem recebido — independentemente de agendamento. Desnecessárias tantas assessorias, que nada mais são do que cabides de emprego. Bastam a Chefia de Gabinete e a assessoria de comunicação social e as consultorias jurídicas, para as quais, convoco desde logo e na ordem aqui apresentada: Walter Maierovitch, Carlos Newton Leitão de Azevedo, Newton Doreste Baptista, Antonio Sebastião de Lima, Carlos David Santos Aarão Reis (estes três últimos magistrados no Rio de Janeiro, aposentados e que no exercício da magistratura se mostraram exemplares juízes brasileiros) e ainda Janaína Conceição Paschoal e Miguel Reale Junior, pelos méritos do elevado saber jurídico e da altivez que tiveram ao fazer disparar o processo que afasta Dilma e o PT na presidência do país.

 

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  • Ênio Meneghetti
  • 27 Abril 2016

 

Muito já se disse sobre o assunto nos últimos dias. Quem tem noção do ridículo ficou chocado com o que assistiu cada vez que um deputado citava o nome de um familiar, de sua cidade, ou demanda pueril na votação do impeachment. Desconhecidos tiveram seus segundos para aparecer na televisão e a coisa degenerou. Vexame.

Mas parlamentares não surgem do nada. Nascem do voto. Fomos nós, foi você que elegeu aqueles deputados. A maioria demonstrou que mal consegue organizar uma frase ou pensamento coeso, inteligível e coerente.

O primeiro passo é encarar de frente a mentira de que “todos os políticos são todos iguais”. Não são. Ou você aprende a votar direito ou continua se comportando como a maioria daqueles deputados.

Você pode começar identificando os mentirosos. Aqueles que abusam do absurdo argumento de que haveria um “golpe” em andamento no Brasil. Mentira esfarrapada para tentar vitimizar-se e sobreviver ao tsunami de roubalheiras praticadas pelo governo por ora – ainda – no poder.

Precisamos retomar nosso destino, juntar os cacos e procurar sobreviver com o pouco que sobrou da economia nacional. Mas lembre-se: não foi por falta de aviso que as pessoas que praticaram o que está aí, elegeram-se. A responsabilidade por eles estarem lá é intransferível. É nossa.

A vida continua. Devemos estar vigilantes para os atos dos agentes públicos. Nossa máquina gasta desenfreadamente. Pior, gasta mal. Ninguém aguenta mais tantos impostos no Brasil. São 93 impostos, taxas e contribuições que alimentam a corrupção instalada no poder púbico, que mantém mordomias, é lerdo, tem baixa qualidade. A fiscalização é falha – apesar de seu custo elevadíssimo. Estão aí os Tribunais de Contas para atestar essa assertiva. A fiscalização só parece ser eficiente na área tributária. Ah, aí funciona rapidinho! De forma moderna e eficiente.

Por que nas demais áreas não pode funcionar assim também?

Temos uma exceção em andamento. Claro, refiro-me a Lava Jato.

Foi preciso um corajoso juiz federal de primeira instância e alguns procuradores federais operosos, preparados e bem intencionados para provar que a impunidade não é uma certeza neste país. Sempre se soube que o que coíbe o crime, em todos os seus níveis, é a certeza da punição. Pois bastou um juiz fazer nada mais que seu trabalho para virar ídolo da população e despertar inveja de uma governante ao ser listado pelaTime como uma das cem personalidades mais influentes do mundo. Que tal? O Brasil tem jeito ou não tem?

Portanto, o que nos cabe agora é continuar prestando todo o apoio a Lava-Jato.

Nem pensar em qualquer sombra de ingerência para perseguir o Juiz Moro e a força tarefa do MPF. A população deve ficar atenta. Infelizmente temos que encarar o fato de que as manobras para aparelhar as instâncias superiores do Judiciário foram um fato praticado pelo atual governo e seu antecessor da forma mais descarada jamais acontecida neste país.

Caberá a nós, a população, impedir que com a queda do atual governo, esfrie o interesse na apuração total dos fatos atualmente investigados.

Publicado originalmente em eniomeneghetti.com
 

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  • Felippe Hermes em Spotniks
  • 27 Abril 2016

(Publicado originalmente em spotiniks.com)

Da sala de interrogatório da Polícia Federal em Congonhas ao palanque na Avenida Paulista, a versão oficial de Lula para estar entre os investigados na maior operação de combate à corrupção da história brasileira não muda uma vírgula. Segundo ela, o ex-presidente e seu partido seriam vítimas de uma perseguição seletiva (apesar da operação envolver 117 presos e 50 políticos investigados de 6 diferentes partidos), destinada a acabar com o PT e prendê-lo. O motivo? Para Lula, trata-se de uma vingança por seu mandato ter tirado 36 milhões de pessoas da pobreza extrema e permitido aos mais pobres viajar de avião. Só há um problema com essa versão: ela é falsa, do começo ao fim.

O comentário de Lula soa como um escárnio em meio a uma crise que todos os dias leva 17 mil brasileiros à extrema pobreza, e que ao final, terá reduzido dez milhões de pessoas a esta condição. Afinal, ainda que fosse verdade que o ex-presidente tivesse garantido a ascensão social de milhões de brasileiros, não teriam eles motivos de reclamar, agora que a política de Dilma coloca o país em uma situação onde teremos zero por cento de crescimento na renda entre 2010 e 2020? Ter gerado algo positivo no passado torna Lula ou Dilma imunes a críticas? E ainda, se a ascensão social dos brasileiros entre os anos 2002 e 2010 deveu-se a Lula e suas políticas, por que elas deram tão errado com Dilma?

Como explicou o ex-presidente em seu depoimento à Polícia Federal, seu instituto existe para espalhar suas políticas para outros países – daí a importância das dezenas de milhões por ele arrecadado. Afinal, como Lula espera ter algo a ensinar aos outros presidentes quando ele mesmo foi incapaz de ensinar algo à sua sucessora?

A resposta para todas estas perguntas provavelmente é mais simples do que você imagina: o crescimento da economia brasileira sob o governo Lula é muito mais circunstancial do que ação de um líder ou um partido. O fracasso do governo Dilma em replicar o crescimento testemunhado no período ocorre pois não há receita original, uma vez que este crescimento não foi originado pelo presidente Lula e sua equipe.

Aqui, preparamos uma lista com esse e outros mitos que você sempre acreditou a respeito do seu governo.

1. O MITO DOS 36 MILHÕES DE MISERÁVEIS A MENOS.

Foi em 2012 que o governo, por meio da Secretaria de Assuntos Estratégicos, teve aquela que seria a mais conhecida pérola dos milagres alegadamente realizados por Lula: a de ter tirado 36 milhões de pessoas da pobreza. De acordo com a SAE, e um estudo do IPEA, a classe média brasileira possui renda entre R$ 291 e R$ 1.019. Com este critério, mais da metade dos brasileiros passaram a ser considerados classe média pelo governo.

O número mágico, porém, tem uma explicação ainda mais esdrúxula. Em 2012, 36 milhões de pessoas eram beneficiárias totais do Bolsa Família e outros programas sociais. Para o governo, portanto, se estes 36 milhões não tivessem como receber os benefícios, seriam pobres ou extremamente pobres.

Em seu depoimento à Polícia Federal, Lula reafirmou o número. Espantado, o delegado questionou.
“Então, o senhor está dizendo que antes do seu governo, 1 em cada 4 brasileiros era miserável?”
Lula concordou.

Para o IPEA, porém, o número não passa de uma fantasia. Em 2002 havia no Brasil 14,9 milhões de miseráveis, e em 2012, 6,5 milhões. Uma queda, portanto, de 8,4 milhões. Para o mesmo IPEA, em 1992 havia 19,1 milhões. A queda na pobreza, portanto, acelerou-se no governo Lula, puxada pela economia – mas não há de fato nada que indique um milagre ou alguma excepcionalidade na ação do ex-presidente.

Os números do IPEA, órgão ligado ao próprio Palácio do Planalto, não deixam dúvida – o governo inflou o número.

2. O MITO DO “CRESCIMENTO”.

“Brasil, Um País do futuro” é o título do livro de Stefan Zweig que faz a cabeça dos nacionalistas brasileiros. A ideia de que o Brasil é uma nação destinada a destacar-se mundialmente sempre foi muito tentadora – e o crescimento de 11.000% da nossa economia ao longo do século vinte parecia tornar isso mera questão de tempo. Apesar de todo este crescimento, porém, ainda convivemos durante todo este período com uma característica marcante: o rentismo.

Historicamente, obter favores do governo sempre foi mais conveniente do que empreender no Brasil – e viver às custas da ineficiência do governo, mais conveniente ainda. Nenhum setor entendeu isto tão bem quanto o financeiro. Até 1994, quando o Plano Real resolveu a questão da hiperinflação no país, a inflação era responsável por gerar mais de 2/3 das receitas do setor bancário brasileiro e um lucro estimado em 2% do PIB pelos economistas Simonsen e Cysne, no chamado “imposto inflacionário”. Atualmente, este valor equivaleria a R$ 123 bilhões em lucro caso não fosse extinto pelo Plano Real. Dezenas de bilhões em lucro sem produzir nenhum bem ou serviço.

Acabar com a inflação foi, portanto, um passo fundamental para obrigar que os bancos atuassem como devem, fornecendo crédito e serviços. Em 2002, oito anos após o plano Real, a receita era mais do que inversa: cerca de 95% do faturamento do setor se devia a serviços ou empréstimos. Com as finanças públicas e os próprios bancos saneados, o setor bancário estava próximo para o próximo passo – a explosão de crédito.
Nenhum governo se beneficiou tanto deste período de crescimento do crédito quanto o governo Lula, e exceto por uma simplificação burocrática no crédito imobiliário (criada pelo economista liberal Marcos Lisboa quando ainda estava no governo), a participação de Lula para destravar o crédito no Brasil é nula, ou muito próxima disso.

O crescimento do crédito é em boa parte o responsável pela sensação de riqueza que tomou conta do país. Poder financiar bens de consumo em 12 ou 24 vezes, algo que era inimaginável nos anos 80 ou 90, tornou-se comum, fazendo com que, apesar do pouco aumento na renda (cerca de 48% na média em 8 anos), a população estivesse consumindo muito mais do que antes.

Fatores externos como o aumento médio de 723% nos preços de commodities (aqueles bens negociados mundialmente como café, soja, minério de ferro, etc), colaboraram também para irrigar o país com recursos externos. Somados ao investimento estrangeiro no país, a década de 2000 significou a entrada de US$ 183 bilhões no país – recursos com os quais o governo bancou inúmeros bens e serviços.

O natural esgotamento da capacidade das famílias brasileiras de se endividar foi um dos principais responsáveis para que o governo levasse os bancos públicos a ampliar a oferta de crédito. Receosos de que as famílias não mais iriam ter condições ou interesse em ampliar seu endividamento, os bancos privados pisaram no freio, mas o governo insistiu na fórmula. Em 2013, cerca de 51% do crédito no país teve a mesma origem: os bancos públicos. Como resultado, famílias, governo e empresas encontram-se hoje endividados e sem condições de consumir ou produzir, diante da incerteza do governo.

Em que pese, o crescimento do Brasil sob o governo Lula em momento algum pode ser considerado um milagre. Como em outros períodos da história brasileira, o país cresceu exatamente o mesmo que a economia mundial, e foi o segundo país que menos cresceu no continente, à frente apenas do México.

3. O MITO DOS PROGRAMAS SOCIAIS.

Administrando um orçamento que saiu de R$ 513 bilhões em 2003 para R$ 1,16 trilhão em 2010, o ex-presidente Lula certamente teve todas as condições possíveis para ampliar investimentos sociais como aqueles determinados pela constituição de 1988.

Não bastou para Lula porém vangloriar-se do que fez e de onde gastou os recursos que tinha. Sem discutir a eficiência do gasto, uma vez que a educação brasileira ou o sistema de saúde brasileiro (que segundo o próprio, beirava a perfeição) não tiveram melhora relativa em relação aos demais países mundiais (como aqueles pesquisados pelo PISA), o ex-presidente alega ter feito muito além do que a própria história mostra como verdade.

Para Lula, sua gestão criou 16 universidades. Uma breve pesquisa revela que se tratam na realidade de seis, ou quatro se você não considerar que alterar o nome de “Escola de Farmácia e Odontologia de Alfenas” para “Universidade Federal de Alfenas” não é de fato criar uma universidade (sim, Lula alega ter criado uma universidade aí, onde desde 1914 existia uma outra instituição já estabelecida).

Prática comum de políticos brasileiros, alterar o nome de programas para tratá-los como novos ou seus, tornou-se regra durante sua gestão. Atribuir para si programas de décadas de existência, como o FIES, também virou lei. Substituir nomes como o ‘Luz no campo’ (criado em 2000) para “Luz para todos” (que Lula alegou em um programa eleitoral de 2010 ter sido uma ideia genial apresentada por Dilma), virou praxe. Alterar ou reagrupar programas sociais como o Bolsa Família, que substitui inúmeros outros programas anteriores, foi a sacada da reengenharia criada pelo mito Lula.

Uma breve análise dos programas sociais de Lula – incluindo aí o “Bolsa Empresário”, que distribui R$ 36 bilhões em subsídios para as mil maiores empresas do país, via BDNES – mostra que os maiores sucessos encontram-se exatamente onde o governo não é responsável por nada além de repassar a verba. Enquanto as universidades federais tiveram queda no número de formandos (entre 2008 e 2013), nas universidades privadas o número explodiu. Enquanto o Bolsa Família foi um sucesso, o Fome Zero foi um fracasso retumbante.

Em resumo, Lula acertou onde não fez nada além de repassar os recursos (Bolsa Família, Prouni, Fies, Minha Casa Minha Vida), e colecionou fracassos onde a gestão (sob responsabilidade da gerente Dilma Rousseff), era requerida, como nos três Programas de Aceleração do Crescimento.

4. O MITO DA QUEDA NA DESIGUALDADE.

Fazer o pobre andar de avião é motivo suficiente para causar revolta na classe média, segundo Lula e seus seguidores. A concepção é absurda, mas não tanto quanto a ideia geral de que o sucesso obtido pelos brasileiros em ampliar sua renda ou consumo deva ser considerado mérito direto do governo. Se uma pessoa acessa a universidade, se esforça para passar no vestibular e concluir o curso, o mérito deveria ser da própria pessoa ou do presidente em questão? A pergunta parece sem sentido, mas as coisas tendem a ficar mais absurdas ainda quando vemos o real peso do governo em diminuir a desigualdade no país.

Segundo um estudo do IPEA, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, órgão do governo, a queda na desigualdade brasileira, iniciada em 2001, possui como principal causa, não a ação direta de programas sociais, mas o acesso ao mercado de trabalho. Para pesquisadores como Ricardo Paes de Barros, o acesso ao emprego explica mais da metade da queda no índice de Gini, que atesta a desigualdade de um país. Programas sociais foram responsáveis por menos de 1/5 na queda. E se você ainda tem alguma dúvida sobre a veracidade da afirmação de Lula de que criou 10 milhões de empregos, é recomendável que volte ao ponto 2.

Para outro estudo do Ipea, a ação do governo é diretamente responsável por 1/3 da desigualdade de renda no país. Apenas dois indicadores, a aposentadoria e os salários dos funcionários públicos, são responsáveis por todo este peso (ainda seria possível incluir o acesso desigual às universidades públicas, onde 59% dos alunos estão entre os 20% mais ricos da população, ou os subsídios estatais via BNDES). Neste sentido, as ações do governo em nada contribuíram para resolver o problema.

Na parte que efetivamente cabe ao governo atuar, Lula nada fez para alterar o quadro de desigualdade – pelo contrário, continuou fornecendo favores a empresários, e com o que sobrou, garantiu o pagamento do Bolsa Família, programa originalmente criticado por economistas do PT, como Maria da Conceição Tavares (e pelo próprio Lula). O caráter privatizante do Bolsa Família (uma vez que apenas entrega o dinheiro, não entrega comida ou serviços estatais) jamais foi bem visto por Lula e seus conselheiros econômicos até a ideia arrebatar milhões de votos.
Toda a queda na desigualdade, porém, está ameaçada agora – uma vez que a recessão joga de volta à pobreza milhões de brasileiros, destrói empregos e gera estagnação na renda, além da perda do poder de compra com a inflação.

Não há dúvida de que a década de 2000 tenha representado um período positivo para a economia brasileira. Apesar de não resolvermos os problemas relativos à nossa produtividade, que foi mascarada pela política de aumento do salário mínimo (que subiu três vezes mais do que a renda média, o que na prática significa dizer que quem ganhava 3 salários mínimos em 2002 passou a ganhar 1 em 2010), a economia brasileira cresceu menos que as demais no continente – mas se desenvolveu, mostrando como, ainda que seja pouco e não tenhamos nos preparado, um pequeno choque externo é capaz de animar nossa economia e dar novos ares a milhões de brasileiros, antes excluídos do mercado de consumo.

Tudo isso, no entanto, como a atual década perdida não deixa dúvida, apesar do PT.

 

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